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AL da Bahia homenageia guerrilheiros do Araguaia

Mesa: Aurino Pedreira, presidente estadual da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB); Julieta Palmeira, dirigente do PCdoB; Carlos Valadares, presidente estadual da Fundação Maurício Grabois; Diva Santana, representante do Grupo Tortura Nunca Mais; Zezinho do Araguaia; Álvaro Gomes; Osvaldo Bertolino, da Fundação Maurício Grabois; Valdir Pires, vereador e ex-governador da Bahia; Joviniano Neto, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais na Bahia; Antônio Barreto, diretor do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz; Vladimir Meira, presidente estadual da União da Juventude Socialista (UJS).

Álvaro Gomes abriu a sessão afirmando que a luta dos guerrilheiros se tornou um dos principais acontecimentos da história. Na sessão, algumas personalidades foram homenageadas. "A Assembleia Legislativa não poderia deixar de celebrar os 42 anos da Guerrilha do Araguaia e protestar para que não mais aconteça as atrocidades praticadas pela ditadura militar implantada em 64 no nosso pais, buscando a verdade omitida durante décadas para manter a opressão do nosso povo", destacou Álvaro.

Em seu discurso, o parlamentar lembrou que a Guerrilha do Araguaia foi um dos principais acontecimentos da história do Brasil, censurada pelos militares da época que tinha como objetivo esconder a realidade. "Não adiantou, hoje a Guerrilha do Araguaia faz parte da história de nosso país e várias publicações se espalham no Brasil e mundo afora", observou Álvaro Gomes.

O deputado comunista ainda resgatou o início dos combates, em abril de 1972, e o aparato militar utilizado pela ditadura com mais de 12 mil homens do Exército, Marinha, Aeronáutica e agregados, equivalente ao número de soldados brasileiros que combateram na 2ª Guerra Mundial. "Todo esse aparato para enfrentar um grupo de 69 guerrilheiros e alguns camponeses que se juntaram as forças revolucionárias. O resultado disso foram guerrilheiros executados, com corpos mutilados e jogados em locais desconhecidos. A selvageria atingiu também a população local, que sofreu diariamente a violência dos ditadores", lembrou Álvaro.

A construção do processo democrático no Brasil foi destacada pelo ex-governador da Bahia e vereador de Salvador, Waldir Pires. “A luta para construirmos a democracia é um desafio permanente, é a luta da convivência do ser humano e da sua inclusão com dignidade. O nosso país precisa ser fonte e vanguarda nesse processo”, afirmou.

O evento contou com a presença de Micheas Gomes de Almeida, conhecido como Zezinho do Araguaia. Na oportunidade, o ex-guerrilheiro relatou os momentos vividos na região amazônica brasileira, ao longo do rio Araguaia, e foi homenageado com uma placa em reconhecimento à sua luta em defesa da justiça. "Fui apenas um contribuidor para a abertura democrática que vivemos hoje. O meu cotidiano na guerrilha era levar remédios, suprimentos e munições para os companheiros. Atualmente, o meu dever não é só de resgatar essa história, mas continuar a luta por liberdade e respeito", ressaltou.

Daniel Almeida, Zezinho do Araguaia, Álvaro Gomes e Osvaldo Bertolino

Zezinho do Araguaia foi homenageado com uma placa entregue por Álvaro Gomes, o deputado federal Daniel Almeida (PCdoB) e o representante da Fundação Maurício Grabois, Osvaldo Bertolino. “Eu não fui um guerrilheiro, eu continuo sendo um lutador na defesa dos camponeses. Lutamos no Araguaia pela liberdade e desenvolvimento da humanidade”, disse Zezinho, na lucidez dos seus 80 anos, ressaltando a bravura e a luta das mulheres na guerrilha. Zezinho pediu que a Bahia deflagre uma campanha pela localização e identificação dos restos mortais dos combatentes e destacou a luta dos camponeses e operários de Xambioá, em Tocantins, para a criação do Memorial da Guerrilha do Araguaia.

Os familiares dos mortos e desaparecidos da Bhaia no Araguaia também foram homengaeados com uma placa entregue a Dviva Santana e Nelson Piauhy Dourado (sobrinho dos combatentes José e Nelson Lima Piauhy Dourado).

Leia a íntegra do pronunciamento do representante da Fundação Maurício Grabois, Osvaldo Bertolino:

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Bom dia a todas e a todos!

Transmito aqui a saudação da Fundação Maurício Grabois, em nome do seu presidente, Adalberto Monteiro, aos presentes, às autoridades, aos integrantes da mesa, aos organizadores deste evento, em especial ao deputado Álvaro Gomes. Este ato, que se soma a centenas de outros realizados pelo país afora, reforça a convicção dos democratas, patriotas e progressistas de que o combate à ditadura militar foi um dos mais expressivos capítulos da rica história de lutas do povo brasileiro.

A quantidade de eventos, das mais variadas formas, uns organizados por governos e entes legislativos, outros por movimentos sociais, demonstra de maneira bastante positiva como ficaram isolados os que se atreveram a pronunciar algum tipo de apoio ao regime dos golpistas de 1964, ao passo que a resistência democrática vem sendo enaltecida e glorificada. No Congresso Nacional, ouviu-se apenas uma conhecida voz destoante se manifestar a favor dos golpistas. As manifestações pró-ditadura, mesmo abanadas pela mídia, não expressaram mais do que diatribes e disparates de minguados participantes. 

Dessa equação podemos concluir que o significado desses atos é a execração da ditadura e a elevação dos ideais das mulheres e homens que empreenderam a resistência democrática. Ideais que construíram as bases da democracia na qual o Brasil hoje se apoia para buscar seu desenvolvimento econômico, social e político e que custaram muitas lutas, sacrifícios inauditos e o sangue generoso de muitas vidas sacrificadas no combate aos algozes do povo brasileiro.

Outra questão importante a destacar é que no conjunto desses atos surgiram mensagens fortes e convergentes de que aquela luta se propaga nos dias atuais com a exigência democrática de que, passados 29 anos do fim do regime discricionário de 1964, não é mais possível a nação não ter conhecimento sobre a sua memória e sua verdade.

O povo brasileiro tem o direito de conhecer a sua história e, ao mesmo tempo, ver os agentes do Estado que cometeram torturas, praticaram assassinatos insanos e atentaram acintosamente contra os direitos humanos serem devidamente punidos. Que se abram todos os arquivos! Que a voz da democracia se imponha sobre os que insistem em impedir o pleno exercício dos direitos cidadãos do povo brasileiro!

Falar da ditadura militar e da resistência democrática é percorrer o fio da nossa história. Ao fazê-lo, impõem-se a constatação de que o golpe militar representou um ato criminoso contra os mais sagrados direitos desta nação e do seu povo. Nele estavam condensados intentos que vêm dos que sempre em nossa história se opuseram ao progresso social e ao desenvolvimento do país. Ideais que se ligam aos dos que ficaram contra a Independência, a Abolição, a proclamação da República. E se condensaram ao longo do século XX para tentar perpetuar o século XIX, em especial depois da Revolução de 1930.

Quando os ventos democratizantes varreram o mundo logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, no Brasil a ditadura do Estado Novo foi abaixo e em seu lugar emergiu um processo democrático que, mesmo alicerçado na Constituição de 1946, não resistiu aos golpes dos seus inimigos. O governo do general Eurico Gaspar Dutra desencadeou uma ofensiva golpista que atingiu duramente o Partido Comunista do Brasil, primeiro com a cassação do seu registro eleitoral e depois com a cassação da sua bancada parlamentar.

O mesmo governo Dutra, peça fundamental do expansionismo do regime dos Estados Unidos na América Latina na nascente Guerra Fria, patrocinou o surgimento da Escola Superior de Guerra, fortemente influenciada pela doutrina norte-americana, subordinada ao Estado-Maior das Forças Armadas, que seria a incubadora das manobras que levariam o país a ser vítima do golpe de 1964 — depois de ter resistido a tentativas contra o segundo governo de Getúlio Vargas e os governos de Juscelino Kubitscheck e João Goulart.

Para o PCdoB, conforme registra o documento intitulado “Cinquenta anos de um golpe contra a democracia, os trabalhadores e o Brasil”, recentemente publicado, o golpe militar teve dois aspectos principais. Primeiro, sua natureza antidemocrática, manifestada já nos primeiros atos do governo golpista, com cassações de mandatos parlamentares, prisões de lideranças sindicais, operárias e populares, aumento da repressão contra a luta democrática e patriótica, censura contra a imprensa e às artes. Segundo, a reordenação do desenvolvimento brasileiro com a imposição do arrocho salarial e de regras favoráveis ao imperialismo e ao grande capital, sobretudo estrangeiro.

A trama golpista foi abertamente apoiada pelos Estados Unidos. A Escola Superior de Guerra foi o centro da conjura. A máquina golpista foi montada por setores do Exército e a sustentação política era constituída basicamente por latifundiários, governadores e parlamentares direitistas, a mídia e o clero conservador. Por trás de tudo, movendo todo o aparato, estava o embaixador dos Estados Unidos, Lincoln Gordon, e o seu adido militar, o general Vernon Walters.

Esse conhecido militar norte-americano, famoso por prestar serviço a vários governos trabalhando pela Central de Inteligência Americana — a famigerada CIA — foi designado para o posto de adido militar de Washington no Brasil com o objetivo deliberado de derrubar o governo do presidente João Goulart.

Na ocasião, o general lançou um livro com o sugestivo título de “Missões Silenciosas”. A revista Newsweek, em sua edição do dia 1º de abril de 1966, publicou informações sobre as atividades de Walters na montagem do golpe no Brasil. Uma delas dizia que sete dias antes da derrubada do governo do presidente João Goulart o general havia telegrafado a Washington dando detalhes da trama golpista.

Quando assumiu a presidência da República logo após o golpe, o marechal Humberto Castelo Branco ofereceu um jantar especial a Walters. Em entrevista publicada na revista IstoÉ de 20 de dezembro de 2000, Walters disse: “Fiquei bastante preocupado com aquele comício do presidente Goulart com bandeiras vermelhas.” Referia-se ao “comício das reformas”, realizado em 13 de março de 1964 em frente à estação ferroviária Dom Pedro II, também chamada de Central do Brasil, no Rio de Janeiro.

Em agosto de 1964, a Comissão Executiva do PCdoB divulgou o documento intitulado “O Golpe de 1964 e seus Ensinamentos”, avaliando que o ocorrido era resultado dos avanços de um projeto estratégico dos setores mais reacionários internos a serviço do imperialismo norte-americano. A direção do PCdoB chegou à conclusão de que para discutir profundamente a forma de enfrentar a ditadura militar era necessário convocar uma Conferência, que seria realizada em julho de 1966 em São Paulo.

Além das questões organizativas — principalmente no tocante à segurança —, a Conferência debateu e aprovou a sua linha política, contida no documento intitulado “União dos Brasileiros para Livrar o País da Crise, da Ditadura e da Ameaça Neocolonialista”. O documento diz: “Perigo sem precedente paira sobre o Brasil, sujeito a viver longo tempo sob o regime ditatorial, a ter seu desenvolvimento interrompido e a perder suas características de nação independente. Em tal circunstância, nenhum problema pode sobrepor-se ao objetivo de salvar o país desse perigo.”

Numa certa altura do texto, o PCdoB apontou a guerrilha como uma das principais formas de luta contra a ditadura: “A ideia de que é indispensável empunhar armas para libertar o país do atraso e da opressão vem ganhando força. A luta revolucionária em nosso país assumirá a forma de guerra popular.” A ideia contida no documento era a de realizar um intenso trabalho político e de organização popular, criando pequenos núcleos de combatentes, em especial no campo.

Com base nessa resolução da Conferência, o PCdoB saiu a campo para verificar os melhores lugares para começar a implantação do trabalho da guerra popular. O Partido criou três pequenos grupos de trabalho — um dirigido por Maurício Grabois e João Amazonas, outro por Pedro Pomar e um terceiro por Carlos Danielli.

O grupo de Pomar trabalhou na região do Vale do Ribeira, em São Paulo. Carlos Danielli e seus companheiros foram para o oeste da Bahia, depois visitaram alguns pontos no Ceará, Piauí e Maranhão. Maurício Grabois e João Amazonas foram para a região do Araguaia, sul do Pará, que se liga às matas da Amazônia.

A proposta inicial era a de instalar vários pontos de trabalho para uma futura guerra popular, mas naquela circunstância o PCdoB julgou que seria mais sensato inicialmente concentrar as poucas forças existentes em apenas um local. A região do Araguaia foi considerada a mais apropriada devido à mata fechada.
O PCdoB avaliou que um ataque da reação ali seria dificultado porque o inimigo não poderia usar tanques, artilharia, bombardeio aéreo de precisão. As forças militares, a pé como os guerrilheiros, ficariam em desvantagem diante da preparação prévia da guerrilha. O local também possuía caça abundante, castanha-do-pará, babaçu e outras fontes de alimentação — além de ser propício às manobras militares das forças guerrilheiras com suas vastas extensões e profundidade.

O PCdoB começou efetivamente a implantar a Guerrilha do Araguaia em 25 de dezembro de 1967, quando Maurício Grabois, que seria o comandante militar dos guerrilheiros, desembarcou na região. Em julho de 1968, conduziu ao local João Amazonas e André Grabois, seu filho. Em seguida chegou Ângelo Arroyo, outro dirigente do PCdoB.

No ano de 1969, o número de militantes encaminhados à Guerrilha aumentaria significativamente. É que no dia 13 de dezembro de 1968 a ditadura decretou o AI-5, intensificando ainda mais as medidas repressivas. Na prática, estava decretado o terrorismo oficial de Estado. Para muitos desses militantes, viver nas cidades era caminhar à beira do precipício. O AI-5 abolira o habeas corpus e quem fosse preso dificilmente escaparia da morte.

No começo de 1969, o PCdoB realizou uma reunião ampliada do Comitê Central na qual aprovou o documento intitulado “Guerra Popular — Caminho da Luta Armada no Brasil”, que expôs, “nos aspectos essenciais”, a concepção “da luta armada em que todo o povo brasileiro se empenhará para livrar o país da ditadura e do domínio imperialista norte-americano”, e o “Manifesto ao Povo”, denunciando o banditismo da repressão e conclamando a unidade nacional para “derrubar os opressores”.

Os guerrilheiros começaram a trabalhar e a conviver com os moradores da região em posses previamente adquiridas. Formaram lavouras, exploraram castanhais e montaram pequenos comércios. Ao mesmo tempo, desempenhavam um ativo trabalho social. O comando político da Guerrilha era formado por Maurício Grabois, João Amazonas, Ângelo Arroyo e Elza Monnerat. Havia também a Comissão Militar e um comandante em cada um dos três destacamentos.

Na virada de 1972 para 1973, a ditadura desferiu um duro golpe na Guerrilha ao assassinar, sob torturas, os dirigentes do PCdoB Carlos Nicolau Danielli, Luiz Guilhardini, Lincoln Oest e Lincoln Bicalho Roque, que serviam de apoio nas cidades de São Paulo e Rio Janeiro. Em 12 de abril de 1972, a repressão havia iniciado o ataque à Guerrilha. Um grupo de vinte soldados do Segundo Batalhão de Infantaria de Selva atacou o destacamento A, comandado por André  Grabois. Era o início da primeira campanha da repressão.

Dois dias depois, quinze soldados atacaram o destacamento C, que conseguiu manter contato com a Comissão Militar, que avisou o destacamento B. Nessa troca de avisos, foi preso o primeiro guerrilheiro — José Genoino Neto, que havia sido enviado do destacamento B para o A.

Estavam na região sessenta e nove guerrilheiros, com boas reservas de alimentos, roupas, remédios e munição, mas com armas precárias. Surpreendidos pela ação resoluta dos guerrilheiros, os homens da repressão decidiram deixar o local em julho de 1972.

A segunda campanha começou em setembro de 1972, com um contingente de oito a dez mil homens espalhados em bases montadas em fazendas e roças. Os guerrilheiros estavam mais experientes. O conhecimento da mata era maior, o contato com a população estava mais consolidado e a preparação militar havia sido intensa. Novamente recebidos por uma resistência decidida, em novembro de 1972 os repressores decidiram deixar a região para preparar uma nova operação.

Os homens da repressão montaram, no período de trégua, uma grande rede de espionagem e investiram em obras de infra-estrutura. Agentes a serviço do Exército e da Polícia Federal infiltraram-se entre os moradores. Foram construídos quartéis em várias cidades, estradas foram abertas e outras melhoradas. A Comissão Militar também aproveitou esse período de calmaria para preparar a Guerrilha. Foram distribuídos vários documentos, principalmente o Programa da União pela Liberdade e pelos Direitos do Povo.

Em outubro de 1973, precisamente no dia 7, começou a terceira campanha — a fase sinistra da guerra, na definição de um padre da região. A primeira providência foi a de criar um vazio em volta dos guerrilheiros, com ocupações, prisões e torturas. Quase toda a população masculina das localidades onde atuava a Guerrilha foi presa.

Casas, paióis e pontos comerciais foram destruídos. O número de soldados que chegavam à região não parava de crescer. Os homens da repressão montaram bases de operações no meio da mata, apoiadas por helicópteros, e instalaram um forte aparato de guerra.

As forças militares mobilizadas para o combate final eram gigantescas. As tropas do Exército foram ajudadas por aviões e helicópteros da Força Aérea Brasileira, lanchas da Marinha e equipes especializadas — como a Brigada de Paraquedistas, sediada no Rio de Janeiro, e o Comando de Operações na Selva. Os postos da Polícia Militar instalados nas rodovias funcionaram como apoio para as “investigações”.

O conceito dessas ações foi definido pela repressão como “guerra suja” — não havia regras para as perseguições. Moradores foram expulsos de suas casas, tiveram suas posses destruídas, foram presos e cruelmente torturados. Muitos foram executados.

Em Xambioá foram construídos buracos, conhecidos como “Vietnã”, para onde eram levados os suspeitos de ajudar a Guerrilha — uma grande parcela da população, sendo que os presos e torturados, segundo cálculos de Ângelo Arroyo, um dos dirigentes da Guerrilha, foram mais de mil — e lá deixados por dias e noites, alguns pendurados de cabeça para baixo. O efetivo mobilizado foi o maior movimento de tropas desde a organização da FEB.

As operações abrangeram um imenso território em volta da área de conflito e em alguns pontos foram lançadas bombas Napalm — uma espécie de reagente químico — na floresta. À estratégia da segunda campanha, formulada pelos generais Antônio Bandeira, Viana Moog e Hugo Abreu, se juntaram as colaborações do coronel do Exército português Hermes de Oliveira, veterano das guerras coloniais na África, e possivelmente ajudas de militares norte-americanos.

O regime havia avaliado a dimensão do movimento guerrilheiro e chegado à conclusão de que ele era resultado de um planejamento estratégico do PCdoB. Houve, no final das contas, um choque entre duas concepções para o país, radicalmente opostas — uma mobilizava um ideal democrático e outra uma gigantesca máquina de guerra fascista.
Na definição do general Viana Moog, a Guerrilha do Araguaia foi “o mais importante movimento armado rural já ocorrido no Brasil, principalmente por ter sido mais organizado”.

Essa convicção de que aquele movimento de resistência deveria desaparecer do mapa e da história foi firmada quando o Estado-Maior do Exército, sob o comando do general Orlando Geisel, reconheceu os fracassos das duas primeiras operações regulares — conforme atesta um relatório do Centro de Informações do Exército. Tomou-se, então, a decisão de desencadear a “guerra suja”.

No início da operação, batizada de “Sucuri”, instalou-se na região um sujeito chamado Marco Antônio Luchini, enviado como engenheiro do Incra. Era na verdade o major Sebastião Rodrigues de Moura, o Curió, ferrenho anticomunista que em 1961, como tenente, foi preso por participar da trama que tentou impedir a posse presidencial de João Goulart.

Curió foi, possivelmente, a figura que mais encarnou o espírito da “guerra suja”, que rasgou todas as leis e os princípios que regem os conflitos militares e os direitos básicos do ser humano. Com o fim dos combates, ele se estabeleceu na região, onde foi eleito deputado, dominou o garimpo de Serra Pelada à força e fundou uma cidade em homenagem ao seu nome, chamada Curionópolis.

Em 25 de dezembro de 1973, Curió comandava a patrulha que no final daquela manhã chuvosa, por volta das onze horas e vinte e cinco minutos, encontrou um grupo de guerrilheiros.

O major viu entre eles aquele que um relatório do Centro de Informações do Exército classificou como o comandante militar da Guerrilha, que se destacava dos demais pela idade — estava com 61 anos. Maurício Grabois recebeu um tiro de fuzil no braço esquerdo, abaixou-se, puxou o revólver e revidou até ser atingido mortalmente na cabeça.

No tiroteio contra a Comissão Militar, dos quinze que estavam no grupo dez sobreviveram. Os mortos foram, além de Maurício Grabois, seu genro Gilberto Olímpio Maria, Líbero Giancarlo Castiglia, o “Joca”, Paulo Mendes Rodrigues e Guilherme Gomes Lund. Os últimos guerrilheiros foram capturados e assassinados no primeiro semestre de 1974.
Mesmo derrotada militarmente, a Guerrilha do Araguaia cumpriu um papel relevante. Apesar da forte censura, ela chegou ao conhecimento de muitas pessoas, de boca em boca, pelos jornais clandestinos, por notícias de emissoras de rádio do exterior, alimentando o ânimo e a esperança da oposição ao regime.

Hoje, o exemplo do Araguaia, a coragem dos guerrilheiros e a disposição de pagar com a própria vida a ousadia de enfrentar a ditadura impulsionam setores do povo – em especial da juventude – a se engajarem na luta democrática e popular. Os nomes dos guerrilheiros e guerrilheiras, como os baianos Dinalva Oliveira Teixeira, a Dina; José Piauhy Dourado, o Ivo; Uirassu de Assis Batista, o Valdir; Rosalindo de Sousa, o Mundico, encontram-se na galeria de heróis do povo brasileiro. Sem falar no Zezinho do Araguaia, que honra esta Casa e a Bahia com a sua presença.

A ação criminosa da ditadura voltou a repetir-se em 1975 e 1976, com os assassinatos de Vladimir Herzog e Manoel Fiel Filho. Em 16 de dezembro de 1976, ocorreu a Chacina da Lapa, em São Paulo. A casa onde se realizavam as reuniões do Comitê Central do PCdoB foi atacada; Pedro Pomar e Ângelo Arroyo foram assassinados na ocasião; João Batista Drummond foi morto na tortura.

E os dirigentes Haroldo Lima, Aldo Arantes, Elza Monnerat e Wladimir Pomar, além do motorista Joaquim Celso de Lima e da caseira Maria Trindade, foram presos e torturados. Era a vingança da ditadura contra aqueles que ousaram dirigir a resistência armada no Araguaia.

Em 1984, há 30 anos, foi apresentada ao Congresso Nacional a Emenda Dante de Oliveira, que instituía a eleição direta para presidente da República. As forças democráticas e populares realizaram, entre novembro de 1983 e abril de 1984, provavelmente as maiores mobilizações de massas já vistas no país. Foi a chamada campanha das “Diretas Já!”

Sob ameaça da ditadura, a emenda foi votada pelo Congresso Nacional em 25 de abril de 1984, sem alcançar o número de votos suficientes para sua aprovação. Desde então, o foco da agenda nacional passou a ser a eleição presidencial indireta, marcada para o Colégio Eleitoral, em 15 de janeiro de 1985. A eleição de Tancredo Neves assinalou o fim da ditadura.

Sem abandonar a luta nas cidades, o PCdoB, orientado pela teoria da “Guerra Popular Prolongada”, cumpriu o seu papel histórico, assim como outras forças democráticas, que igualmente resistiram à ditadura de variadas formas. Os ideais democráticos prosseguem hoje com a batalha para ampliar a democracia com a inadiável Reforma Política necessária para elevar a participação do povo nos destinos da nação, fortalecendo os partidos e assegurando o pluralismo político, estabelecendo o fim do financiamento privado das campanhas eleitorais.

Neste momento, é necessário resgatar o papel do campo democrático e progressista na luta em defesa da democracia. Ao mesmo tempo, denunciar a recorrente intervenção golpista das forças reacionárias contra os ciclos progressistas do país. Foi o mesmo golpismo que veio à tona, em 2005, quando essas forças, alegando o chamado “mensalão”, atacaram o governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva e chegaram a tentar, com o apoio da mídia, cassar seu mandato.

Este espírito de revanche moveu a ação da direita e dos conservadores brasileiros nos últimos 11 anos de governo. É uma ação contra os avanços da democracia política e social, sempre ceifados ou sufocados pela direita na história da República — ação desestabilizadora que também ocorre contra outros governos progressistas e anti-imperialistas na América Latina.

Na data simbólica do cinquentenário do golpe de 1964, o PCdoB, que comemora 92 anos na defesa permanente da democracia, defende a união de amplas forças políticas e sociais, democráticas e progressistas, em defesa do Brasil, do desenvolvimento, da democracia e do progresso social, barrando qualquer tentativa de retrocesso.

Muito obrigado