Boas vindas ao Portal Grabois, conheça nossa marca
O que você está procurando?

Laudo da exumação conclui que a militante Iara Iavelberg foi assassinada durante a ditadura militar

Nesta segunda-feira (4), no auditório Teotônio Vilela, a Comissão Estadual da Verdade Rubens Paiva realizou audiência pública para tratar da morte de Iara Iavelberg, militante de esquerda morta durante a ditadura militar instalada em 1964.

Compuseram a mesa dos trabalhos o presidente da comissão, Adriano Diogo (PT), o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, o irmão e a sobrinha da Iara, Samuel e Mariana Iavelberg, a psicóloga Maria Auxiliadora, o cineasta e marido de Mariana, Flávio Frederico, o médico legista Daniel Munhoz, a jornalista baiana Marluce, além das amigas Tutinha Magaldi, a atriz Dulce Muniz, Thaís Barreto e Ivan Seixas, e a coordenadora da Comissão da Verdade Amélia Telles.
Amélia Teles falou especificamente sobre o papel das mulheres na luta pelos direitos humanos e pela justiça durante a ditadura. "As mulheres pegaram em armas, escreveram, distribuíram publicações, cuidaram da saúde dos feridos, cuidaram das crianças em perigo, além de terem visto crianças sendo torturadas. Foram impedidas de amamentar quando tiveram filhos nas prisões, foram estupradas, tiveram seus corpos expostos a torturas, foram mutiladas. Ao buscar a verdade, a comissão também analisa os fatos e suas circunstâncias numa perspectiva de gênero, considerando as peculiaridades femininas". Segundo ela, em março, mês das mulheres, as audiências serão dedicadas às mulheres militantes que desapareceram naquele período da nossa história.
Thaís Barreto fez um breve relato da vida de Iara. Nascida em São Paulo, em 7 de maio de 1944, Iara Iavelberg, psicóloga de formação, foi militante e guerrilheira, integrante da luta armada, tendo pertencido à Polop (Organização Revolucionária Marxista Política Operária) e depois ao MR-8 ( Movimento Revolucionário 8 de Outubro). Foi companheira de Carlos Lamarca, um dos principais líderes da oposição armada ao regime militar. Iara morreu num cerco a um apartamento na praia da Pituba, na Bahia, em agosto de 1971. Segundo Thaís, após várias divergências e incongruências no laudo da certidão de óbito da militante, em 2003 foi pedida a exumação do corpo, que havia sido enterrado na ala de suicidas do Cemitério Israelita de São Paulo.
Exumação do corpo
"Fui procurado em 2003 por Samuel Iavelberg para tratar da exumação do corpo de Iara, pois havia muitas divergências sobre as circunstâncias de sua morte. Ela havia sido enterrada no cemitério israelita como suicida. De acordo com o judaísmo, suicidas não podem ser enterrados como os outros mortos, e são emparedados, causando vergonha aos familiares. Segundo o advogado Greenhalgh, foi extremamente difícil conseguir a exumação, já que toda a comunidade judaica foi contrária ao procedimento, agindo por meios legais e usando também a igreja para impedi-lo. "O laudo médico demonstrou que ela foi assassinada, ficando clara a farsa da versão oficial", disse. Greenhalgh afirmou que a decisão sobre o caso Iara está sendo usada em outros casos de judeus com suspeita de terem sido mortos, e não cometido suicídio.
O médico legista Daniel Munhoz explicou por meios técnicos como se chegou à conclusão de que a bala que atingiu o corpo de Iara não poderia ter sido disparada por ela mesma. "O atestado de óbito que tínhamos em mãos, além de laudo necroscópico e o documento da autópsia tinham rasuras, além de uma dúvida clara do legista local, que levantou suspeitas sobre a tese de suicídio vinda no documento do departamento de polícia de Salvador. O tiro levado por Iara não corresponde a tiro de suicida, que é um tiro chamado de contato, muito próximo da pele. O tiro que a atingiu no peito foi dado a uma distância incompatível com a distância de um tiro dado por um suicida", declarou o legista.
Verdade dos fatos
Mariana Iavelberg é casada com Flávio Frederico. Eles possuem uma produtora de cinema. Há alguns anos estão produzindo um filme sobre a vida de Iara Iavelberg. Mariana destacou que há várias testemunhas do fato ocorrido naquele dia no prédio da praia da Pituba em Salvador. Segundo os relatos, Iara fugiu de onde estava e foi se esconder no apartamento ao lado. Quando ouviu tiros "e há várias marcas de tiros nos azulejos do banheiro onde estava escondida", ela gritou : "eu me entrego". Logo depois foram ouvidos tiros. "Estes depoimentos corroboram a versão do legista Munhoz", disse Mariana.
A psicóloga Maria Auxiliadora, do Conselho Regional de Psicologia de São Paulo, informou que o conselho vem se engajando na luta pelos diretos humanos. Segundo ela, estão sendo levantados dados sobre psicólogos desaparecidos durante a ditadura militar. "Citamos agora, além da Iara, Aurora Nascimento Furtado e Marilene Vilas Boas. A psicologia tem se empenhado no resgate da memória deste triste período da nossa história".
"Depois de 49 anos, nem os documentos disponíveis da ditadura militar estão mesmo disponíveis. A ditadura não terá terminado enquanto a verdade dos fatos não for esclarecida", concluiu Adriano Diogo.
Ao final da reunião foi mostrado um trailer do filme Em busca de Iara, de Mariana e Flávio, que será lançado no festival É tudo verdade. Assessor da Comissão da Verdade de São Paulo, Ivan Seixas informou que o Condephaat, por solicitação do Ministério Público Federal, autorizou a liberação da construção de um memorial às vítimas da ditadura no Cemitério da Vila Formosa, onde 4 mil ossadas estão enterradas em valas comuns.