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Chacina da Lapa: "Era uma covardia completa", diz Aldo Arantes

O evento teve a participação de Aldo Arantes e Wladimir Pomar, presos durante a ação militar que resultou na morte de três dirigentes do PCdoB em 16 de dezembro de 1976: Ângelo Arroyo, Pedro Pomar e João Baptista Drummond.

Ao abrir os relatos, Pomar lembrou que foi capturado na Avenida Santo Amaro e espancado no Doi-Codi, sendo levado para o Rio de Janeiro no dia seguinte juntamente com Arantes, Haroldo Lima e Elza Monnerat.

“Um dos momentos que mais sofri foi quando fui interrogado e queriam que eu admitisse ter estado na Tchecoslováquia. Meu irmão tinha estado, mas eu não ia dizer. Por conta das minhas negativas, deram-me um golpe no coração e achei que naquele momento eu fosse morrer”.

Pomar relatou ainda que “ao retornar a São Paulo, fui colocado nu numa solitária, com um colchão imundo. Acho que passei 47 dias nessa situação”. Naquele período, soube que seu pai, Pedro, fora assassinado.

Segundo Wladimir Pomar, ele seria capaz de reconhecer dois dos torturadores, embora não saiba quem eram. “Mas no Dops lembro-me que havia o Pachecão e o Pachequinho, que não me torturaram fisicamente, mas psicologicamente”.

Aldo Arantes, membro do Comitê Central do PCdoB, relatou que os agentes da repressão, ao invadirem a casa da Rua Pio XI, na Lapa, onde ocorria reunião da direção do partido, tinham um objetivo claro: executar o presidente João Amazonas, que estava na China com Renato Rabelo, atual presidente.

“Jover Telles achava isso”, disse, recordando-se do traidor que entregou os companheiros à ditadura. “Eu morava em Itaquera, estava voltando para casa e quando cheguei à estação Paraíso, percebi que estava sendo seguido. Levaram-me para o carro, eu gritava bastante, mas naquela conjuntura, ninguém pôde fazer nada”.

No prédio da Rua Tutóia, Arantes foi brutalmente torturado. “Era uma covardia completa”, recordou-se. Além do pau-de-arara, o comunista foi vítima da “cadeira do dragão” e ainda da “geladeira”, um cubículo onde os presos eram colocados e submetidos a altíssimas e baixíssimas temperaturas.

Arantes relatou ainda de ter ouvido um falatório tenso nas redondezas de sua cela. “Acho que discutiam sobre a morte de Drummond”. João Baptista Drummond fora preso depois da reunião do Comitê Central onde ocorrera a Chacina e torturado até a morte. Recentemente, numa decisão inédita da Justiça, seus familiares conseguiram mudar sua certidão de óbito onde constava que sua morte era decorrente de traumatismo craniano por atropelamento.

Com a correção, a causa passou a ser traumatismo causado por tortura. “É uma decisão importante porque coloca a verdade em seu lugar”, declarou Arantes. Ele recordou ainda que Sérgio Paranhos Fleury era um dos torturadores.

Emocionado, Arantes lembrou também do papel de sua mãe, dona Maria de Lourdes, de Dom Paulo Evaristo Arns e do advogado Luis Eduardo Greenhalgh na libertação dos presos políticos.

“Naquele momento em que se iniciava o processo de abertura política, com a ajuda de Greenhalgh, minha mãe conseguiu mover uma ação para que eu pudesse ser visitado. Ambos puderam testemunhar o meu estado. Em seguida, ela relatou a Dom Paulo e foi a primeira familiar de preso político a conseguir denunciar publicamente, via imprensa, as torturas que sofríamos”.

Depois dos relatos, o vereador Jamil Murad destacou: “os inimigos da democracia, sejam civis ou militares, partem da filosofia de que é natural esconder os seus crimes da Justiça e, ainda hoje, seguem desafiando nossa Constituição.

A democracia brasileira precisa superar este nó, resgatar o seu passado, para que episódios como esses não se repitam. Sabemos que esses setores da sociedade fariam tudo novamente se tiverem uma conjuntura favorável”.


Fonte: Site do vereador Jamil Murad