1. A inteligência revolucionária da nossa época:

Em janeiro deste ano completaram-se 90 anos da morte de Vladimir Ilitch Ulianov, mais conhecido por Lenin. Diferentemente de anos passados, desta vez registraram-se iniciativas celebrando o legado desse gigante da luta revolucionária pelo socialismo. Entretanto, mesmo em crise sistêmica da sociedade burguesa, persiste uma visão negativa do legado teórico e político de Lenin e das épicas jornadas de Outubro 1917, das quais foi o grande inspirador e dirigente.

Sua firme oposição aos principais líderes da social-democracia europeia, que haviam capitulado perante a deflagração, em agosto de 1914, da Grande Guerra Mundial entre as potências imperialistas, tornou-o a maior referência, entre os marxistas revolucionários, no combate pela renovação e revigoramento do marxismo e pela construção de uma estratégia revolucionária adequada aos novos tempos, caracterizados pela transformação imperialista do capitalismo. Assumiu a fundo a defesa da paz entre os povos, da independência nacional, contra a guerra e o colonialismo.

Quando a revolução soviética triunfou, a maior parte da humanidade ainda vivia sob o domínio de potências coloniais, notadamente de Inglaterra, França, Alemanha, Japão, Holanda etc. Foi ao influxo dos ideais de Lenin que os marxistas passaram a defender o direito das nações à autodeterminação e conclamaram os povos dos países dependentes e coloniais à luta contra a opressão nacional.

Lenin era radical inimigo do dogmatismo e das ideias estereotipadas no interior do marxismo: “A história em geral e a das revoluções em particular é sempre mais rica de conteúdo, mais variada de formas e de aspectos, mais viva e mais ‘astuta’ do que imaginam os melhores partidos, as vanguardas mais conscientes das classes mais avançadas”. Absorvendo ideias pioneiras de Engels, ele travou intenso combate à petrificação doutrinária da teoria marxista, que devia ser um “guia para ação”. Para ele, Marx e Engels apenas haviam colocado as pedras iniciais da construção daquele poderoso sistema teórico, cabendo às sucessivas gerações dar prosseguimento à grandiosa obra. Se o marxismo não conseguisse dar conta dos novos fenômenos que surgiam no movimento histórico, poderia degradar-se e transformar-se num dogma incapaz de intervir no curso dos acontecimentos.

Lenin sugeriu ainda que as revoluções tenderiam a eclodir nos elos mais fracos da cadeia imperialista, não necessariamente onde o capitalismo fosse mais avançado. Constatou que a lei do desenvolvimento desigual criava possibilidades de rupturas revolucionárias, sustentando firmemente que o início da construção do socialismo poderia ocorrer num único país ou num pequeno número de países localizados na periferia do sistema.

2. A força atual da teoria leninista

Quase um século depois de sua publicação, O imperialismo, etapa superior do capitalismo continua sendo um instrumento teórico indispensável à compreensão da lógica concreta do capital. Segundo Lenin, o capitalismo central, mais avançado, reproduz-se em permanente tensão entre a “decomposição” e o “desenvolvimento”. “O imperialismo é a época do capital financeiro e dos monopólios, que trazem consigo, em toda parte, a tendência para a dominação, e não para a liberdade. É a reação em toda a linha, seja qual for o regime político. (…) Intensificam-se também, particularmente, a opressão nacional e a tendência para as anexações, isto é, para a violação da independência nacional”. A dialética materialista de Marx aponta os limites objetivos do modo capitalista de produção e suas rupturas recorrentes, mas abstém-se de especular sobre seu colapso final.

A lei do desenvolvimento desigual do capitalismo – para Lenin uma lei absoluta – é fundamental para entender as determinações que impulsionam a dinâmica do sistema atual de relações internacionais capitalistas.

A crise sistêmica do capitalismo que estamos presenciando inscreve-se num ciclo de agudas crises provocadas pelo predomínio do capital financeiro da época do imperialismo, que amplia o desenvolvimento desigual entre os países centrais e periféricos e estimula os conflitos e as guerras neocoloniais.

A elaboração por Lenin de uma teoria da transição ao socialismo na Rússia Soviética, baseada na análise do capitalismo de Estado e da construção da Nova Política Econômica (NEP) tem uma dramática atualidade. Para ele, a construção do socialismo em países periféricos deveria ser longa e conhecer várias etapas. Num primeiro momento, combinaria elementos socialistas e capitalistas; planejamento e mercado.

Outra importante ideia-força deixada por Lenin é que não existem modelos únicos de revolução ou de transição. Cada povo, a partir de suas condições históricas e de sua consciência social, deverá construir os seus próprios caminhos. Nesse sentido, os partidos comunistas autenticamente revolucionários só poderiam consolidar sua influência junto ao inabalável trabalho de massas intervindo nos acontecimentos políticos e não fugindo deles.

Questão universal e perene da luta de classes no capitalismo, o esquerdismo professava – e professa – a rejeição a quaisquer compromissos com outras camadas sociais ou com forças políticas não comunistas. Lenin, pelo contrário, advogava a necessidade de se estabelecerem acordos e compromissos na luta política. A história do bolchevismo, antes e depois da Revolução de Outubro – dissertou ele em 1920 – realizou-se cheia de casos de manobras, de acordos e compromissos com outros partidos, inclusive burgueses. Ao mesmo tempo sublinhava: “Há compromissos e compromissos”.

3. A fecundidade da construção de Lenin nas adversidades hodiernas.

Do legado teórico marxista em Lenin sublinhamos principalmente: a) a lei do desenvolvimento desigual do capitalismo, compreendendo assimetrias e disputas no núcleo dos países no estágio do imperialismo, e destes com os países periféricos; b) a degeneração multiforme do capitalismo central, até as guerras; c) a evolução do declínio civilizatório deste capitalismo, às revoluções proletárias da nossa época; d) uma nova teoria da transição ao socialismo; e) os inusitados aportes culturais captados no nascedouro da nova sociedade.

De outra parte, sabemos que Lenin passou a ser “sacrificado”, muitas vezes em nome de um Marx “metodológico” ou quase inofensivo. Concomitantemente com a derrota da experiência da construção socialista, configurada numa bipolaridade sistêmica mundial. Da omissão aos ataques a Lenin, setores da intelectualidade buscam eliminar o ineditismo histórico da Revolução de Outubro de 1917.

Em fidelidade à nossa história, elencamos entre as razões fundantes em nos dispormos a construir uma Sociedade dos Amigos de Lenin o forte impacto obtido pelas ideias dele entre pensadores e revolucionários no Brasil. O que conclama reforçar em nossos dias a difusão de seu pensamento, de sua obra, de suas realizações políticas.