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A esquerda não deve fazer das eleições de 2018 “apenas um saudosismo”, nem voltar para propor mais do mesmo. Essa é a avaliação do atual governador do Maranhão, Flávio Dino (PC do B), que, em entrevista ao Brasil de Fato, destaca o tipo de programa que, para ele, o país precisaria adotar na próxima disputa presidencial.

“Não se pode continuar a fazer o mesmo que fazíamos porque há novas questões”, afirma. Um destes assuntos é o da justiça tributária. “Precisamos financiar os serviços públicos e, para isso, precisamos de Justiça Tributária, no sentido de que os mais ricos, os milionários, bilionários, os rentistas e o capital financeiro têm que pagar os seus impostos com proporcionalidade em relação aos mais pobres”, pondera.

Dino tem sido apontado como uma das grandes apostas do partido na conjuntura política pós-golpe e também como um dos principais personagens da esquerda brasileira na atualidade. Confira os principais trechos da entrevista, gravada em São Luís, capital maranhense.

Brasil de Fato – O senhor tem dito que “o pessimismo é uma armadilha ideológica”. Isso nos remete ao debate sobre a criminalização da política, por exemplo. Por que, na sua avaliação, a população não pode cair nessa? 

Flávio Dino – O Gramsci tem uma formulação que eu repito quase como um mantra e diz assim: “Pessimismo na teoria, otimismo na ação”. Ou seja, você tem que ter criticidade pra identificar o que está errado, pra corrigir e procurar os processos de formação de campos de forças que resolvam esses nós, essas questões agudas que impedem o desenvolvimento do país, a justiça social. Agora, você só fará o ciclo completo se você tiver otimismo na ação, porque senão você vai ficar preso exatamente aos diagnósticos e não vai fazer a prognose adequada, a luta adequada. Eu digo que [pessimismo] é uma armadilha ideológica, porque é a paralisia da sociedade em relação aos problemas nacionais e, ao mesmo tempo, uma espécie de diversionismo, porque você desvia a atenção do que está acontecendo. Há coisas de uma anomalia escabrosa, como, por exemplo, a injustiça tributária no Brasil.

Coisas que nem o regime militar teve coragem de fazer agora estão se naturalizando, como, por exemplo, o país perder algo simbólico do próprio conceito de soberania que é o poder de estabelecer a confiabilidade da nossa moeda, do papel-moeda, a segurança das relações jurídicas, porque apenas países muito atrasados praticam esse tipo de terceirização ou privatização, qualquer que seja o nome que se queira dar. Então, quando olhamos tudo isso que está acontecendo, é que nós identificamos que, com esse sentimento de que o Brasil não tem jeito, o povo brasileiro realmente põe tudo a perder, ou, no sentido mais da luta política, de que “a culpa é dos vermelhos”, “a culpa é da esquerda”, é algo que atende exatamente aos interesses dessa minoria de privilegiados que não têm o menor respeito pelo sofrimento do nosso povo, pelos desempregados, por aqueles que precisam do trabalho, da geração de renda, de investimentos, que moram no Brasil.

Brasil de Fato – Olhando um pouco para as eleições de 2018, o senhor tem dito que acredita na vitória de Lula e da esquerda. Se a gente pensar nessa questão da criminalização da política, como a esquerda poderia driblar isso para atingir esse horizonte de retornar à Presidência da República? 

Flávio Dino – Só é possível colocando um programa correto para o debate da sociedade. Nós não podemos fazer da eleição de 2018 um saudosismo apenas nem um itinerário de perdas ou de erros. Temos que olhar pra eleição de 2018 com a bandeira da esperança nas mãos e com o programa na outra mão. Nós precisamos responder à seguinte questão: pra onde levar o país neste próximo ciclo, que não seja apenas “mais do mesmo”? Você não pode dizer que vamos continuar a fazer o que fazíamos porque há novas questões que se colocaram nesse processo. 

Acho, por exemplo, que temos que pautar hoje, com muita ênfase, a questão tributária, e com muita clareza dizer pro povo o seguinte: “Quem precisa dos serviços públicos é o povo mais pobre e por isso nós precisamos financiar esses serviços. Para financiar isso, precisamos de justiça tributária, no sentido de que os mais ricos, os mais poderosos têm que pagar seus impostos com proporcionalidade em relação aos mais pobres. Esse é um debate que nós temos que colocar como infelizmente não colocamos.

Há novas questões, outras se tornaram mais atuais, como a própria questão nacional, porque, quando nós olhamos a abordagem da temática da energia, o que o Brasil está fazendo neste momento? Destruindo a sua soberania energética. Isso se refere ao pré-sal e se refere agora ao setor elétrico, que são ativos estratégicos de uma nação forte, de uma nação capaz de se desenvolver e prover serviços pra população, e nós estamos abrindo mão disso. Então, a questão nacional adquiriu uma nova centralidade, que não é o nacionalismo xenófobo, preconceituoso, mas é a defesa dos interesses nacionais em razão da questão social, da necessidade de financiar as politicas públicas das quais o Brasil precisa, de modo que tenho insistido neste tripé: nação-educação-produção. Acho que em torno desse tripé nós temos que encontrar as respostas e conseguir comunicar isso à população, por isso eu acredito no nosso êxito eleitoral, porque só nós podemos fazer isso.   

Brasil de Fato – Isso seria, então, a matéria-prima mais importante do programa eleitoral de 2018?       

Flávio Dino – Creio que sim, e nós temos o desafio consequente, que é transformar isso em mensagens e políticas capazes de alavancar uma nova mobilização social. E por que eu digo que só nós podemos fazer isso? Porque só nós acreditamos nisto, em direitos, acreditamos nos serviços públicos. Essa fração da elite que aí está acredita na naturalização da injustiça, na exclusão social, na concentração de riqueza nas mãos de uma minoria. Tenta empurrar goela abaixo uma noção de que a mão invisível do mercado vai salvar o país, como se isso tivesse acontecido em algum país do planeta. Nem nos Estados Unidos… 

Essa tragédia do desemprego, do aniquilamento de políticas sociais, a destruição desse patrimônio que nós construímos ao longo do tempo que é o Sistema Único de Saúde (SUS), a destruição das universidades públicas…Temos que transformar isso em potência política, em movimento. Acho que esse é o nosso desafio, de encontrar esses temas corretos, que já estão identificados, em negação ao que está aí, mas, pelo caminho da afirmação, precisamos despertar uma nova esperança na população.       

Edição: Mauro Ramos