A independência do Banco Central ganha destaque em tempos de debate eleitoral. A discussão é pautada por pontos relevantes da temática macroeconômica, tendo em vista sua correlação com aspectos monetários estritos, como juros e crédito, câmbio e, por consequência, nível de atividade, renda e emprego.

Interessante notar que a discussão no Brasil ocorre no âmbito de um cenário internacional ainda complexo. A deterioração decorrente das crises após 2008 e o baixo crescimento dos países desenvolvidos foram impactantes para a desaceleração do crescimento econômico chinês. O enfraquecimento da economia mundial gerou uma sobreoferta de produção e uma desinflação, especialmente nas commodities metálicas.

Os bancos centrais das economias desenvolvidas adotaram, desde o final de 2008, um movimento simultâneo de redução das suas taxas básicas de juros, ao mesmo tempo em que ampliaram a liquidez nos mercados. Vivemos um longo ciclo de taxas de juros reais negativas.

O Fed (banco central dos EUA) já manifestou que manterá baixas taxas de juros até que haja uma clara percepção de recuperação do nível de atividades. Enquanto isso, mantém há seis anos uma taxa nominal de juros básicos abaixo da inflação. Recentemente, o Banco Central Europeu decidiu reduzir ainda mais as suas taxas para 0,05%.

Há uma longa discussão a respeito do grau de independência dos bancos centrais. Na visão mais ortodoxa eles deveriam ter total autonomia frente aos governos, visando resguardar a função de guardião da moeda e gerar credibilidade da política econômica. Trata-se de uma visão desconectada da situação da economia internacional.

O que ocorre na prática é que os bancos centrais vêm atuando de forma coordenada com seus governos, visando combater os efeitos da crise e evitar o seu agravamento. A passividade frente ao quadro internacional representaria custos onerosos sobre o nível de atividade, custo do financiamento da dívida pública e níveis reais das suas taxas de câmbio, especialmente para os países em desenvolvimento.

Daí a importância da autonomia e independência do Banco Central do Brasil. Aqui elas não estão relacionadas ao Executivo, mas às pressões do mercado. É preciso que as autoridades monetárias decidam e implementem as medidas de política econômica, tendo em vista o que é o mais adequado para o conjunto da economia.

Ao longo do último decênio houve uma tendencial e gradativa redução das taxas de juros reais no Brasil, de 9 a 10% anual, para 4,5%. No entanto, estamos ainda longe de imaginar que a batalha chegou ao fim. Na verdade, ela só começou. A nossa taxa de juros reais é ainda muito elevada para padrões internacionais. O desafio é viabilizar as condições para aproximá-la da média de países semelhantes.

Tem havido progressos, mas é preciso avançar nas demais condições imprescindíveis para que os ganhos sejam perenes e sustentáveis no longo prazo. Dentre outros desafios, temos que enfrentar a distorção representada pela indexação de contratos e tarifas. Um resquício do período de inflação crônica, que precisa ser removido, porque também representa um limitador para a redução dos níveis inflacionários e, portanto, das taxas de juros.

Outro ponto importante é a estrutura da dívida pública. O Brasil é o único país que ainda mantém títulos públicos de curtíssimo prazo que remuneram com elevadas taxas de juros, propiciando ao mesmo tempo rentabilidade e liquidez com baixíssimo risco, na contramão da prática usual no mercado internacional.

Nem sempre o que é o desejo do mercado financeiro é o melhor para a nação.

ANTONIO CORRÊA DE LACERDA, economista, é professor do Programa de Estudos Pós-graduados em Economia Política da PUC-SP

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Fonte: Folha de S. Paulo