Moscou anunciou, nesta quarta-feira, como consequência da imposição, pela Europa e os Estados Unidos, de três grupos de sanções contra a Rússia, a proibição, a partir do dia 8 de julho de 2014, e pelo período inicial de um ano, da importação de alimentos oriundos da União Europeia e dos EUA. A medida, que abarca carne bovina, peixes, mariscos, frutas, legumes, verduras, carne de frango, leite e derivados, atinge também as exportações da Austrália, do Canadá e da Noruega, e poderá ser estendida, como afirmou o Presidente Vladimir Putin, a “todos os países que decidiram impor sanções econômicas a entidades e/ou indivíduos russos, ou que se tenham associado a elas”.

Se essa decisão é má notícia para os agricultores europeus, que vendem 11 bilhões de euros, ou 10% de suas exportações, para o mercado russo, e, em menor medida, também para os norte-americanos, ela pode ser excelente para outros países, e, principalmente, para o Brasil.

Quando veio ao Brasil em julho, o Putin já havia anunciado – assim como fez também a China – a retomada das importações brasileiras de carne bovina. Agora, o Ministro da Agricultura da Rússia, Nikolai Fiorodov, acaba de anunciar que as importações de carne passarão a ser da Nova Zelândia e do Brasil – que deverá exportar também 150 mil toneladas de frango a mais.

O Diretor do Serviço de Inspeção Sanitária e Agrícola russo, Serguei Dankvert, se reuniu com diplomatas brasileiros (carnes) , chilenos (frutas e peixes) e equatorianos (peixes e carne) para detalhar as oportunidades de exportação.  

Mais uma vez, é preciso tomar cuidado com os cantos de sereia do “ocidente”.

O agronegócio brasileiro conhece, há anos, as múltiplas facetas do protecionismo europeu na área de alimentos, que vai da mera taxação da mercadoria, à restrição de cotas, barreiras sanitárias de todo tipo, e fartos subsídios para a sua agricultura e suas exportações, que subtraem e sabotam a competitividade de nossos produtos em várias regiões do mundo.

Por um lado, os europeus falam de “livre comércio”, mas atrasam o fechamento de sua proposta ao Mercosul no contexto das negociações comerciais em curso; diversos países predominantemente agrícolas recentemente incorporados ao euro colocam obstáculos ao acordo; e diversos  setores da agricultura europeia, reunidos em organizações como a Copa e a Cogeca, lançam manifestos contra qualquer acordo com os nossos países.

Para o agronegócio brasileiro, é fácil  raciocinar: é melhor aproximar-se de um dos maiores importadores de alimentos do mundo, que é a Rússia, e da China e da Índia, países que estão crescendo mais de 5% ao ano, e incorporando dezenas de milhões de pessoas ao consumo a cada ano – todos eles nossos parceiros no BRICS?

Ou investir tempo e energia com a Europa, um continente no qual a curva demográfica é descendente, o crescimento está estagnado e a população se encontra em acelerado processo de envelhecimento?

Um continente que é o maior exportador mundial de alimentos, e que concorre diretamente conosco, subsidiando direta e indiretamente seus produtos no mercado internacional?

Na hora de negociar, não devemos bater a porta na cara de ninguém. Mas não podemos perder de vista, nem os nossos interesses, nem a lógica, nem a razão.

Publicado em 8/8/2014, no Jornal do Brasil
http://www.jb.com.br/coisas-da-politica/noticias/2014/08/08/o-campo-e-os-brics/