Devemos ao professor Claudio Deddeca, da Unicamp, uma informação preciosa sobre a realidade salarial brasileira. Num artigo publicado na Folha de hoje, destinado a discutir o futuro da lei do salário mínimo, o professor lembra qual é o nosso salário máximo.


Ele mostra que os 400 executivos das 50 maiores empresas registradas na Bovespa embolsam o valor médio de R$ 4, 2 milhões por ano, fora benefícios como auxílio saúde, carro executivo e assim por diante.


É isso que você leu. Os altos dirigentes do capitalismo brasileiro recebem em torno de R$ 350.000 por mês. Ou R$ 10.000 por dia. Ou R$ 416 por hora, se forem incluídos os momentos período de sono. Ou R$ 6,9 por minuto. Ou 11 centavos por suspiro. Olha só: enquanto um miserável das grandes cidades corre pelo trânsito para erguer o braço no farol fechado e pedir uma moedinha, a turma dos 350.000 só precisa respirar: dez centavos já entraram na conta bancária. 


Compare esse rendimento com o mínimo atual, de R$ 724: é 450 vezes maior. Compare com a renda média do trabalhador brasileiro, que é de R$ 1055 para quem tem menos de 24, ou de R$ 1.945 dali por diante. 
Por cada hora de trabalho, a turma dos 350.000 já fica por cima.  Supondo uma jornada de 40 horas semanais,  cada 60 minutos no escritório permite receber R$ 2.187,50.


Estes exercícios matemáticos ajudam a ter uma ideia da desigualdade brasileira, que vai além da economia, da sociologia e chega àquilo que interessa quando se fala em mudanças. Estamos falando de poder político num grau absoluto – pois um abismo dessa natureza não é obra da lei da oferta e da procura, nem de diplomas em Harvard, pós-graduação em Stanford nem de ideias supostamente geniais num seminário num retiro de monges.


Só se explica a partir de uma posição de força, que vai muito além dos muros de uma empresa e só sobrevive se for alimentada e reforçada todos os dias, para impedir mudanças que possam questionar um pouco, as vezes só um pouquinho, esse feudalismo social.


É dali que partem as grandes pressões para impedir toda mudança capaz de questionar essa renda exorbitante, seja pela criação de impostos de acordo com a capacidade de cada um,  seja pela criação de políticas públicas favoráveis aos mais pobres. É ali que nasceu o impostômetro, foi ali que se dinamitou a CPMF que poderia reforçar a saúde pública, é de lá que vem os petardos permanentes para impedir a consolidação de um estado de bem-estar social que, como os mais lúcidos reconhecem, ficou definido até na Constituição de 1988.


O que se argumenta é que a lei do salário mínimo atual, que prevê uma recuperação com base na inflação e na produtividade dos dois anos anteriores, já cumpriu seu papel e que seria hora de deixar o mercado fazer sua parte.
(Entenda-se por mercado o mundo dos 350.000/mês.)


É possível questionar este argumento não só pelo valor atual do mínimo,  quantia que joga a renda média da população brasileira para um patamar bastante baixo, limitando alternativas de crescimento da economia.
De forma moderada, viável, como mostra o professor, a recuperação do mínimo superou uma elevação de 50% ao longo dos anos, mudança que fez bem ao orçamento não só de trabalhadores, mas reforçou  ganhos do grande número de aposentados e pensionistas da Previdência, que em várias cidades do país respondem pelo sustento de boa parte da família, inclusive de netos.


O debate é este.


Como lembra o professor, é impossível discutir seriamente o salário mínimo sem levar em conta o máximo, concorda?

 

Fonte: IstoÉ