A proposta da presidenta Dilma Rousseff de realização de um plebiscito para decidir sobre a promoção da reforma política é uma resposta acertada à insatisfação manifestada nas ruas com a classe política. Abre-se, com a proposta, a possibilidade de um amplo debate com participação efetiva da sociedade.

A população se mostra descontente com os seus representantes eleitos pelo voto porque o atual sistema político-eleitoral distorce as condições necessárias para que a escolha do eleitor esteja realmente identificada com aquilo que ele pensa e espera quando vai às urnas.

A presidenta, com a decisão, assume assim a liderança para colocar na agenda do País uma pauta que já estava nas ruas e vinha sendo defendida por diversos segmentos da sociedade civil organizada. O plebiscito deve corresponder aos anseios da juventude, que exige canais de participação para exercer o direito de influenciar o exercício do poder de seus representantes. Essa será a oportunidade de permitir ao povo que busque uma alternativa para realizar o que o Congresso Nacional vem adiando há décadas.

Como o Congresso Nacional tem se recusado a votar esse tema, o Partido dos Trabalhadores lançou uma campanha pela Reforma Política no último mês de abril, com o objetivo de recolher 1,5 milhão de assinaturas para a apresentação de um projeto de Lei de Iniciativa Popular.

Entre os pontos fundamentais da proposta está o financiamento público exclusivo de campanhas políticas. Esse é o principal instrumento para inibir a corrupção, pois tira de cena o poder econômico como patrocinador dos mandatos eletivos. Também é uma forma de tornar as campanhas eleitorais mais baratas, democratizando o acesso às candidaturas.

Além disso, é fundamental repensar o processo eleitoral e criar novas formas de participação da sociedade nas decisões públicas. Aperfeiçoando o sistema eleitoral, o país aumenta a chance de os cidadãos se sentirem representados pelos eleitos.

A sociedade brasileira tem demonstrado, ainda, que almeja uma democracia participativa, na qual ela possa influir na definição das políticas públicas prioritárias, em um processo dinâmico, de acordo com a conjuntura econômica, social e política dos municípios, dos estados e do país.

Assim, é preciso garantir maior centralidade aos Conselhos e Conferências nas decisões sobre os rumos das políticas públicas, para que eles deixem de ser apenas consultivos para se tornarem deliberativos.

Esse desejo está sendo manifestado principalmente pelos jovens que ganharam as ruas nos últimos dias. A juventude quer mais do que entregar mandatos aos seus representantes; quer decidir como e com o que os recursos públicos serão gastos. Daí a necessidade de efetivar o orçamento participativo e de ampliar outros mecanismos de democracia direta, como projetos de lei de iniciativa popular, plebiscitos e referendos, utilizando as ferramentas virtuais como instrumentos de democratização do poder.

As decisões sobre grandes investimentos, como, por exemplo, a de realizar megaeventos como a Copa do Mundo, deveriam passar por esses mecanismos de democracia direta, limitando o poder de decisão dos governantes.

A onda de protestos que se seguiu à luta pela redução das tarifas do transporte público surgiu em um momento em que várias cidades brasileiras enfrentam o esfacelamento da qualidade de vida, com a crise na mobilidade urbana, com caos no trânsito e transporte coletivo precário, a especulação imobiliária que dificulta o acesso à moradia digna e a escalada da violência urbana, com arrastões e até pessoas sendo queimadas vivas.

Embora o Brasil tenha avançado muito em termos de política social no governo Lula, para a atual juventude estas conquistas já são coisas do passado. Os programas sociais que o governo implantou nos últimos anos – como o Bolsa Família e o Prouni – ocorreram quando os atuais jovens eram crianças. Essas conquistas da população brasileira não são novidade para quem tinha oito ou nove anos de idade quando o ex-presidente Lula assumiu o governo. Eles cresceram ao mesmo tempo em que os resultados das políticas sociais se confirmavam.

Os jovens olham para as condições atuais de vida e para o futuro, desejando, como é natural, mudanças mais profundas. Embora, hoje, encontrar emprego não seja difícil como era nos anos 1980 e 1990, as condições oferecidas não atendem às expectativas da juventude, em termos de remuneração e condições. Muitos dos que se formaram em universidades privadas, inclusive com o benefício do Prouni, não encontram empregos melhores do que tinham antes. Os jovens de hoje, em São Paulo, sempre usaram o bilhete único; não sabem que antes cada vez que se subia em um ônibus se pagava uma nova passagem. Por isso, querem mais, transportes melhores e a custo mais reduzido.

A Reforma Política, a democracia direta, o compromisso com a ética, o combate à corrupção e a luta por direitos sociais para todos, inclusive o transporte público, são pontos essenciais para a juventude e, efetivamente, para todos nós que acreditamos no aprofundamento da democracia.

A novidade para os jovens, mais do que novos programas públicos pontuais como o governo lançou nos últimos dez anos, será alterar as regras para que todos possam participar do jogo político, em busca de avanços que lhes permitam não apenas um futuro melhor, mas a possibilidade de interferir efetivamente nas decisões que afetam a vida do país.

Nabil Bonduki, professor titular do Departamento de Planejamento da FAU-USP, é vereador em São Paulo pelo PT e colunista da CartaCapital.