Os resultados do primeiro turno das eleições presidenciais francesas não causaram nenhuma surpresa. O politicamente anulado e, já batendo em retirada presidente Sarkozy não conseguiu registrar sequer uma “vitória de consolação” contra seu adversário socialista mesmo que fosse no primeiro turno, para que assim pudesse argumentar que ele era superior de François Hollande na disputa pessoal entre os dois, mas perdeu no segundo turno por falta de aliados dignos de destaque. O Hollande antecipou-se de Sarkozy, também, no primeiro turno com a diferença de um ponto e meio percentual: 28,6% contra 27,1%.

Quem ignora as particularidades da política francesa, seguramente, estará se sentindo surpreso com o argumento de que o candidato de direita, Sarkozy, já perdeu, também, o segundo turno das eleições presidenciais francesas do próximo domingo. Considerando que Sarkozy teve 27,1%, a candidata de extrema-direita, Marine La Pen, 17,9% e, o candidato de centro-direita, François Bayrou, 9,13%, somando estes percentuais alguém poderia dizer que o presidente retirante reivindicaria este 54%?

Ao contrário, o candidato socialista Hollande, com 28,6%, poderia reivindicar com vantagens somente o percentual de 11,1% do candidato da esquerda-comunista e dos socialistas, Jean-Luc Melanson, que somando, não atinge sequer 40%! Mesmo que conseguisse os 2,3% dos verdes e o 1,1% da extrema-esquerda anticapitalista, Hollande não atinge teoricamente sequer 45%! Então?

A resposta exige uma aproximação mais profunda na essência destas eleições na França. A essência da disputa diz respeito ao fato de que a parcela majoritária do establishment francês já constatou por sua ordem e conta que a relação franco-alemã torna-se, incessantemente, mais desequilibrada a favor da Alemanha e contra a França desde que a Zona do Euro foi posta em funcionamento.

O establishment francês então, é aquele que exige a redefinição da relação franco-alemã com concessões da Alemanha a favor da França. Quando Hollande declara que exigirá a renegociação do Acordo Fiscal imposto pela primeira-ministra alemã Angela Merkel a Sarkozy e à toda a União Européia (UE) e que o acordo constitui a pedra fundamental da blindagem institucional do predomínio político e econômico alemão sobre a UE e, naturalmente, antes de mais nada da Zona do Euro, o candidato socialista à presidência da França, na realidade, posiciona o governo de Berlim diante do dilema: ou a Alemanha fará concessões à França, ou o governo de Paris detonará o euro imediatamente!

Por mais que isso possa parecer muito paradoxal aos não franceses, a extrema-direita de Marine Le Pen evolui na mesma linha com os socialistas (!) e, até claramente, em sua versão mais extrema, com muito mais dureza contra a Alemanha. E é exatamente, por isto que a palavra de ordem da campanha pre-eleitoral de Le Pen tinha a incompreensível ordem “Fora do euro a França agora, imediatamente”!

Isto significa, na prática, que todos os eleitores de extrema-direita que comparecerem às urnas no segundo turno votarão, em percentual muito superior em Hollande do que em Sarkozy. E a estes será somada, pelo menos a metade dos eleitores do candidato de extrema-direita Bayrou, cujo eleitorado já rachou.

Com base a cultura política francesa, todos – sem exceção – os eleitores de esquerda, de qualquer matiz, votarão em Holande no próximo domingo.

Isto é, em essência, Hollande não será eleito presidente da França simplesmente como candidato dos socialistas, os quais, conforme revelaram os resultados, não constituem mais do que 1/4 dos eleitores franceses. Hollande será eleito como o preferido da maioria do establishment francês e, também, como o líder de uma atípica frente de socialistas, esquerdistas, esquerdizantes e comunistas marxistas-leninistas, assim como, de extrema-direita e centro-direita que exigem redefinição das relações franco-alemãs!

O fato de o ex-presidente Jacques Chirac (de direita) ter delcarado que votará em Hollande e não em Sarkozy, significa, simbolicamente, o espectro desta frente que conseguiu aglutinar a elite francesa.

Os objetivos do establishment francês para redefinir as relações franco-alemãs provocaram sérias convulsões no Eixo Berlim-Paris e, claramente, minam a política de Angela Merkel. Isto cria fortes esperanças de melhoria nos países da periferia européia, considerando que a França está buscando compor uma frente de países da região, a fim de pressionar ainda mais a Alemanha.

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Fonte: Monitor Mercantil