É importante destacar, no entanto, que Wen estava expressando uma política e não uma previsão de desempenho. O propósito de buscar um crescimento menor, explicou premiê, é “guiar as pessoas por todos os setores a focar seu trabalho na aceleração da transformação do padrão de desenvolvimento econômico e tornar o desenvolvimento econômico mais sustentável e eficiente”.

Os investimentos em ativos fixos são o motor mais importante de crescimento da China. Como país em desenvolvimento com renda per capita anual inferior a US$ 5 mil, ainda há espaço significativo para a China aumentar seu estoque de capital. O ritmo de crescimento dos investimentos, contudo, é alto demais. A questão não é se a China precisa de mais investimentos, mas se a capacidade de absorção da China pode continuar a acomodar o elevado ritmo de crescimento dos investimentos visto nos últimos dez anos.

Se for encolher a expansão do PIB dos 9,2% em 2011 para 7,5% em 2012, sem piorar o padrão de crescimento elevando a já alta relação entre investimentos e PIB, o crescimento anual dos investimentos precisa ser igual ou menor a esses 7,5%

Nesse sentido, a relação entre investimentos e Produto Interno Bruto (PIB), que na China é próxima a 50% e está em alta, pode ser considerada como indicador da tensão que o investimento de capital fixo exerce sobre a economia. Não é completo exagero dizer que a capacidade da economia de absorver o crescimento nos investimentos chegou a seu limite.

A recente debacle dos trens de alta velocidade é um bom exemplo. Em 2003, a China construiu seu primeiro projeto de trem de alta velocidade. Foi um componente fundamental do pacote de estímulos econômicos de 4 trilhões de yuans (US$ 630 bilhões) lançado durante a crise financeira mundial de 2008 e 2009, de forma que os investimentos na construção de ferrovias de alta velocidade aumentaram a grandes passos. No fim de 2010, a rede em operação superava os 8 mil quilômetros, com mais 17 mil quilômetros em construção. Em contraste, todos os países ocidentais combinados levaram meio século para construir um total de 6,5 mil quilômetros. Diante de tal rapidez na construção, uma catástrofe era quase inevitável.

Quando o crescimento nos investimentos supera a capacidade de absorção da economia, isso leva à rápida deterioração na eficiência desses investimentos, o que por sua vez prejudica as perspectivas de crescimento de longo prazo. Atualmente, há evidências generalizadas disso na China. Para reverter essa tendência, em uma economia guiada pelos lucros, certa trégua no crescimento dos investimentos não é apenas necessária, mas inevitável.

Além da relação entre investimentos e PIB da China precisar ser reduzida a um patamar mais sustentável, um desafio igual ou mais importante é ajustar a estrutura dos investimentos. Por muitos anos, o segmento mais importante de investimento na China foi o de desenvolvimento imobiliário, que representa cerca de 10% do PIB e 25% dos investimentos totais. Os recursos, no entanto, precisam ser alocados a projetos que desenvolvam o capital humano, proporcionem bens públicos e alimentem a criatividade e inovação. Ajustar a estrutura de investimentos, contudo, inevitavelmente vai desacelerar o ritmo de crescimento dos investimentos, pelo menos no período de transição, e, portanto, desacelerar a expansão total do PIB.

O comércio internacional desempenhou papel central no desenvolvimento econômico da China nos últimos 30 anos. O mercado mundial, entretanto, não é mais capaz de absorver as gigantescas exportações chinesas, para não mencionar o impacto imediato das mazelas econômicas na Europa e Estados Unidos sobre a demanda por exportações. Além disso, o aumento nos custos da mão de obra e a valorização do yuan também vão minar o setor exportador da China, provocando a desaceleração da expansão do PIB neste ano.

Poucos negariam a necessidade de a China passar a exibir um crescimento econômico menor, porém melhor. O problema é que se a China quiser encolher a expansão do PIB dos 9,2% em 2011 para 7,5% em 2012, sem piorar o padrão de crescimento elevando ainda mais a alta relação entre investimentos e PIB, o crescimento anual dos investimentos precisa ser igual ou menor a esses 7,5%.

Um cálculo aproximado é suficiente para mostrar que, a menos que o governo esteja disposto a tolerar um aumento na relação entre investimento e PIB, atingir a meta de crescimento de 7,5% do PIB implica queda significativa no ritmo de crescimento dos investimentos. Para compensar o impacto negativo na expansão do PIB, também afetado pela limitação ao aumento das exportações decorrente da fraca demanda mundial, o consumo local precisa crescer de forma ainda mais acentuada, o que é difícil de imaginar. Em outras palavras, reduzir a alta do PIB para 7,5% sem tornar o padrão de crescimento da China ainda mais irracional é uma missão impossível.

Um cenário mais provável para 2012, portanto, é de crescimento menor do que em 2011, mas ainda significativamente acima de 7,5%. De forma correspondente, seu padrão de crescimento, puxado pelos investimentos, será ainda mais fortalecido, embora a um ritmo menor de crescimento. De outra forma, seria difícil evitar que a política provocasse uma aterrissagem brusca.

De fato, conseguir um índice de crescimento econômico mais moderado sem provocar um pouso brusco é um dos desafios mais complicados enfrentados pelo governo chinês. Uma aterrissagem brusca, simplesmente, não é uma opção a ser cogitada.

Com a posição fiscal do país ainda positiva, é difícil imaginar que a liderança chinesa seja tão teimosa na busca pela “aceleração da transformação do padrão de desenvolvimento econômico” a ponto de arriscar-se a deparar-se com tal opção. Mesmo se fosse, os governos locais, endividados e obcecados com o PIB, provavelmente lutariam para alcançar o maior crescimento possível para eles, seguindo apenas da boca para fora a convocação de Wen para desacelerar-se. É por isso que, apesar da meta oficial, a maioria dos economistas chineses ainda aposta em um índice de crescimento econômico bem acima dos 8% em 2012. (Tradução de Sabino Ahumada)

 

____________

Yu Yongding é presidente da China Society of World Economics, ex-membro do comitê de política monetária do Banco do Povo da China e ex-diretor do Instituto de Economia e Política Mundial, da Academia Chinesa de Ciências. Copyright: Project Syndicate, 2012.

Fonte: Valor