No período pré-campanha, os partidos fizeram sucessivas denúncias ao TSE, reivindicando punição aos adversários, por ações consideradas como propaganda antecipada. No Brasil, a linha que diferencia o que pode ou não ser considerado ilegal antes do período oficial de propaganda eleitoral está a cada ano mais tênue. Com isso, se tornam recorrentes notícias sobre ações, representações ou multas emitidas pelo TSE aos partidos e candidatos.

A fonte do “pode ou não pode” é a Lei 9.504/97, que dispõe sobre a propaganda e as condutas vedadas em campanhas eleitorais. As ações ajuizadas são julgadas pelos Tribunais Regionais Eleitorais e, depois do julgamento, as partes podem recorrer ao TSE e, em alguns casos, ao Supremo Tribunal Federal.

Recentemente o ministro do TSE Arnaldo Versiani disse algo que pode apontar para uma mudança na legislação brasileira. “Em linhas gerais, sou amplamente favorável a qualquer espécie de propaganda. Eu gostaria que a propaganda fosse permitida num período maior do que esses três meses que antecedem a eleição…”, declarou à imprensa.

A linha de Versiani, de que quanto mais o eleitor puder conhecer o seu candidato, melhor, também é defendida pelo procurador regional do Rio Grande do Sul, Vitor Hugo Gomes da Cunha como uma boa saída para o festival de multas e disputas judiciais em ano de eleição. “As leis não esgotam todas as possibilidades de infrações. É comum que a cada nova campanha surjam novas formas de burlar a lei por meio de mecanismos que ela não prevê e que acabam gerando divergências na hora dos julgamentos, gerando o que se chama de jurisprudência”, explica.

Como exemplo de que não é de hoje a dificuldade existente entre a prática dos candidatos e a lei, o procurador do TRE-RS cita o caso do uso de outdoors na campanha eleitoral de 2006. “Eles eram proibidos, mas a lei não definia o que era outdoor. Desse modo, os candidatos, por exemplo, faziam propaganda em muros de propriedades particulares em grandes dimensões, gerando efeito de outdoor”, explicou. Ele conta que na época houve divergência entre alguns membros do MP e alguns juízes. O conjunto das decisões tomadas no país inteiro forçou alterações na legislação: hoje, a Lei 9.504, alterada no ano passado, permite que esses muros sejam utilizados, mas que a propaganda não deve exceder a 4m².

Para o advogado e especialista em Direito Eleitoral , professor e autor do livro “Reforma Política – inércia e controvérsias”, Antônio Augusto Mayer dos Santos, muito do que há hoje no cenário eleitoral é fomentado pela imprensa. “Não nos supreenderemos se, ao eleger os governantes deste pleito, tão logo a imprensa já comece a projetar quem serão os próximos candidatos à prefeitura em 2012. Quanto mais se debate e há exposição nos meios de comunicação, melhor o filtro social, mais efetiva a seleção pelo eleitor”, defende.

Segundo o especialista, há uma disparidade na legislação brasileira em quatro principais aspectos: na pré-campanha, na hora dos registros das candidaturas, na propaganda e na prestação de contas. “Em outros países também há estes regramentos e restrições, mas não tão rígidas como no Brasil. Somos sem dúvida o país com maior número de regramentos, seja por meio da nossa Constituição Federal ou pelas resoluções do TSE”, avaliou.

Apesar de considerar o regramento do processo eleitoral severo no Brasil, Mayer afirma que a liberação da campanha, apesar de ser uma ideia simpática para o que seria a democracia ideal, não seria realmente a melhor situação para um país de imediatismos e superficialidades como o Brasil. “Há uma razão fundamental para isto: é necessário que exista uma regra delimitando o início da campanha eleitoral em vista de que inúmeros candidatos disputam reeleições, do Legislativo ao Executivo, em todos os níveis. E esta circunstância, ou seja, usufruir de prerrogativas institucionais num cenário de disputa, é algo que estabelece uma natural desigualdade entre candidatos. E a desigualdade pode descambar rapidamente para os abusos e excessos”, justificou.

A lei em outros países

De acordo com Mayer, os Estados Unidos são os únicos que se assemelham com a rigidez brasileira, porém, sem elementos científicos que possam embasar a comparação. Nos Estados Unidos – diz ele -, o processo eleitoral se inicia antes das prévias dos partidos políticos e praticamente dois anos antes do dia do pleito. Aqui no Brasil, somente três meses antes da eleição. No território americano, é permitido doar dinheiro antes das candidaturas serem oficializadas. No Brasil, quem recebe antes da abertura da conta de campanha pode ter seu mandato cassado pela Justiça Eleitoral.

França e Alemanha são países onde a propaganda é distensionada, de acordo com Mayer. “Nestes dois países é permitida, mediante sorteio, a divulgação da propaganda eleitoral em estações de metrô e cabines telefônicas. Aqui no Brasil, quem fizer isto numa parada de ônibus pode ser cassado”, explicou.
Já na Argentina, a propaganda eleitoral é disciplinada, mas não constam as infinitas possibilidades de multas como aqui no Brasil, disse o advogado. “Aqui uma simples placa acima do tamanho num comitê eleitoral pode gerar até inelegibilidade”, disse.

A opinião dos partidos

O Sul21 procurou as assessorias jurídicas dos principais partidos no Rio Grande do Sul. A única legenda que respondeu ao questionamento até a hora da edição desta matéria foi a do PMDB. Para o advogado peemedebista Milton Cava, a legislação eleitoral brasileira é restritiva e não rígida, o que desconfigura a eleição e o processo democrático. “Isso impede a renovação, dificulta o surgimento e popularizações de novos partidos e personagens. Aqui em Porto Alegre , por exemplo, tu não vê campanha na rua”, ilustrou.

Ele salienta que a aplicação de multas depende muito da interpretação dos tribunais. “O Judiciário eleitoral que legisla por meio de resoluções aplicam o que os legisladores escrevem. As normas alteram com frenquência e a interpretação dos juízes acaba variando conforme os casos, candidaturas e partidos”, afirma sobre as divergências nos julgamentos do TSE.

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Matéria originalmente publicada no site Sul 21

Fonte: revista CartaCapital