Multiplicam-se os sinais de um rápido agravamento da crise em que o capitalismo mergulhou o planeta. Os muitos milhões entregues pelos governos à grande finança sustiveram temporariamente o colapso e preservaram os lucros, mas não resolveram os problemas de fundo e criaram um novo factor de crise: o endividamento incomportável da generalidade dos estados.

O efeito dos vários «estímulos» parece ter atingido os seus limites: «Bernanke pinta um quadro sombrio» titulava o Financial Times (25.2.10) ao noticiar o depoimento sobre a economia, no Congresso dos EUA, do presidente da Reserva Federal. O desemprego não parou de crescer avassaladoramente, com os trabalhadores e povos a pagarem os custos duma crise pela qual não são responsáveis.

A Grécia está na mira: o país estaria à beira da falência e seriam precisas medidas drásticas. Os portugueses reconhecerão a conversa de José Sócrates que abriu caminho à terrível ofensiva anti-social do Governo PS, de braço dado com o grande capital e com a Comissão Europeia. Mas este novo episódio revela profundas clivagens entre os EUA e a UE, e no seio desta.

Está por explicar a decisão de Obama em não vir à prevista (e depois cancelada) Cimeira EUA-UE. Especula-se abertamente sobre uma eventual saída da Grécia do Euro ou até dum colapso da moeda europeia (Samuel Brittan, FT, 19.2.10), o que alivia a pressão sobre um acossado dólar. Zangam-se as comadres e descobre-se que o cumprimento dos famigerados critérios de adesão ao Euro foi, em muitos países (incluindo o nosso, segundo o FT, 16.2.10), uma fraude.

A Grécia «basicamente hipotecou os aeroportos e auto-estradas do país» para cumprir os critérios, e os bancos dos EUA desempenharam um papel fulcral nisso (New York Times, 14.2.10). Agora, sectores da UE (comandados pela Alemanha) decidiram optar por uma «linha dura» com a Grécia. Deitando fora um primeiro acordo, subiram a parada, exigindo medidas mais drásticas.

A UE retirou o direito de voto à Grécia na próxima reunião sobre a sua situação e ameaça aplicar poderes especiais de gestão directa, ao abrigo do novo e antidemocrático Tratado de Lisboa (Telegraph, 18.2.10). O vice-primeiro ministro grego responde dizendo que a Itália ainda fez mais falcatruas nas suas contas públicas e acusando a Alemanha de «ter levado o ouro que estava no Banco da Grécia [durante a II Guerra Mundial] e nunca o ter devolvido» (BBC, 24.2.10). São assim, os «governos amigos» da UE.

Mas numa coisa parece haver acordo, nos estados-maiores de Washington e Bruxelas: está na hora de impor cortes salariais aos trabalhadores. Mais exploração e pobreza são as receitas do costume para alimentar este monstro em fase de decadência. Receitas que já receberam como resposta a luta dos trabalhadores.

Entretanto, a máquina de guerra do imperialismo não abranda. O orçamento militar (e o défice orçamental) dos EUA é cada vez maior. As ameaças dos EUA e Israel contra o Irão fazem lembrar os meses que antecederam a agressão ao Iraque. Segundo o primeiro-ministro libanês Saad al-Hariri (até há pouco aliado dos EUA e filho do ex-primeiro ministro assassinado num atentado à bomba) «aviões israelitas estão a efectuar incursões diárias no espaço aéreo libanês, criando uma situação muito perigosa» (Reuters, 23.1.10).

Prossegue a escalada militar da NATO e de Obama (e os crimes contra a população) no Afeganistão e Paquistão. Os EUA vão instalar o seu sistema anti-mísseis também na Roménia e Bulgária. Efectuam vendas maciças de armas, de Taiwan ao Golfo Pérsico. Aumentam a ingerência na América Latina.

Os acontecimentos mostram que o imperialismo em profunda crise é um perigo para a Humanidade. Paul Craig Roberts, ex-secretário de Estado do Tesouro de Ronald Reagan e ex-director e colunista do Wall Street Journal e Business Week, mas agora «dissidente», escreve: «Já cercaram o Irão com bases militares.

O governo dos EUA pretende neutralizar a China, tomando controlo do Médio Oriente e impedindo o acesso da China ao petróleo. […] Os mentecaptos em Washington estão a promover o impensável: a guerra nuclear. A louca corrida visando a hegemonia americana está a ameaçar a vida na terra» (globalresearch, 26.2.10). Está na hora de serem os povos a tomar o seu destino nas mãos.

* Professor universitário e analista de política internacional

Este texto foi publicado em Avante nº 1.892 de 4 de Março de 2010