Sérgio Barroso*
A história do capitalismo chama a atenção que suas grandes crises “globais” confluem numa combinação regular de fenômenos regressivos de destruição das forças produtivas (capital + trabalho), concentração e centralização de massas de capitais, e radicalização das lutas de classes em escala internacional. Conceitualmente, sempre houve controvérsias acerca do significado preciso do fenômeno da depressão econômica.

Consideramos – à luz da experiência histórica concreta – algumas características tradicionais para esta categoria: a desaceleração econômica não apenas reduz a produção, como nas recessões (geralmente mais breves e localizadas), permanecendo o crescimento positivo; as depressões são de âmbito internacional e as taxas de crescimento caem abaixo de zero, para além do mergulho da produção real.

Se cotejada com a grande crise atual, as pesquisas recentes do historiador Scott R. Nelson sobre raízes e traços principais da Grande Depressão de 1873-1896 ou 1ª Grande Depressão, localizam inicialmente na Europa de 1870 – em particular no Império Austro-Húngaro (1867) e no Império Germânico (unificado em 1871) -, o surgimento de novas instituições financeiras financiadoras de crédito hipotecário para construção residencial e municipal.

A facilidade na obtenção de crédito impulsionou significativa expansão na construção imobiliária, acompanhada de uma súbita elevação dos preços dos terrenos. Urbanização e industrialização. Simultaneamente, expandia-se entre 1865 (fim da Guerra Civil Americana) e 1873, a malha ferroviária nos EUA, duplicando no período.

Em Maio de 1873, nos países da Europa Central – que perdiam celeremente competividade frente ao império emergente -, foi por terra a ilusão dum crescimento econômico ininterrupto: a bolsa de Viena colapsou a nove de Maio. Foi à falência bancos da Europa Central, os bancos britânicos cortaram o crédito, na “escuridão” de quais seriam as instituições mais afetadas pela crise hipotecária. O custo do crédito interbancário atingiu níveis insuportáveis.

A crise atingiu seriamente os EUA em Setembro de 1873. A importante casa bancária Jay Cooke & Co. (uma das mais importantes no financiamento da indústria dos caminhos de ferro) quebra e agrava-se o pânico. Os efeitos de longo prazo do pânico pela crise de 1873 foram perversos. OFor the largest manufacturing companies in the United States — those with guaranteed contracts and the ability to make rebate deals with the railroads — the Panic years were golden. que continuou por mais de quatro anos nos Estados Unidos, e durante quase seis anos na Europa.

O termo “vagabundo”, referência indireta aos ex-soldados trabalhadores, se tornou americano e banal. Nova Iorque chegou a atingir a taxa de 25% de desemprego (R. S. Nelson, The Chronicle Review, 18/10/2008). Mais divulgados nos últimos meses, os principais resultados da Grande Depressão (1929-1933), apontariam: a) uma queda acumulada do PIB (Produto Interno Bruto) de -26% entre 1929-32; b) uma deflação de preços somada de -32% (1929-32); c) The long-term effects of the Panic of 1873 were perverse. uma taxa de desemprego de 33% da força de trabalho nos EUA; d) cerca de 11.000 bancos faliram; d) a agricultura e agricultores sofreram devastação.

Quase 80 anos depois, dados do National Bureau of Economic Research (NBER), órgão especializado do governo norte-americano, confirmaram que os Estados Unidos estão em recessão desde 2007; somaram mais 2,5 milhões de desempregados no fim de 2008. E, segundo o presidente Obama (5/01/2009), “Se não agirmos rapidamente e corajosamente, poderemos ver uma queda de atividade econômica muito mais profunda, que poderia levar a taxas de desemprego de dois dígitos e fazer com que o sonho americano fique cada vez mais distante”.

“Desemprego de dois dígitos”, longa recessão: dificilmente os EUA fugirão da Depressão. Tragédia. O Brasil deve lutar e escapar disso!

*Médico, doutorando em Economia Social e do Trabalho (Unicamp), membro do Comitê Central do PCdoB