A pergunta que mais me fazem, actualmente, é a seguinte: Estamos de regresso a 2008 e a uma nova crise financeira global e recessão?A minha resposta é um franco não, mas esclareço sempre que o recente episódio de turbulência do mercado financeiro global poderá ser mais grave do que qualquer outro período de volatilidade e de comportamento de aversão ao risco desde 2009. Isto porque há agora pelo menos sete fontes de risco extremo a nível mundial, por oposição aos factores de risco isolados que alimentaram a volatilidade nos últimos anos – a crise na Zona Euro, o “taper tantrum” da Fed [quando a Reserva Federal norte-americana anunciou, no Verão de 2013, uma redução da compra de obrigações, no âmbito do programa de estímulos à economia, os mercados reagiram com um aumento dos juros da dívida], a possível saída da Grécia da Zona Euro e a aterragem económica brusca na China.

Em primeiro lugar, os receios em torno de uma aterragem brusca na China e do seu potencial impacto nos mercados accionistas e no valor do renminbi regressaram em força. Apesar de ser mais provável que a China tenha uma aterragem com sobressaltos mas não brusca, a desaceleração do crescimento e a contínua fuga de capitais continuam a preocupar os investidores.

Em segundo lugar, os mercados emergentes enfrentam sérias dificuldades de natureza internacional: o abrandamento na China, o fim do superciclo das matérias-primas e o fim da política de taxas de juro zero por parte da Fed. Muitos destes países sofrem de desequilíbrios macroeconómicos, como défices das contas correntes e orçamentais em simultâneo, além de se confrontarem com uma inflação crescente e uma desaceleração do crescimento. A maioria ainda não implementou as reformas estruturais necessárias para impulsionar o débil crescimento potencial. E a debilidade cambial faz aumentar o valor real de biliões de dólares de dívidas contraídas na última década.

Em terceiro lugar, a Fed provavelmente cometeu um erro ao abandonar, em Dezembro, a sua política de taxas de juro zero. O crescimento mais débil, a inflação mais baixa (devido a uma queda adicional dos preços do petróleo) e as apertadas condições financeiras (decorrentes de um dólar mais forte, da correcção nas bolsas e de maiores diferenciais nos “spreads” do crédito) ameaçam agora as expectativas relativas ao crescimento e à inflação nos Estados Unidos.

Em quarto lugar, muitos riscos geopolíticos que se cozinhavam em lume brando estão a começar a chegar a um ponto de ebulição. Talvez a fonte mais imediata de incerteza seja a perspectiva de uma guerra fria de longa duração – intercalada por conflitos subsidiários – entre as potências regionais do Médio Oriente, particularmente entre os sunitas da Arábia Saudita e os xiitas do Irão.

Em quinto lugar, a descida dos preços do petróleo está a desencadear quedas nas bolsas dos EUA e do resto do mundo, bem como aumentos nos “spreads” do crédito. Isso poderá indicar uma fraca procura mundial e não um aumento da oferta – já que o crescimento na China, nos mercados emergentes e nos EUA está a desacelerar.

Os baixos preços do petróleo penalizam também os produtores norte-americanos de energia, cujos títulos constituem uma parte importante das bolsas dos EUA, além de exporem as economias exportadoras de energia – tanto a nível do país como das empresas públicas e privadas do sector energético – a perdas sobre os créditos e a riscos de potenciais incumprimentos. Na medida em que as regulamentações restringem os criadores de mercado de oferecerem liquidez e absorverem a volatilidade de mercado, cada choque fundamental torna-se mais agudo em termos de correcção dos preços dos activos de risco.

Em sexto lugar, os bancos mundiais vêem-se ameaçados por retornos mais baixos, devido às novas regulamentações implementadas desde 2008, à ascensão de tecnologia financeira que ameaça perturbar os seus modelos de negócio já em dificuldades, ao crescente recurso à política de taxas de juro negativas, às crescentes perdas creditícias devido a activos de má qualidade (energia, matérias-primas, mercados emergentes, empresas europeias de concessão de crédito que estão agora numa situação frágil) e ao movimento na Europa para que os credores da banca assumam parte da dívida das entidades em apuros em vez de estas serem resgatadas com ajuda estatal agora restringida.

Por último, a União Europeia e a Zona Euro poderão estar na origem de uma crise financeira mundial este ano. Os bancos europeus estão fragilizados. A crise migratória poderá levar ao fim do Acordo de Schengen e (a par com outros problemas internos) ao fim do Governo da chanceler alemã, Angela Merkel.

Além disso, parece ser cada vez mais provável que o Reino Unido saia da União Europeia. Com o Governo grego e os seus credores uma vez mais em rota de colisão, o risco de uma saída da Grécia também pode regressar. Os partidos populistas de direita e de esquerda estão a ganhar força em toda a Europa. Por conseguinte, a Europa cada vez corre mais riscos de desintegração. Para culminar, a sua vizinhança não é um lugar seguro: há guerras não só no Médio Oriente, mas também – apesar das repetidas tentativas da UE para negociar a paz – na Ucrânia, com a Rússia a tornar-se cada vez mais agressiva nas fronteiras com a Europa, dos Bálticos aos Balcãs.

No passado, os riscos de catástrofe eram mais ocasionais, os receios em torno do crescimento acabavam por ser apenas receios, e as respostas em matéria de políticas eram sólidas e eficazes, o que permitia que os episódios de risco elevado fossem breves e que rapidamente se restabelecessem os preços dos activos aos seus níveis anteriores (isto quando não ficavam ainda mais altos do que antes). Actualmente, existem sete fontes de potenciais riscos de catástrofe global e a economia mundial está a transitar de uma expansão anémica (crescimento positivo que vai acelerando) para um abrandamento (crescimento positivo que vai desacelerando), o que acabará por levar a uma maior redução dos preços dos activos de risco (acções, matérias-primas, crédito) em todo o mundo.

Ao mesmo tempo, as políticas que travaram e reverteram o ciclo fatal entre a economia real e os activos de risco estão a perder força. O actual “mix” de políticas não é o adequado, dada a excessiva dependência da política monetária em vez da política orçamental. Com efeito, as políticas monetárias estão a tornar-se cada vez menos convencionais, o que se reflecte na tendência de vários bancos centrais optarem por taxas de juro negativas; e essas políticas não convencionais correm o risco de fazer mais mal do que bem, uma vez que penalizam a rentabilidade dos bancos e de outras instituições financeiras

Dois meses funestos para os mercados poderão dar lugar, em Março, a uma recuperação reparadora de activos como as acções mundiais, enquanto alguns bancos centrais chave (Banco Popular da China, Banco Central Europeu e Banco do Japão) vão sendo mais flexíveis e outros (Fed e Banco de Inglaterra) continuarão a esperar um pouco mais. Mas as repetidas erupções geradas por algumas das sete fontes de riscos globais extremos farão com que o que resta de 2016 – ao contrário dos sete anos anteriores – seja mau para os activos de risco e anémico para o crescimento mundial.

Nouriel Roubini é presidente da Roubini Global Economics (www.roubini.com) e é professor de Economia na Stern School of Business, da Universidade de Nova Iorque.

Publicado originalmente no site do Jornal de Negócios