Com a eleição de Jair Bolsonaro (PSL – RJ) para presidente da República o destino das empresas de jornalismo como conhecemos é incerto. Ele se elegeu prometendo acrescentar novas dificuldades a um setor que já sofre o êxodo de leitores e anunciantes.

Os problemas econômicos da mídia tradicional são mundiais. Nos Estado Unidos, com a eleição de Donald Trump, um inimigo declarado dos jornais, algumas empresas conseguiram reverter o quadro econômico denunciando para o público os desmandos do grupo político ao redor do presidente. O que irá acontecer com as grandes empresas de comunicação do Brasil, nós saberemos no primeiro ano de governo de Bolsonaro.

E nós, repórteres e jornalistas em geral, como ficamos? Vamos aos fatos. Definitivamente, essas eleições marcaram a ascensão das redes sociais como um meio de comunicação de massa. Ignorar essa realidade é suicídio profissional. Temos que nos reinventar para conseguir viver dentro dessa nova era, em que as pessoas conversam umas com as outras sem precisar da nossa intermediação.

Acrescentamos às dificuldades da categoria o fato de que as faculdades de jornalismo despejam anualmente centenas de jovens no mercado com uma formação deficiente, principalmente em assuntos das áreas da economia, polícia, política e justiça. Justamente os mais relevantes no cotidiano do nosso leitor. Resultado: a maioria não consegue exercer a profissão, seja por falta de emprego, ou capacidade de montar o seu próprio negócio para vender o seu conhecimento.

Esse é o contexto, ou o pano de fundo, como gostam de falar os velhos repórteres. Dentro dessa realidade, a eleição do Bolsonaro pode ser uma boa oportunidade para nos aperfeiçoarmos como profissionais. Em primeiro lugar temos um “inimigo declarado comum”, uma coisa inédita na história recente do país.  Aqui vamos lembrar o ensinamento do I. F. Stone (falecido em 1989), jornalista americano e ativista político da luta pela publicação da verdade – a obra dele está disponível na internet, sendo leitura obrigatória para jovens repórteres. Stone nos ensinou: “todo governo mente”. O presidente eleito não irá fugir à regra.

E explicar o governo Bolsonaro para o leitor não será uma tarefa fácil. Para começar o grupo político do novo presidente é um dos mais estranhos que já apareceu por Brasília. O novo presidente é capitão da reserva do Exército. Seu grupo é formado por militares da reserva que tiveram uma formação nacionalista e que estão travestidos de liberais para sobreviverem aos novos tempos. Mas que na hora que acharem adequado vão tirar a fantasia de liberais e voltar ao velho nacionalismo.

Entre os civis há duas personalidades interessantes e em cargos chaves. O economista Paulo Guedes, que será ministro da Fazenda, é um inimigo declarado de empresas estatais, tipo Petrobras – para entendê-lo é importante assistir ao documentário Teoria do Choque, que está disponível na internet. O deputado federal gaúcho Onyx Lorenzoni (DEM) ocupará a Casa Civil. Ele é um cabeça quente que não leva desaforos para casa. Já o vice-presidente, general da reserva Hamilton Mourão, diz o que quer, na hora que quer e para quem estiver na sua frente. Logo, um bate-boca entre os dois é uma questão de tempo.

A importância de explicarmos ao nosso leitor com exatidão o que acontece no grupo político do novo presidente é fundamental porque tudo indica que ele seguirá a cartilha do Trump. Essas cartilha tem como eixo principal tentar detonar a nossa credibilidade. Aliás, não é por outro motivo que o presidente eleito escolheu a Folha de São Paulo como inimiga pública número um do seu governo – no último dia 27, a repórter Patrícia Campos Mello publicou a reportagem denunciando que empresários estariam bancando uma campanha contra o PT pelo WhatApp, o que configuraria crime de caixa dois. Na mesma linha ele ameaçou a Rede Globo e o Grupo RBS.

Não é de hoje. Mas há um tempo que todas as grandes empresas de comunicação brasileiras vêm demitindo profissionais como uma maneira de sobreviver ao mercado. Na era Bolsonaro esse realidade deverá se aprofundar. O que significa mais escassez de emprego. Mas isso não significa que não possamos exercer a nossa profissão. Muito pelo contrário. Podemos migrar para as redes sociais e brigar com o governo no campo dele. O importante é termos na mão a matéria bem apurada, escrita de maneira simples e contundente. Onde vamos publicá-la é outra história. O importante é continuar informando, que é razão de existirmos.

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Carlos Wagner é jornalista.

Publicado no blog Histórias Mal Contadas.