São Paulo – Em debate realizado pelo Fórum 21 na manhã de hoje (12), na série “Seminários para o Avanço Social”, o sociólogo Laymert Garcia dos Santos, da Unicamp, e doutor em Ciências da Informação pela Universidade de Paris VII, afirmou que a realidade atual, com o monopólio da informação pela mídia tradicional, é “desesperadora”. Para ele, a sociedade está “enfeitiçada” pela manipulação.  “Só as versões se tornam realidade, ao ponto de as pessoas não saberem mais o que é real e o que não é.”

Segundo Laymert, exemplo esclarecedor a respeito é a operação midiática de transformar a presidenta Dilma Rousseff no objeto de ataques sistemáticos e culpada de tudo o que de ruim acontece ou pode acontecer no país. A operação, lembra, começou na Copa do Mundo de 2014. “Trinta ou quarenta mil pessoas na Avenida Paulista (manifestação da esquerda em 13 de março de 2015) debaixo de chuva não é notícia. Porque para os meios de comunicação é preciso manter no ar a ideia do golpe. É preciso manter no ar permanentemente alguma coisa.”

O sociólogo lembra que o início da deslegitimação de Dilma, na Copa, partiu do camarote do Banco Itaú no estádio, onde estava a colunista Sonia Racy. “Não foi à toa que foi escolhido esse local.” Na ocasião da abertura da Copa, no Itaquerão, em São Paulo, o blogueiro Luiz Carlos Azenha registrou em seu blog: “Uma importante colunista social do Estadão, sentada no camarote do Banco Itaú, gritou a plenos pulmões – aparentemente entusiasmada – ‘Ei, Dilma, VTNC’”.

Diante da sistemática ofensiva do oligopólio de comunicação, “não existe mais” cobertura (jornalística), no sentido de processar informações reais. “A mídia é parte ativa na criação de versões e ficções sobre o que acontece. O que é de fato real soçobra.”

Entre os veículos de comunicação que fazem parte da campanha contra o governo petista de Dilma Rousseff, Laymert considera a Folha de S. Paulo o mais sofisticado e eficiente na construção do discurso da negatividade. “A Folha é a mais elaborada, porque eles estão há mais de 30 anos elaborando o discurso do ressentimento. Sempre, em qualquer momento em que há uma positividade, o discurso é negativo. Se a notícia é boa, existe o recurso: ‘mas…’”

A operação que se desenvolveu nos últimos meses para proteger o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que poderia ser o condutor do impeachment desejado pela direita do país, para o sociólogo, é absurda. “Ele (Cunha) está apodrecendo todos os dias e não cai. Como é possível construir essas redes de proteção? Os ladrões estão gritando ‘pega ladrão’ para quem não é ladrão.”

O grande problema, para Laymert, é que “o outro lado não consiga responder”. Segundo a análise, “estamos vivendo um fenômeno complicado para o qual a esquerda não tem respostas”. Ele diz que desde os anos 1980 observa a dificuldade da esquerda em compreender a questão midiática. Um dos principais erros de líderes petistas foi acreditar que, quando o PT chegasse ao poder, haveria uma “troca de sinal” e os meios de comunicação passariam a ser mais benevolentes com os esquerdistas. Mas o que se viu foi o contrário. “Uma vez no poder, a esquerda tem uma atitude ao mesmo tempo de submissão e fascínio pelos meios de comunicação.”

Snowden e Assange

Laymert acredita que nem mesmo setores da mídia de esquerda, como os chamados “blogueiros sujos”, entendem o processo midiático atual. “Os ‘blogueiros sujos’ não entendem, embora estejam mais perto de entender, que a política hoje não é mais a política, mas a tecnopolítica. Quem entendeu isso foram homens como Julian Assange (do Wikileaks) e Edward Snowden”, disse o professor da Unicamp. Ex-funcionário da agência de inteligência americana, a NSA, Snowden tornou público que o governo dos Estados Unidos opera um sistema de vigilância que abrange cidadãos e governos em todos os lugares do mundo que lhe interessem.

“Há uma dimensão totalitária quanto à linguagem e a instrumentalização da linguagem política. Não vejo como a esquerda possa reagir diante dessa ofensiva totalitária da mídia”, diz Laymert. “Snowden e Assange entenderam que o poder está na informação. Mais do que isso, entenderam que, ao contrário do Facebook, que fornece mais do mesmo e satisfaz o narcisismo das pessoas, o que importa é a informação que não se vê, que está oculta. No mundo atual, a informação real é a que não é exposta.”