Adli Mansour, o presidente nomeado pelos militares, decretou estado de sítio por um mês e pediu ajuda das Forças Armadas para manter a ordem. Ativistas de direitos humanos disseram que a ordem dará base legal para que o Exército faça prisões. Oito líderes da Irmandade Muçulmana foram presos ontem. O governo decretou ainda toque de recolher em 14 das 27 Províncias do país.

Milhares de simpatizantes de Mursi mantinham dois acampamentos no Cairo como forma de protesto contra a sua deposição. Ele foi o primeiro presidente democraticamente eleito na história do Egito, nas eleições de junho do ano passado. Após as ordens para a desmobilização não terem sido atendidas, houve um ataque das forças de segurança. A violência não se limitou à capital do país, havendo choques também em outras cidades, como Alexandria e Suez.

O vice-presidente, Mohamed ElBaradei, um ex-diplomata da ONU e vencedor do prêmio Nobel da Paz, renunciou ao cargo, afirmando que o conflito poderia ter sido resolvido por meios pacíficos. “Os beneficiários do que aconteceu hoje são aqueles que clamam por violência e terrorismo e os grupos mais extremistas”, disse ele.

O premiê Hazem el-Beblawi defendeu a decisão de invadir os acampamentos. “A situação havia chegado a um ponto que nenhum Estado com respeito próprio podia aceitar”, disse. O Ministério do Interior afirmou que, além dos 235 manifestantes, 43 policiais morreram nos confrontos de ontem. Várias TVs simpáticas ao governo mostraram imagens do que pareciam ser militantes islâmicos disparando tiros. No entanto, não há confirmação independente dessas cenas. Houve também a morte de três jornalistas – um cinegrafista da Sky News, uma repórter do “Gulf News”, dos Emirados Árabes Unidos, e um repórter do “Al Akhbar”, do Egito.

Segundo a mídia estatal, simpatizantes de Mursi incendiaram prédios governamentais, inclusive o Ministério das Finanças, e atacaram igrejas católicas. Esses relatos também não puderam ser confirmados por fontes independentes.

Americanos e europeus condenaram a matança. Um esforço diplomático de EUA, União Europeia e países árabes para negociações entre a Irmandade Muçulmana e o governo fracassou na semana passada. O governo americano anunciou que irá reavaliar a ajuda econômica concedida ao Egito.

O Egito está mergulhado na instabilidade desde a eclosão da Primavera Árabe, que resultou na queda do ditador Hosni Mubarak, em 2011. Com a eleição de Mursi, a Irmandade Muçulmana passou a sofrer forte oposição dos não islâmicos. Para os defensores de um Estado laico, os islâmicos estavam pouco a pouco minando as instituições democráticas com o objetivo de implantar uma teocracia.

Vários países recomendaram ontem a seus cidadãos que evitem viajar ao Egito. Isso deve ter um forte impacto no turismo, um das principais setores da economia egípcia. Os distúrbios ocorrem no auge da temporada de férias de verão na Europa e devem jogar o país numa forte crise econômica.

Publicado no Valor Econômico – 15/08/2013