O gigante energético russo, Gazprom, propôs ao Presidente cipriota, Nicos Anastasiades, pagar o empréstimo de 10 bilhões de euros, assumindo o plano de reestruturação bancário, em troco dos direitos de exploração das reservas de gás natural offshore, situadas na zona económica exclusiva do país.
Para além do gás e da atividade bancária, o país é usado como plataforma financeira do Mediterrâneo Oriental, e detém uma localização estratégica de portos e um forte setor turístico.
Segundo a televisão russa “Sigma TV”, a proposta da Gazprom terá sido entregue na noite do domingo passado, em decorrência das fortes críticas de que o Presidente cipriota está sendo alvo, por ter aceito um programa de austeridade, que prevê a aplicação de uma taxa especial sobre depósitos bancários.
A taxa sobre os depósitos, após negociações de última hora, é de 3% para depósitos inferiores a 100 mil euros e de 12,5% para os montantes superiores. Segundo informações veiculadas na imprensa, a medida foi imposta pela União Europeia, para evitar que o dinheiro dos contribuintes sirva para resgatar as fortunas russas depositadas no Chipre, que totalizam 25% dos depósitos nacionais. Os milionários russos têm usado o país como paraíso fiscal.
O governo de Nicósia pediu um empréstimo de 17 bilhões de euros, valor, no entanto, rejeitado pelo FMI e por alguns países da zona euro. A decisão da taxa sobre os depósitos, que prevê arrecadar 5,8 bilhões, terá permitido baixar o valor para 10 bilhões. As restantes medidas de austeridade passarão por aumento de impostos às empresas e privatizações.
O porta-voz do governo cipriota, após reunião do Eurogrupo (reunião dos 17 ministros das Finanças da zona euro), que terminou na madrugada de sábado, declarou que o “país tinha sido encostado à parede” sobretudo pelo ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble, pela diretora-geral do FMI, Christina Lagarde, e pelo Banco Central Europeu.
Em declarações ao primeiro canal público alemão, ARD, Schäuble apontou o dedo ao governo cipriota, à Comissão Europeia e ao BCE pela medida encontrada. Por sua vez, o ministro dos Negócios Estrangeiros, o liberal Guido Westerwelle, criticou a decisão por aplicar um imposto aos aforros privados depositados na banca. Outro liberal, o ministro da Saúde, Daniel Bahr, afirmou, segundo o semanário alemão Der Spiegel, que “não se pode culpar os pequenos depositantes pela crise da dívida”.
Segundo a agência de notação Moodys, no final de 2012 os bancos russos depositaram 9,2 bilhões de euros em bancos cipriotas, fazendo ascender o total de depósitos russos em 14,6 bilhões de euros. Se a medida avançar, como anunciado, os milionários russos poderão perder cerca de 1,53 bilhões de euros.
Numa decisão inédita na zona euro, os bancos cipriotas vão estar fechados toda a semana, até tomada de decisão definitiva por parte do Parlamento.
Reações à medida
O Presidente da Federação Russa, Vladimir Putin, classificou a medida como “injusta, incompetente e perigosa, que penaliza os depositantes”, e o primeiro-ministro, Dmitry Medvedev, classificou que “isto parece ser um simples confisco do dinheiro das pessoas”.
Entretanto, Moscou já manifestou disponibilidade para ajudar novamente o país, estudando a hipótese de conceder um novo empréstimo de 5 bilhões de euros, em adição aos 2500 bilhões já emprestados no passado recente.
O povo cipriota está em choque com as medidas previstas, tendo sido marcada uma manifestação, para esta tarde, em frente ao Parlamento, para contestar as medidas propostas.
Os principais mercados financeiros ressentiram-se fortemente nesta segunda-feira, as bolsas europeias negociaram em terreno negativo, as taxas de juro das dívidas soberanas dos países periféricos subiram e o euro desvalorizou face ao dólar.
Presidente do Chipre recusa ajuda russa
Fonte próxima do Presidente cipriota, declarou à imprensa do país, que Anastasiades quer uma solução europeia, tendo rejeitado a proposta russa. Em reação à intenção cipriota, o Presidente da Associação de Bancos Regionais da Rússia e membro do Banco Central Russo, Anatoly Aksakov, aconselhou os depositantes russos a retirarem o seu dinheiro do país.
O ministro das Finanças russo, manifestou a disponibilidade para alterar as condições do empréstimo, em matéria de juros e maturidades, de 2500 milhões, que concedeu há dois anos. Segundo a agência Reuters, os russos aceitam estender por mais cinco anos o vencimento e descer os juros, que atualmente estão nos 4,5%.
Parlamento do Chipre adia decisão
Os deputados, que se reuniram esta segunda-feira para votar as medidas aprovadas no Eurogrupo, decidiram adiar a votação para amanhã, terça-feira, procurando dar tempo ao Governo para introduzir alterações nas medidas, para salvaguardar os depositantes mais pequenos.
É de realçar, que o recém-eleito Presidente conservador, não tem maioria no Parlamento, precisando do apoio dos eleitos centristas, que o apoiaram na segunda volta das presidenciais, para implementar o pacote de austeridade.
Publicado em Esquerda.net