Em outubro próximo, as cidades brasileiras vão às urnas. Apesar das iniquidades – reflexos do processo capitalista que forjou o Brasil “urbano” –, cidadãos e cidadãs irão votar com a esperança de que as cidades brasileiras podem vencer seus problemas e dilemas. Esta esperança relaciona-se com as conquistas sociais e econômicas advindas desde 2003. E, também, deriva da gestão democrática e eficiente de um conjunto de prefeitos. Todavia, o imenso passivo social e a queda da qualidade de vida, acumulados em décadas e décadas, requerem avanços e realizações ousadas.
As eleições acontecem sob o impacto da grande crise capitalista que sacode o mundo, atinge o Brasil e espraia seus efeitos sobre as cidades, com a redução da oferta de trabalho e com arrocho no orçamento. Tais efeitos são atenuados pelas medidas anticrise adotadas pela presidenta Dilma Rousseff. Reverberam, também, no debate eleitoral os ecos da Rio+20 que reforçam a necessidade de se equacionar o desenvolvimento das cidades com a proteção do meio ambiente e de elevar a qualidade de vida das pessoas. Noutro plano, a grande mídia manipula o julgamento do denominado mensalão com o nítido oportunismo de tentar inseri-lo no debate eleitoral sob o prisma da execração pública do Partido dos Trabalhadores (PT) e, de, resto, do conjunto da esquerda, além de buscar, de modo fraudulento, macular a reputação do ex–presidente Lula.
De 1930 até meados dos anos 1970, o Brasil foi um dos países cuja economia mais cresceu no mundo. A par de seu Produto Interno Bruto (PIB) estar entre os maiores, estabeleceu-se uma das mais acentuadas desigualdades de renda e propriedade da terra. Nesse período, entre as décadas de 1940 e 1980, a população brasileira se tornou majoritariamente urbana num movimento frenético.
Milton Santos, nosso mais destacado geógrafo, disse certa feita que o .território revela o drama da nação. E os territórios, que são as cidades, retratam um modelo de desenvolvimento que nos legou, simultaneamente, crescimento econômico e concentração de renda e, ainda, desigualdades regionais.
As duas maiores cidades do país, São Paulo e Rio de Janeiro, simbolizam os impasses das metrópoles do Brasil. Um em cada cinco habitantes da capital paulista vive em favelas, e a bela capital fluminense somente agora dá seus primeiros passos para a redução da mancha de sangue da violência. O fenômeno da favelização presente no processo de urbanização mundial se manifestou fortemente no Brasil – imensas periferias superpovoadas e entregues à própria sorte, com a ausência ou a presença fraca do Estado.
Quanto à desigualdade regional, uma pesquisa feita em 2005 pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) mostra bem as disparidades. Com o cruzamento de dados referentes a emprego, educação e saúde, os técnicos criaram um índice para aferir o desenvolvimento socioeconômico. Resultado: dos 100 municípios com maior desenvolvimento, 87 estão no estado de São Paulo. E, segundo mostra a análise por regiões, dos 500 primeiros colocados no ranking, 480 estão nas regiões Sul e Sudeste; e, entre os 500 últimos do ranking, 421 no Nordeste.
Todavia, é antiga a luta do povo das cidades em busca de soluções. A luta pela reforma urbana remonta à década de 1960. Já no final dos anos 1970, mesmo com a ditadura, o povo ocupa terrenos para garantir o direito à moradia. A Constituição de 1988 assegurou avanços. O capítulo dedicado à política urbana estabelece a função social da propriedade urbana. Os movimentos sociais, na atualidade, se fortalecem tanto em elaboração de ideias e caminhos quanto em luta para obter conquistas. Em várias regiões, administrações avançaram no desafio de governar as cidades. E o governo da presidenta Dilma investe tanto em infraestrutura quanto em políticas sociais.
Embora “municipais”, as eleições em curso terão forte impacto na sucessão presidencial de 2014. As disputas de São Paulo, Belo Horizonte, Manaus e Salvador, para citar apenas quatro exemplos, simbolizam o confronto entre a base política de sustentação da presidenta Dilma Rousseff versus a oposição neoliberal conservadora. Há, também, o legítimo movimento de busca de ampliação de espaços entre os aliados da presidenta – o que os leva a concorrerem entre si em muitos municípios. Eclodem, também, conflitos no âmbito dessa base dos quais só o tempo revelará a real dimensão.
A vitória das candidaturas do campo democrático e popular – em especial da esquerda – é determinante para que o país siga no caminho do desenvolvimento e tenha cidades prósperas, sustentáveis e mais humanas.