Martinha e Fernando já namoravam há uns quatro anos e algumas brigas. Martinha era aquele tipo de mulher ligada ao lar, à família, aos valores morais e religiosos. Quando começou o namoro com o Fernando deixou bem claro que o propósito dela era o casamento. Fernando, despojado, meio trapaceiro, mulherengo e boêmio de berço, não gostou muito daquela preliminar, mas, como Martinha era do tipo apetitosa, gostosinha e toda meiga, ele se deixou levar e levou a menina no papo.

      Passados todos estes anos, a Martinha, que não dava trégua desde o início do relacionamento, sempre lembrando do casamento, começou a intensificar sua artilharia. Cobrada por seus pais, a menina não dava folga ao Fernando. Ele, por seu lado, sempre se mostrou fiel e caseiro. Esperto, nunca se deixou pegar em suas armações, armações estas que nunca deixaram de existir.

      Fernando, que aos trinta e sete anos ainda morava com o pai, se viu só depois da repentina morte do velho. O que para ele era uma tristeza, para a Martinha foi uma esperança que fez surgir em seus lábios um sutil sorriso no dia do enterro do pobre coitado.

      Já no caminho para a casa dos sogros, Fernando teve que ouvir a mais longa e orquestrada ladainha de sua vida. Juntaram-se Martinha, o sogro, a sogra e duas primas da menina aconselhando o rapaz a se casar de uma vez. Você já não é tão jovem meu filho, dizia o pai da moça. Daqui a pouco já terás idade para ser avô e não pai, acompanhava a sogra o ritmo da ladainha. E assim foram os quarenta e cinco minutos que separavam o cemitério da casa dos pais da moça. 

      Como se passaram alguns dias depois da fatalidade paterna e o Fernando não deu nenhum sinal de vida sobre o casamento, a Martinha saiu das palavras e foi direto à prática. Mais que religiosa, a moça era obcecada pelo casamento e estava determinada a isto, via padre ou não. Já que o Fernando não se decidia, decidiu-se ela. Resolveu que iria se mudando aos poucos para a casa do rapaz e, depois de tudo estabelecido, resolveriam a questão da igreja.

      Por este caminho andou a Martinha. Dormia na casa do Fernando e aí foi ficando, levou algumas roupas e foi ficando, dormia um ou dois dias e ia ficando. Numa das vezes dormiu durante todo um feriado e foi ficando, levou alguns livros, todas as roupas, e foi ficando. Fez um chá de cozinha e foi ficando. Comprou uma cama de casal e foi ficando. O Fernando, que observava tudo aquilo como se não fosse com ele, um belo dia resolveu dar um basta. Já que a moça estava ficando em sua casa, ele foi morar com a Paula, uma antiga amante, e por lá deixou a Martinha ficando.