A dona do bar vai doar um rim para o marido. Ela me estende os cigarros que compro todo dia. É amor isso? pergunta espantada. Eu vi em reportagem na tevê francesa homens do terceiro mundo nas fronteiras da Europa: venderam seus rins e nunca mais foram saudáveis. Alguns receberam menos do que o combinado. A dona do bar doa porque senão ele morre e isso ela não pode suportar. Por que as mulheres dos homens do primeiro mundo doariam um de seus rins aos seus maridos se podem comprar um? A dona do bar não tem dinheiro ou não pensou nisso. Fala comigo e seus olhos castanhos se arregalam.

Quase uma arte
Paula Glenadel
Cosac Naify (SP) e Viveiros de Castro Editora (RJ) – edição 2005