Na primeira parte, Eugênio de Carvalho aborda “A visão de mundo de José Martí” em três tópicos. Ele inicia com “As bases da cosmovisão martiniana”, resgatando o pensamento do “apóstolo” sobre a “unidade, analogia e harmonia do universo” desde a sua juventude. Ao mesmo tempo, o autor analisa os pontos de vista de Martí, esclarecendo conceitos e opinando de forma a clarificar as ideias resgatadas. Segundo Eugênio de Carvalho, a síntese de um dos aspectos centrais da cosmologia martiniana foi a sua interpretação unitária do mundo e da vida. “O pensador cubano estabeleceu uma gradação vertical do cosmo, na qual organizava, hierarquicamente e em diversos níveis, todos os elementos componentes dessa essência única universal, incluindo tanto os entes materiais como os espirituais”, escreve ele.

O autor revela que Martí planejou um livro sobre o conceito da vida, mas, mesmo a obra não sendo publicada ele deixou registrado vários textos sintetizando o conteúdo e o propósito geral do seu projeto, que representava sua preocupação com a questão da vida ilusória que as convenções humanas impunham à natureza do homem. Em um artigo escrito originalmente em inglês para o jornal de Nova Iorque “The Sun”, em 1881, diz Eugênio de Carvalho, Martí, resenhando uma obra do literato vinculado à escola realista, Gustavo Flaubert (1821-1880), afirmava que, para o escritor francês, “Nossa existência é artificial (…). Flaubert tenta pôr diante dessa vida imposta e convencional a vida simples e corrente da natureza”. Segundo o autor, vários outros textos evidenciam que Martí compartilhava essa ideia.
Ele termina o tópico inicial da primeira parte resumindo a visão martiniana, realçando que um dos elementos constitutivos e essencial do pensador cubano sobre a história foi sua visão peculiar da relação entre o indivíduo — especialmente determinados indivíduos — e o processo histórico. “Sendo esse indivíduo uma prolongação da vida coletiva e vice-versa, e alguns deles a verdadeira encarnação do seu povo, era possível ter um acesso privilegiado da história de uma época a partir do estudo das obras e ações desses grandes homens que sintetizavam seu tempo”, conclui.

Liberdade e vida

No segundo tópico da primeira parte, Eugênio de Carvalho inicia analisando “A liberdade como essência da vida”. Para ele, o conceito de liberdade na obra de Martí está fundamentado na premissa de que a liberdade reside na natureza e, por conseguinte, a natureza inspirava liberdade. Para Martí, recorda o autor, era um crime acelerar ou interromper o livre curso da natureza. Por isso que o grande símbolo utilizado por Martí para representar a liberdade — especialmente na América — provinha da natureza, na figura do “quetzal” (ave com plumagem de bonitas cores, originária das zonas tropicais da América Central), que, quando presa, morre.

Eugênio de Carvalho comenta que outra importante relação evidenciada no texto martiano se estabelece entre liberdade e vida. Para Martí, afirma, a liberdade era a essência da vida; sem ela, nada sobreviveria. Assim, ele tendia a associar com bastante frequência o termo “liberdade” a expressões como ar, atmosfera e luz. Ou seja: tendia a associá-la a tudo que fosse vital, natural e essencial para a vida humana. “Os homens hão de viver em gozo pacífico, natural e inevitável da liberdade, como vivem em gozo do ar e da luz”, escreveu o pensador cubano, segundo o autor. “A liberdade era algo, por conseguinte, quase imperceptível de tão natural, como o ar que se respira”, comenta Eugênio de Carvalho.

A conquista da liberdade no plano individual tinha, para Martí, a finalidade de garantir uma necessária independência pessoal, especialmente o exercício do conhecimento, do contato com os ensinamentos da natureza, com os avanços das diversas ciências, escreve o autor. Para ele, tal independência pessoal passava também não somente pela simples instrução, mas também por uma educação segundo determinados princípios e valores éticos e morais. Martí, escreve Eugênio de Carvalho, considerava que a ignorância possibilitava a opressão e a escravidão. Por conseguinte, a ignorância era inimiga da liberdade, asseverou. “Esse conhecimento de que falava Martí, além de outras vantagens, fortalecia o decoro e a dignidade própria do homem”, emendou.

Consciência e deveres

O terceiro tópico da primeira parte analisa “A ética humanista martiniana”. Segundo Eugênio de Carvalho, as evidências demonstram que o sentido mais profundo que Martí atribuiu à vida e à conduta humana era a necessidade de cumprimento de um dever. Para ele, diz o autor, ser homem era, acima de tudo, cumprir com seu dever como homem. Um homem só se revelava um homem de verdade na medida em que se empenhava, e empregava todo o tempo possível de sua vida, no cumprimento dos seus deveres; deveres que abarcavam, inclusive, a ação de despertar em outros homens a consciência dos seus próprios deveres.

Eugênio de Carvalho comenta que tal associação entre homem e instrumento do dever esteve presente em vários textos martianos, de distintas épocas. Contudo, na vida prática havia um conflito entre o que Martí definia como “dever puro” — que emana da natureza criadora — e a natureza humana. Tal assertiva, observa, poderia sugerir a aceitação de outra classe de deveres “não puros” que a natureza humana, imperfeita e contraditória, poderia impor a si mesma. Por outro lado, segundo Eugênio de Carvalho, esse conflito viria do simples fato de que nem todo homem era homem verdadeiro, conforme a acepção martiniana, e nem toda vida era encarada como dever.

O sofrimento humano

A segunda parte do livro se propõe a analisar “A visão da América de José Marti”. No primeiro tópico, Eugênio de Carvalho aborda “A ideia martiniana de pátria”, para ele um conceito que perpassou sua vida, desde que escrevera, aos dezessete anos, a peça “Abdala”. Segundo o autor, ao abordar a ideia de pátria em José Martí é imprescindível ter em conta — e refletir previamente — o impacto das experiências vividas no exílio na formação do seu pensamento de caráter patriótico. Ao passar a maior parte de sua vida fora da terra natal, a questão é saber em que medida tal distanciamento contribuiu para a sua reflexão em torno do conceito de pátria.

Eugênio de Carvalho recorda que a história tem dado inúmeros exemplos de como indivíduos no exílio, especialmente os intelectuais, tendem a uma reflexão profunda sobre suas próprias raízes — a privação de um solo, de uma pátria, tende a impor sua reivindicação. No caso de Martí, ele expressou de forma explícita o lamento e o sofrimento de se ver obrigado a viver apartado da sua terra. Mas, diz o autor, o exílio também assumiu um valor positivo; o sofrimento humano — valor fundamental da sua ética humanista — produziu um benéfico efeito para a consciência sobre o sentido da vida, especialmente quando este era considerado para além da perspectiva individual.

Trágica herança colonial

O segundo tópico aborda “O diagnóstico martiano da América”. Eugênio de Carvalho ressalta que Martí tinha constante preocupação com a pré-história americana, mais precisamente com a origem do homem na América. O autor assevera que ele foi um profundo leitor e crítico das diversas teorias que procuravam uma explicação para essa questão e divulgou-as por meio da sua intensa atividade jornalística. Interessou-se por todo tipo de trabalho científico de inúmeros autores, principalmente no campo da incipiente arqueologia — em especial Daniel Garrison Brinton e suas teorias sobre a cronologia pré-histórica da América, que buscava demonstrar a mais remota antiguidade do homem americano.

Segundo Eugênio de Carvalho, ao analisar o diagnóstico martiano da realidade americana se encontra um conjunto de expressões e adjetivações que tendem a identificar a América Espanhola com um corpo patológico, vítima de agudos e nocivos males provocados por uma larga e trágica herança colonial. Ademais, esse era um elemento que, de certa forma, identificava as diversas regiões e países da América Espanhola que tinham em comum o fato de sofrer das mesmas enfermidades, historicamente contraídas, detalha. Eugênio de Carvalho afirma que os anos de 1889 a 1891 foram decisivos para a tomada de consciência de Martí sobre o real perigo que representava a política externa dos Estados Unidos para as demais nações do continente. Foram os anos em que ocorreram, em Washington, as duas Conferências Internacionais Americanas, que Martí acompanhou ativamente.

Caminho próprio

No terceiro tópico da segunda parte do livro, Eugênio de Carvalho analisa “O exercício ordenador da nossa América”. Eugênio de Carvalho cita que em algumas anotações para um discurso sobre o centenário de Bolívar, que não se sabe se chegou a pronunciar, Martí exortava a celebração do que significava o “centenário de nascimento de uma família, de um continente livre”. Segundo ele, Martí tinha consciência de que aqueles povos que não se preocupavam com o conhecimento do seu passado, com a profundidade das suas raízes históricas e culturais, que não se preocupam em assumir e defender sua própria identidade, estariam condenados, de uma forma ou de outra, a desaparecer.

Eugênio de Carvalho conclui lembrando que para Martí a América deveria buscar seu próprio caminho, contando com suas próprias forças. O pensador cubano admitia que, com certo critério, todas as raízes e enxertos eram bem-vindos, mas jamais se poderia esquecer o tronco comum americano e as especificidades de seus frutos e flores no grande jardim universal. Nesse sentido, assevera o autor, Martí não reduzia sua proposta de identidade a uma perspectiva estreita, provinciana, imutável, fechada, desconectada da realidade universal.

Publicação contribui para integração cultural

Para Adalberto Monteiro, presidente da Fundação Maurício Grabois, a publicação da obra se insere no esforço de se promover a integração cultural entre os povos da América Latina. “A Fundação Maurício Grabois entende que a parceria para viabilizar essa publicação, um trabalho de pesquisa densa e estudo de fôlego, cumpriu o papel de divulgar para o público hispano-americano uma obra reconhecida na academia brasileira sobre um personagem marcante para a América Latina, inclusive para o Brasil”, afirma.

Segundo Adalberto Monteiro, intercâmbio como esse pode ser estabelecido com a publicação de trabalhos sobre diferentes autores e personagens destacados dos povos latino-americanos. Nesse caso, a obra resgatou o pensamento de uma personalidade indispensável para a afirmação da identidade dos povos da América Latina e do Caribe. “A Fundação Maurício Grabois se sente cumprindo um dever no processo de integração dos países e povos da região ao contribuir de forma modesta com a publicação deste livro, fazendo parceria com uma universidade que é referência na América Latina”, afirma.

Conduta anti-imperialista

Para ele, outro aspecto que merece destaque é a atualidade do pensamento de José Martí. Adalberto Monteiro cita que, no mundo em crise, o ciclo de lutas pela integração solidária e o desenvolvimento soberano e democrático aberto na América Latina com a eleição de Hugo Chávez para presidente da Venezuela em 1998, seguida da vitórias de Lula no Brasil e Kirchner, na Argentina, tem forte correspondência com o projeto de emancipação latino-americano presente no pensamento de Martí.

Segundo ele, esse é um ponto importante para se entender a relevância da obra de Eugênio de Carvalho. “Ao analisar e difundir com erudição as ideias José Martí, o livro do professor Eugênio coloca este jornalista, escritor, pensador e revolucionário cubano  como um dos fundadores  da corrente  anticolonial e anti-imperialista na região”, destaca. Adalberto Monteiro lembra que o pensador cubano anteviu o papel nocivo dos Estados Unidos sobre os demais países do continente. “Tanto que separava a ‘Nossa América’ da outra, estadunidense, a América expansionista, anexionista e imperialista”, enfatiza. Martí, diz o presidente da Fundação Maurício Grabois, alimenta até hoje uma consciência e uma conduta política anti-imperialista nesta parte secularmente espoliada das Américas.
__________

O Portal Grabois entrevistou o professor Eugênio de Carvalho sobre a obra. Leia a íntegra:

Fale um pouco da importância do livro para o Brasil, onde, lamentavelmente, Martí é muito pouco conhecido, e sobre a contribuição da parceria entre a Fundação Maurício Grabois e a Universidad Nacional Autónoma de México para a produção dessa obra.

Na verdade, a primeira edição em português desse livro foi publicada em 2003, pela Editora da Universidade Federal de Goiás. Lamentavelmente, as dificuldades e limitações de divulgação, distribuição e comercialização representaram sérios obstáculos a uma maior visibilidade dessa obra junto ao público brasileiro, mesmo na esfera acadêmica (a obra que agora se publica no México, é uma tradução ao espanhol desse original em português, numa versão ligeiramente ampliada).

Quanto à importância desse livro para o Brasil (falando de sua edição portuguesa) remeto-a basicamente à possibilidade de oferecer ao público leitor brasileiro uma síntese das principais ideias de um dos mais destacados intelectuais da América do século XIX, expressas principalmente por meio dos seus artigos de imprensa, discursos e cartas, além de seus escritos literários, ideias pelas quais perpassam o seu profundo sentimento americanista, patriótico, anticolonialista, anti-imperialista e, sobretudo, humanista. José Martí é hoje, sem dúvida, um clássico da literatura e do pensamento hispano-americano e universal.

Assim, após praticamente dez anos de sua primeira edição em português, é com muita alegria e honra que vejo a possibilidade de oferecer ao público mexicano e hispano-americano a versão em espanhol desse livro. Essa edição mexicana leva a chancela de uma das maiores universidades da América Latina, a UNAM (Universidade Nacional Autônoma do México), que abriga um dos mais respeitados centros de estudo, ensino e pesquisa sobre temas e problemas latino-americanos de todo o mundo, o CIALC (Centro de Investigaciones sobre América Latina y el Caribe).

Mas a publicação dessa obra só foi possível mediante o apoio decisivo e incondicional, do lado brasileiro, por parte da direção da Fundação Maurício Grabois. Dessa forma, a parceria editorial entre a UNAM/CIALC e a Fundação Maurício Grabois se reveste de uma dupla relevância e significado: em primeiro lugar, possibilita ao público mexicano e hispano-americano o acesso a esse estudo sobre as principais ideias de cunho americanista de um dos clássicos do pensamento latino-americano, ainda de grande atualidade; em segundo lugar, permite uma rica e frutífera experiência de intercâmbio internacional entre essas duas instituições na área editorial, abrindo caminho para, quem sabe, outras parcerias futuras.

Fale um pouco da importância da divulgação do pensamento martiniano para a América e para o mundo.

Comemoramos neste ano os 160 anos do nascimento de José Martí. Embora ele tenha vivido e escrito sua obra há mais de um século, é surpreendente como suas ideias portam ainda uma mensagem de grande significado e atualidade para os povos e nações latino-americanas e de todo o mundo, que passa pelo conteúdo ético e humanista (ou humanitário) de sua visão filosófica do mundo e do ser humano, com sua ênfase nos valores universais da liberdade, consciência, conhecimento, autenticidade, dever coletivo, virtudes morais etc.

E pela originalidade com que procurou adequar os valores pátrios à condição humana em geral (para ele, pátria era sinônimo de humanidade); pela argúcia com que estabeleceu o diagnóstico da realidade do continente americano, dividido entre a Nuestra América e os Estados Unidos (a outra América), diferentes por suas distintas origens, formação histórica, caráter e valores morais; pelo hino em favor do sentimento de comunidade, de unidade e de integração de toda Nuestra América, que superasse qualquer sentimento de inferioridade e pudesse sobrepor os elementos de união aos de fragmentação e discórdia.

E também pela sua peculiar visão da história americana, com a glorificação da época pré-colombiana, crítica ao episódio da conquista e colonização europeia, paralelamente ao destaque do passado recente do período de pós-independência, em que a Nuestra América “renascia para a liberdade” e buscava ocupar uma posição de protagonismo no curso da história universal; pela sua crítica contundente a toda forma de colonialismo, pós-colonialismo ou imperialismo, como o contido na ideologia do pan-amerianismo tão difundida em sua época pelo governo estadunidense (respaldada por vários anos vividos “nas entranhas do monstro”), uma forma de “americanismo cesário e conquistador” que precisava dar lugar a um “americanismo hospitaleiro”.

Enfim, pela sua perspectiva identitária regional e supranacional contrária a qualquer sentimento aldeano e localista, por meio da defesa de um americanismo aberto ao mundo, interessado pelo mundo, sem perder a sua especificidade, a sua autenticidade, as suas origens e a sua história. Em muitos aspectos, suas ideias poderiam ser consideradas precursoras de algumas correntes de pensamento posteriores, como o modernismo e a teoria pós-colonial.

À parte de todo esse conteúdo, que permeia a obra martiana nas suas diversas formas de expressão, há que se destacar, por fim, o significado e o valor estético de sua obra artístico-literária, mas, sobretudo, o significado e o valor de seu exemplo de vida, de uma convivência harmoniosa das atividades intelectuais como escritor com as ações práticas enquanto líder político e revolucionário que escreveu e lutou em favor da independência e dignidade de sua pátria oprimida pelo colonialismo espanhol, morrendo na luta, tendo às mãos, juntas, a pena e a pistola.

Comente sobre a influência do pensamento martiniano nos movimentos independentistas na América, uma região estratégica para a contenção do expansionismo do imperialismo estadunidense.

Cronologicamente, a vida e a obra de Martí são posteriores aos movimentos de independência políticas das ex-colônias ibéricas do continente americano, travados nas primeiras décadas do século XIX (embora sejam, entretanto, contemporâneas e intimamente ligadas ao momento em que o colonialismo espanhol ainda se mantinha nas ilhas de Cuba e Porto Rico). Apesar disso, podemos dizer que o pensamento martiano teve, e continua tendo, uma influência importante no sentido de se provocar a reflexão em torno do significado atual das independências no âmbito da América Latina e do Caribe.

Vejamos. Se, por um lado, uma das marcas de José Martí foi a sua prédica e suas ações em favor da independência cubana, por outro lado, o sentido e alcance de sua ideia de independência extrapola o caso concreto de Cuba, ultrapassando a mera luta contra o colonialismo espanhol, na direção de uma “independência hispano-americana” frente a um novo tipo de colonialismo que ameaçava o continente no final do século XIX. Numa carta a um amigo em 1889 ele afirmou que “mudar de dono não é ser livre”.

Assim, no plano político, o sentido mais profundo da ideia independentista martiana era o seu conteúdo eminentemente anti-colonialista, anti-anexionista e anti-imperialista. No fundo, abraçava um projeto de “libertação nacional” num sentido amplo. Para ele, era chegado o momento de se declarar a segunda independência da região, uma independência frente às novas formas de colonialismo, mas, também, uma independência que ia além do político, uma independência de “espírito” (do espírito colonial) em relação a determinado modelo cultural, aos vícios e resquícios do colonialismo que ainda persistiam no âmbito das ideias e da cultura internas a cada uma das nações “independentes” da Nuestra América.

Essa foi a essência de seu discurso independentista, que em sua época procurou de todas as formas denunciar a ideologia expansionista pan-americanista e as novas formas de colonialismo, as novas políticas estadunidenses de cunho imperial que ameaçavam as repúblicas ibero-americanas.
_________

RESUMO AMPLIADO DO LIVRO AMÉRICA PARA A HUMANIDADE, O AMERICANISMO UNIVERSALISTA DE JOSÉ MARTÍ, DE EUGÊNIO REZENDE DE CARVALHO

PRIMEIRA PARTE: A VISÃO DE MUNDO DE JOSÉ MARTÍ

O americanismo de José Martí esteve condicionado por uma peculiar visão de mundo e do ser humano, fato evidenciado a partir da análise de alguns conceitos-chave mais recorrentes ao longo de sua obra. Pelo menos três princípios básicos constituíram a base sobre a qual se apoiou sua cosmovisão: a unidade, a analogia e harmonia universais. Em primeiro lugar, Martí encarou o universo como a grande síntese unitária, origem e fim de todas as coisas, estabelecendo uma hierarquia entre a dimensão dessa essência eterna, una e invariável – identificada com a idéia de um Ser ou Espírito Absoluto e Universal -, e a dimensão do múltiplo e diverso, fragmentário e acidental, peculiar e finito, onde encontravam-se os seres humanos. Como decorrência do princípio da analogia entre todos os seres, esferas e fenômenos do universo, ele adotou o pressuposto de que o universo seria regido por determinadas leis – físicas e morais – de caráter e validade universal. E mais, definiu a harmonia como o princípio regulador das relações entre as diversas ordens e instâncias do universo.

Coerente com tais princípios e mesmo como decorrência deles, evidenciou-se na obra de Martí uma singular concepção do homem e da natureza. Apresentando-se como sinônimo de universo e encarada desde uma perspectiva romântica, a natureza foi idealizada paradigmaticamente em sua perfectibilidade a partir de argumentos metafísicos, sendo transformada numa referência moral de justiça e harmonia para os seres humanos. Já o homem – individual ou coletivamente considerado -, como parte da natureza, se apresentava como um ser dual: levava consigo algo da essência criadora, perfeita e infinita – a alma humana – e, ao mesmo tempo, uma série de imperfeições e limitações que o situavam hierarquicamente num nível inferior ao da natureza, por pertencer ao plano da acidentalidade e da relatividade. O sentido primordial da vida era a elevação, a ascensão do ser humano ao nível da natureza, movimento este que seria presidido por critérios éticos e morais.

Tais princípios cosmológicos configuraram ainda uma peculiar visão martiana do processo histórico. Ao apresentar a história como a luta entre o racional e o irracional, definiu como racional tudo aquilo que contribuísse, ou que estivesse em consonância com o movimento ascensional em direção à harmonia e à perfectibilidade da natureza. Ao tratar da conflituosa relação entre homem e natureza, partiu do princípio de uma tendência evolutiva geral, associada à idéia de progresso, no sentido da solução desses conflitos e da prevalência final da razão. Obedecendo a tal critério, a história humana se resumia, em termos martianos, à trajetória do homem-fera ao homem-homem ou homem-asa.

Outros princípios complementares – e nem por isso menos importantes – compuseram a cosmovisão martiana e estiveram intimamente vinculados ao seu americanismo. Martí situou a liberdade no plano das essências universais e a associou com tudo o que fosse vital, natural e essencial para a vida humana. Considerou que qualquer fator inibidor ou limitador da liberdade era anti-natural, obra do irracional, um obstáculo à ascensão do ser humano em direção ao ser absoluto. A liberdade era o instrumento que alargava a visão do mundo e conferia maior sentido à obra universal, e constituía-se num dos critérios fundamentais para a definição de seu campo de identidade americano. O único fator limitador possível, e mesmo necessário, à liberdade era a consciência, sobretudo a consciência do dever, que tinha a função de garantir o seguro e criterioso exercício da vontade, direcionando-a a fim de assegurar a efetiva liberdade entre os seres humanos. A consciência, como autoconhecimento, como “cidadania do universo”, permitia ao homem uma posição de protagonismo na sua relação com a natureza, ao orientar as ações humanas segundo determinados deveres morais.

Já o conhecimento era o pré-requisito para a consciência: o homem conhecia a si mesmo pelo conhecimento da natureza da qual fazia parte. O conhecimento era o caminho para o ser humano, diante da imperfeição da vida, vislumbrar as harmonias das leis que regiam a natureza e extrair delas as soluções aos seus problemas. Ou seja, era necessário estudar as forças da natureza e aprender a manejá-las e aplicá-las em benefício da humanidade. Martí tendeu ainda a execrar no âmbito da existência humana, tudo o que fosse artificial e, em contrapartida, enfatizar tudo o que fosse natural. Para ele, as convenções sociais criadas deformavam a existência verdadeira e natural dos homens, que precisava ser revelada com o fomento da autenticidade. Era preciso, pois, conhecer a América para além das aparências e dos disfarces que lhe impunham algumas leituras ou interpretações artificiais e equivocadas, a fim de revelar sua própria natureza, sua própria essência. A preservação de tal originalidade era vista, assim, como um caminho à universalidade.

Enfim, pela coerência que manteve com sua peculiar visão de mundo e do ser humano, que ora acabamos de sintetizar em seus aspectos principais, é que o americanismo de José Martí assumiu um viés nitidamente universalista. O grande espírito universal tinha uma face particular em cada continente, de maneira que as sociedades humanas, como parte da diversidade e acidentalidade do universo, comportavam determinados elementos da essência universal, mas, ao mesmo tempo, não se confundiam totalmente com ela, o que permitia o surgimento de certas particularidades e, portanto, diferenças. Nesse sentido, a nuestra América se inseria no âmbito do acidental, peculiar e finito, mas, como todos os elementos do universo, levava em si algo de essência, de universal. Daí que, na base do americanismo martiano, conferindo-lhe um conteúdo universal, estava, seguramente, sua ética humanista.

As virtudes morais constituíam, portanto, a parte da essência, a parcela universal do americanismo martiano. Para que o homem vivesse em harmonia com a natureza – um dos fins últimos da existência humana – era preciso que a conduta humana fosse pautada pelo bem e pelo amor, superando a acidentalidade da maldade, do ódio e do egoísmo humanos. José Martí empenhou-se em resgatar determinados valores humanos invariáveis e universais que se situavam acima de todas as particularidades típicas de uma realidade americana fragmentada e contraditória, que formavam enfim uma nova pauta de convivência. O homem, para Martí, era, acima de tudo, um instrumento do dever. Por isso, o dever era tanto um valor em si como um elemento que impunha um sentido prático aos demais princípios éticos.

A ética de Martí valorou a dor e o sofrimento pelo seu efeito conscientizador sobre o sentido último da existência. Situou o bem e o amor como princípios fundamentais reguladores da conduta humana, tanto no plano individual quanto social, ao relevar o altruísmo e a renúncia em favor do próximo. Nesse sentido, as virtudes – sobretudo de ordem moral – eram assim concebidas como uma propensão à realização do bem e como via para a aproximação – ou mesmo fusão – do homem com a esfera das essências universais. No geral, sua ética se revestiu de um arraigado sentido humanista e/ou humanitário, na medida em que situou, condicionou e mensurou os valores na sua relação de utilidade para a coletividade. O homem, ou melhor, a humanidade, foi assim, para Martí, a medida de todas as coisas. Sua ética humanista foi tanto um elemento diferenciador de outras perspectivas americanistas quanto um elemento universalizante de sua proposta de identidade americana.

SEGUNDA PARTE: A VISÃO DA AMÉRICA DE JOSÉ MARTÍ

Consideramos também que a originalidade dos conceitos martianos de pátria e humanidade lhe permitiu conciliar determinados critérios de universalidade com uma perspectiva de identidade regional. Tal originalidade residiu no esforço por adequar o valor pátrio à condição humana em geral, o particular ao universal, ao definir a pátria como humanidade. Nesse sentido, a afirmação do americanismo martiano não foi acompanhada por uma subestimação do fenômeno patriótico e, especialmente, sua idéia de pátria não se desvinculou de uma perspectiva americanista. Em Martí, ambos conceitos se complementavam. Ele apenas estendeu ao âmbito continental o mesmo corpo de princípios que formavam a base de seu conceito de pátria. Seu discurso assumiu, dessa forma, um nítido conteúdo supranacional, de forma que seu projeto de atribuição de uma identidade americana vinculou-se ao reconhecimento da existência de uma pátria para além das fronteiras impostas pelos estados nacionais do subcontinente hispano-americano. Tal qual o seu patriotismo, seu americanismo se apoiou na consciência do imperativo de se avançar no rumo de uma nova ordem social para a América, sustentada em determinados princípios morais. Situado entre um nacionalismo extremado, de viés regionalista, e um cosmopolitismo sem raízes, seu patriotismo manteve-se coerente com sua visão do mundo e da humanidade, como o grande fomentador das virtudes humanas, como um fator de consciência moral. Enquanto dever de humanidade e personificação do bem comum, a pátria simbolizou para o intelectual cubano o meio privilegiado de materialização do seu ideal ético humanista.

O americanismo de José Martí se apoiou ainda em um determinado diagnóstico do presente e do passado da América, que foi um fator importante de diferenciação em relação a outros projetos de identidade continental. Glorificando a época pré-colombiana, condenando o episódio da conquista e colonização européia e, por fim, ressaltando o passado recente – pós-independência – em que a Hispano-América renascia para a liberdade e buscava ocupar uma posição de protagonismo no curso da história universal: tais eram as linhas mestras de sua visão da história americana. Mas ele acreditava que o fardo da herança colonial era bastante pesado e que a Hispano-América de sua época padecia de inúmeros “males de origem”. Porém, as causas atribuídas à enfermidade não estavam vinculadas a qualquer fator étnico ou racial, como propuseram outros americanismos. Para Martí, as causas eram, fundamentalmente, de conteúdo moral e de natureza histórica e, não sendo congênitas, eram, portanto, plenamente curáveis.

Mas, para se garantir a recuperação e a cura efetiva e poder vislumbrar um futuro grandioso para a nuestra América, era preciso vencer toda uma onda de ofensas, calúnias e preconceitos de cunho racista da qual era vítima, e que afetava a auto-estima, a honra e a dignidade dos diversos estratos étnicos e culturais que compunham os povos hispano-americanos. Por isso Martí enalteceu o que chamou de desdenhada e virtuosa “raça hispano-americana”, mestiça por excelência, livrando ao mesmo tempo o conceito de raça dos limites impostos pelos critérios biológicos e ligando-o à idéia de comunidade cultural. Seu americanismo se desenvolveu, assim, perante a imagem de uma nuestra América enferma, difamada e desdenhada, com a qual se identificou e buscou resgatar e relevar. Por fim, o diagnóstico martiano da América se completava com sua peculiar visão dos Estados Unidos. Seu estudo e experiência direta com a realidade estadunidense lhe possibilitou a consciência de que havia, efetivamente, uma outra América, distinta em suas origens, formação histórica, caráter e valores morais. Exercendo uma crítica daquela sociedade a partir de seu referencial ético e moral, o americanismo martiano se pautou pela negação dos Estados Unidos enquanto paradigma sócio-cultural a ser espelhado por todo o continente, e procurou oferecer uma alternativa a tal modelo.

Quanto à Hispano-América, o diagnóstico de Martí foi o de uma realidade caótica, fragmentada e conflituosa, que, em seu esforço por atribuir-lhe uma identidade, seu discurso procurou ordenar e unir. Porém, mais importante do que as unidades políticas e formais no âmbito do continente americano era a unidade de alma e espírito, uma unidade em torno dos mesmos valores universais e que respeitasse as diferenças, segundo ele, úteis à liberdade. Em seu exercício ordenador, Martí buscou identificar e sobrepor os elementos de união aos de fragmentação, colocando em relevo, sobre a aparência caótica, a essência unitária e harmônica da nuestra América. Para tanto, um princípio espiritual transformava-se no lastro fundamental do sentimento de co-pertencimento ou de comunidade no âmbito do subcontinente, compartilhado por aqueles que se identificavam com a “alma americana”, que congregava a todos na realização da grande missão universal, do grande dever de humanidade. Ao recorrer à imagem de uma família hispano-americana, apelou para um sentimento de comunidade, em busca de um argumento básico que sustentaria a idéia de uma pátria maior. Entretanto, é notável a omissão e/ou exclusão do Brasil do campo de identidade da nuestra América, bem como as parcas referências martianas ao termo América Latina, pelo fato de o epíteto latina colocar em evidência apenas um dos componentes que entraram na formação da mescla nuestramericana.

Para além dos fatores geográficos, históricos, culturais, étnicos, lingüísticos, que tradicionalmente definiam as fronteiras demarcatórias de um campo de identidade, Martí sobrepôs os valores morais. A virtude, ou o seu referencial ético no geral, foi precisamente o critério fundamental definidor e selecionador dos elementos incluídos ou excluídos do campo de identidade americano que Martí construiu. E isso foi decorrência da formação e das opções filosóficas de Martí que, desde jovem, abraçou a tese de que o cultivo das virtudes, a retidão na moral e nos costumes, era o único caminho para o homem vislumbrar uma vida em harmonia com a natureza, sentido último, para ele, da existência humana.

Tanto que a principal exclusão de seu campo de identidade, a da outra América, se deu exatamente por critérios de ordem ética. Para Martí, a sociedade estadunidense, se não estava mesmo diante de um processo de degeneração moral, tendia a uma visão limitada em relação a determinados valores e virtudes, que muitas vezes eram bem aceitos no âmbito das fronteiras nacionais mas negados para além delas – ou ainda negados internamente para determinados estratos sociais menos favorecidos e/ou discriminados. É sobretudo na relação e no esforço de diferenciação de um outro projeto de identidade continental, condensado na idéia do pan-americanismo e na proposta de se estender ao âmbito continental os valores e o modo de vida estadunidense, que se afirmava e consolidava o americanismo martiano. Paralelamente à afirmação do que se queria ser estaria a certeza do que não se queria ser. Foi, fundamentalmente, pela crescente consciência de uma otra América, distinta em sua origem e história, costumes e valores, cada vez mais distante dos ideais martianos de sociedade, que ganhava maior sentido e força a expressão nuestra América. Por isso, Martí encarava o continente cindido por distintos projetos de futuro, por diferentes sentidos de americanismo, reivindicados por uma e outra seção da América.

Outro aspecto a destacar é que a proposta martiana de identidade americana adquiriu maior vigor e intensidade como um projeto de futuro, já que não se baseou exclusivamente nem privilegiadamente em elementos ancorados no passado. A visão martiana da América real e concreta foi permeada, e mesmo determinada, pela América com a qual sempre sonhou, mas que não existia, ao menos ainda. Nesse sentido, a relação entre as dimensões do real e do utópico em Martí fez com que, por vezes, o dever-ser martiano assumisse mesmo o lugar da realidade, confundindo-se com ela. E, assim, acabaram predominando no americanismo martiano as forças de transformação em detrimento das forças de conservação. As premissas básicas que deveriam guiar o futuro do continente foram fiéis à ética humanista de José Martí. Ao opor um “americanismo hospitaleiro” a um “americanismo cesáreo e conquistador”, representado pela perspectiva pan-americanista, vislumbrava um campo de identidade aberto ao mundo, interessado pelo mundo, pelos exemplos úteis das conquistas universais da mente humana. Martí admitiu que, com certo critério, todas as raízes e enxertos eram bem vindos, desde que não se esquecesse o tronco comum americano, bem como a especificidade de seus frutos e flores no grande jardim universal.

Se havia algum tipo de incongruência entre a América sonhada por Martí e a realidade presente, fragmentária e conflituosa, imperfeita e contraditória, o ponto de partida continuava sendo a realidade presente, que exigia ser transformada e depurada, e não renegada. Afirmar uma identidade americana e integrar a grande marcha universal numa posição de protagonismo não deveria implicar numa negação das próprias origens, da própria história, do próprio passado, por mais doloroso, triste e cruento que este tenha sido. Muito menos implicava em negar as potencialidades de um conjunto heterogêneo de povos que tinham muito a contribuir, segundo Martí, com o aporte de seus valores e virtudes próprios, com a riqueza e a diversidade do grande banquete universal dos povos. Para o pensador cubano, o verdadeiro americanismo seria aquele que lograsse render-se ao imperativo do humanismo e das virtudes, os verdadeiros cimentos da América nova.

Enfim, coerente com sua peculiar visão de mundo e do ser humano, da natureza e da história e, sobretudo com sua axiologia, o americanismo de José Martí assumiu um viés universalista pela via do humanismo. Um americanismo que logrou conciliar, portanto, uma perspectiva de identidade regional americana com determinados critérios de universalidade. Um americanismo que visou um ponto de equilíbrio entre a individualidade de cada nação e sua integração numa totalidade nuestramericana, ou, em outro nível, entre uma individualidade nuestramericana e uma totalidade universal. Nesse sentido, sua ética humanista constituiu-se, simultaneamente, no fator diferenciador e universalizante de seu americanismo. As virtudes morais acabaram tornando-se o critério fundamental demarcador dos limites e fronteiras da nuestra América, ao determinarem as inclusões e exclusões do campo de identidade americano por ele reivindicado como uma projeção de futuro.

NOTA BIOGRÁFICA

Em 1853, nascia na cidade de Havana, Cuba, José Julián Martí y Pérez, num momento em que essa ilha era, junto com Porto Rico, a última colônia espanhola na América. Marcado por um profundo sentimento nacionalista e anticolonialista, o adolescente Martí já escrevia seus primeiros versos. Durante a guerra cubana contra a Espanha (1868-1878), em 1869, com apenas 16 anos, foi detido por sua propaganda independentista e condenado a seis anos de prisão, sendo deportado, em 1871, para a Espanha, onde viveu de 1871 à 1874. Enquanto ganhava a vida dando aulas, Martí estudou, ainda que irregularmente, o restante de seu colegial, Direito, Filosofia e Letras nas universidades de Madri e Saragoça. Em fins de 1874, conhece de passagem a França e viaja para o México. Entre 1875 e 1881, viveu no México, Guatemala e Venezuela – onde teve um contato profundo com as raízes autóctones americanas -, com ocasionais estadas na Espanha, para onde foi deportado novamente por conspiração (1879), em Nova York (1880) e mesmo em Cuba.

Uma vez fixado em Nova York, a partir de 1881, graças à sua colaboração em jornais de língua espanhola, cresce sua fama pela América espanhola: ao final dos anos oitenta, mais de vinte jornais do Continente (entre os quais, La Nación, de Buenos Aires, El Partido Liberal, do México, La Opinión Nacional, de Caracas, La Opinión Pública, de Montevidéu) divulgavam seus trabalhos. Embora seja mais conhecido pelas suas colaborações jornalísticas, publicou também uma vasta obra poética, além de inúmeras traduções. Desde 1887, foi cônsul do Uruguai em Nova York. Em 1888, foi nomeado representante da Associação de Imprensa de Buenos Aires, nos Estados Unidos e Canadá. Participou em 1889-1891 das duas Conferências Interamericanas de Washington – na última como representante do governo do Uruguai -, nas quais denunciou veementemente a política expansionista dos Estados Unidos sobre o continente americano. Em fins de 1890, Martí foi eleito cônsul em Nova York não só do Uruguai como também da Argentina e do Paraguai, além de presidente da Sociedade Literária Hispano-Americana.

Nos anos noventa, favorecido pelo amadurecimento das condições internas em Cuba, Martí se dedicou inteiramente à tarefa revolucionária, buscando aglutinar e organizar forças pela independência – quando então funda o Partido Revolucionário Cubano. Nesses anos, intensificam-se suas viagens e contatos visando à libertação de sua Cuba: Haiti, Jamaica, Flórida e a costa Atlântica dos Estados Unidos, São Domingos, Costa Rica e México. Juntamente com os generais Máximo Gomez e Antonio Maceo – ex-participantes da Guerra de 1868-1878 – prepara a guerra de independência e desembarcam em Cuba em 1895. Já em plena guerra, no dia 19 de maio daquele ano, Martí foi surpreendido e caiu morto por uma coluna espanhola, aos 42 anos de idade. Em sua curta e agitada vida, Martí conseguiu produzir uma vasta obra, infelizmente pouco conhecida no Brasil, de marcado conteúdo americanista, que o transformou, indubitavelmente, numa das figuras mais proeminentes do pensamento latino-americano de fins do século XIX.

____________

Lançamentos:

A Fundação Maurício Grabois está organizando lançamentos do livro. O primeiro deles será na “XXI Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba”, que será realizada nos dias 13, 14 e 15 de junho de 2013, na cidade de Foz do Iguaçu, Paraná.