Após umas férias do Blog, a que me impus em 15 de novembro do ano passado, aproveito a alegria da Copa do Mundo para retornar, também com alegria, ao convívio desse espaço de liberdade para a reflexão crítica.

Muito embora o ar pestilento (que cito no último artigo de novembro) não se tenha dissipado de todo, a alegria popular sempre ajuda a oxigenar os odores mais repugnantes.

A começar pelo retumbante fracasso do complexo de vira latas brasileiro em relação ao mundial de futebol. Estádios lindíssimos, torcidas maravilhosas em festa, mobilidade urbana sem confusão, aeroportos elogiados pelos próprios turistas, tudo funcionando para desespero dos catastrofistas e incréus espalhados à esquerda e à direita.

A renúncia do “justiceiro” também renova a esperança de que o STF deixe finalmente entrar novos ares em suas dependências e desapareçam os miasmas do ódio e da intolerância, bem como o comprometedor silêncio de alguns de seus inocentes integrantes.

Não se corrigem erros e mazelas de quinhentos anos em 24 horas, mas há que se tentar. Os conservadores e reacionários fazem o jogo a que estão acostumados, o jogo do poder a qualquer preço, sempre o quando o povo estiver no “seu devido lugar”. Essa lógica acompanha a História do Brasil. E apesar dela, o país vai mudando aos poucos.

Para não ser confundido com algum ufanista fora de horas, gostaria de tomar um único exemplo, quanto a mim significativo e emblemático, para ilustrar e tentar entender minimamente esse novo Brasil que vai a duras penas nascendo e que com toda certeza não será mais como era há doze anos, sem falar nos quinhentos que lhe antecederam, é claro…

A estreia da Copa do Mundo.

Ansiedades, temores sobre manifestações, caos no trânsito, confusão nas portas dos estádios e nos aeroportos, tudo era possível ou previsível. Nas redações dos nossos jornalões e revistas semanais, emissoras de rádio e televisão, com suas tropas prontas para noticiar o grande desastre, a torcida era inegavelmente contra o Brasil. No mais das vezes disfarçada, mas talvez – quem sabe – com um desejo íntimo e perverso: e se não houvesse mesmo a Copa?…

Apenas se esqueceram de combinar isto com as grandes corporações e empresas internacionais, que investiram milhões de dólares no evento, como fazem de quatro em quatro anos. A oposição endinheirada apostando contra seus pares e patrocinadores? O que diria o Banco Itaú, se não tivesse Copa, para ficarmos num exemplo doméstico?

Dia 12 de junho de 2014. Dia de sol e céu azul em São Paulo. Milhares de pessoas de todo o mundo foram chegando ao estádio do Itaquerão, zona leste de São Paulo, desde o meio dia.

Uma hora da tarde… E nada.

Duas horas da tarde… Nada ainda.

Mas que diabos: quinze horas e começa o show de abertura. Ah! Alguma coisa no show tinha que dar errado. Não deu…

O Brasil vai perder para a Croácia, não perdeu…

Mas ganhamos com a ajuda do juiz, a Copa está comprada, arriscaram algumas matérias dos jornalões.

Não aguentando mais tanta decepção, o jeito foi apelar para a ignorância: esconder o maravilhoso invento do cientista Nicolelis e insultar a presidenta da república com a frase que – penso eu – mais devem usar em suas próprias casas.

E de repente a revelação: a grosseria partira da ala VIP (Very Important Pigs) do Banco Itaú… Explicitava-se para o mundo uma fatia grotesca da luta de classes no Brasil, essa luta que – peço desculpas pelas palavras – os pós modernos gostam arrogantemente de ignorar.

Aí caiu a ficha. Só então entendi o profético bordão da campanha publicitária do banco, um dos patrocinadores da Copa: #issomudaomundo.

E como muda. Esperem as urnas se abrirem em outubro.

“O CAMAROTE VIP DO ITAÚ“: Geraldo Alckmin, José Serra, Fernando Henrique Cardoso e Aécio Neves em convenção do PSDB que lançou o candidato tucano à presidência da república em 2014.

*Campanha publicitária do Banco Itaú, “Mostra tua força Brasil”, feita especialmente para a Copa do Mundo de 2014, e que trabalha o slogan #issomudaomundo : https://www.youtube.com/watch?v=w4GQuhMqo54