No experimento, neutrinos criados no Cern, na Suíça, viajam 730 km através da crosta terrestre até chocarem-se com os detectores do laboratório em Gran Sasso, na Itália. Os cientistas do experimento Opera, em Gran Sasso, identificaram dois possíveis efeitos que podem ter causado mudanças no tempo de viagem dos neutrinos. O primeiro, uma conexão defeituosa entre a fibra ótica que leva sinais entre o sistema GPS e o relógio-mestre do detector, pode ter diminuído o tempo de viagem dos neutrinos.

Para complicar, o segundo efeito, um instrumento que opera dentro do detector e que deveria estar sincronizado com os sinais de GPS, pode aumentar o tempo de viagem.

Como os dois efeitos agem contrariamente, os cientistas do Cern e da colaboração Opera estão estudando sua magnitude para então decidir qual dos dois domina a medida final. Porém, Lucia Votano, diretora do laboratório Gran Sasso, afirmou que “suspeita principalmente” da fibra ótica, o que confirmaria a validade da teoria de Einstein. Em maio, os dois laboratórios vão repetir o experimento usando pulsos de curta duração com uma precisão bem maior do que a atual. O caso poderá então ser fechado.

Conforme escrevi aqui no dia 2 de outubro de 2011, “embora o time de cientistas tenha sido extremamente cauteloso na análise de possíveis erros sistemáticos, é muito provável que algo tenha-lhes escapado. Talvez no processo de produção dos neutrinos -o momento em que surgem, talvez na medida do tempo entre os vários sinais que registram os resultados de colisões nos computadores, talvez algum efeito geológico ainda desconhecido. Ou, claro, pode ser que os neutrinos tenham viajado mesmo algumas dezenas de bilionésimos de segundo mais rápido do que os fótons, as partículas da luz. Mas não apostaria nisso.”

Continuo não apostando. De todo modo, a controvérsia é extremamente importante e nos ensina muito sobre como funciona a ciência. Sabendo que seus resultados aparentemente contrariavam um dos fundamentos da ciência moderna, os cientistas dos dois laboratórios buscaram diligentemente por erros em suas medidas e equipamentos para tentar eliminá-los.

Talvez tenham se precipitado ao declarar para o mundo o que tinham achado antes de confirmar que estavam certos. Porém, agiram com humildade ao confrontar uma questão de extrema complexidade, pedindo ajuda aos colegas espalhados pelo mundo. Não há dúvida de que alguns se aproveitarão da situação e tentarão atacar a credibilidade da ciência. Obviamente, esses indivíduos não entendem que errar e admitir o erro são passos essenciais na busca pela verdade.

* Marcelo Gleiser é professor de física teórica no Dartmouth College, em Hanover (EUA), e autor de “Criação Imperfeita”

Fonte: Folha de S.Paulo