Esta ideia de uma formação unitária ligando as forças da resistência ao capitalismo, vem de longe. Fala-se um pouco no assunto, logo surgem os doutos demolidores e a tese volta a esquecer. Porém, tempos passados sobre o silenciar das primeiras vozes, eis que o tema regressa pela mão de novos observadores católicos, comunistas ou aparentemente surgidos de lado nenhum. Esta recorrência é opção alternativa sempre fundamentada nos factos da vida real. Tanto basta para que a História cedo ou tarde a imponha a um grande debate.

Um outro aspecto determinante de uma futura correcção inevitável de atitudes e posições, é a natureza de classe das lutas que por todo o mundo se travam e assumem aparências distintas mas convergentes. Pouco importa que as disputas sejam em torno do petróleo, dos pontos estratégicos ou do ouro. Elas são invariavelmente um reflexo da forma injusta como se organizam e relacionam as sociedades humanas.

A degradação dos valores, por exemplo, tem as suas raízes nas estruturas que formam a base das sociedades que o homem edificou. Assim, é apenas o homem que através de uma luta – dura, prolongada mas vitoriosa- corrigirá os seus próprios erros, castigará os crimes cometidos e estabelecerá uma nova sociedade unitária onde direitos e deveres sejam comuns a todos os seres humanos. No plano político, o homem constituirá a medida de todas as coisas”. Quanto ao resto, ao preenchimento do seu espaço e do seu tempo, gozará de inteira liberdade.

Esta é a perspectiva e o projecto comunista, com os pés cada vez mais assentes na terra e a ideologia sempre mais firme e sempre mais solta para a unidade com os cidadãos honestos de todo o mundo. O próprio Lénine reconhecia que esta ambição de uma sociedade nova é tão desmedida que os comunistas jamais lhe poderão dar corpo sem o concurso dos homens e mulheres não-comunistas.

Insistir nestas imagens não é acto simplesmente gratuito. O pensamento comunista associa inseparavelmente o projecto e a acção ou o fenómeno e a essência.

A acção assenta na experiência concreta e gera, como reflexos, projectos novos. É esta a origem das posições políticas dos comunistas que se recusam a penetrar nesse mar de lama em que mergulham os capitalistas não só portugueses mas do mundo inteiro.

Católicos de hoje, de amanhã ou de um passado tenebroso?

Vamos citar, de passagem, um problema sério da Igreja católica mas não insistiremos no assunto. É ao povo católico que cumpre enfrentá-lo e resolvê-lo.

Referimo-nos à imagem multiforme da Igreja católica, não apenas em Portugal mas em todo o mundo. Há uma igreja para os ricos e uma igreja para os pobres. Uma igreja progressista (ou melhor, aberta ao progresso) e uma igreja fundamentalista (que assume as posições de Pio X – ver citação no alto da página). Há a igreja voluntária e não-lucrativa e a igreja multimilionária dos offshores, das operações bolsistas, das imobiliárias, do negócio das fundações, etc. Há as igrejas da denúncia, do silêncio, do ópio do povo, da cruzada, da caridade, do milagre, das ciência e do conhecimento, etc., etc. Ou seja, para todas as ocasiões há uma igreja disponível. Os católicos verão o que lhes será possível fazer para tornar credível o Vaticano aos olhos do povo português.

Por ora, é esta a situação real. Com graves prejuízos para os mais pobres entre os quais se contam milhões de crentes e de cidadãos que ainda vivem nas franjas da fé. Se a realidade de hoje é tão tenebrosa como a de ontem o foi, a hierarquia da Igreja há-de convir que no século XXI é mais difícil ocultar do povo os números, os nomes e as cifras que geram a denúncia, a revolta e a indignação.

Ao falarmos destas coisas não perdemos de vista que o nosso objectivo é promovermos a aproximação e a unidade de acção entre comunistas e católicos, pelo menos em certas áreas do campo operacional. Fica para um próximo espaço no Avante!.

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Fonte: jornal Avante!