Não precisamos esperar pelo jogo final para saber quem conquistará a Copa do Mundo de 2010: é a África do Sul. Pode não ser necessariamente a Copa do Mundo de futebol, mas, certamente, o torneio de competitividade e de respeito global. Pouco mais de duas décadas atrás, o país era um pária internacional, mas hoje compete com alguns dos países mais bem-sucedidos no mundo e, como já demonstrou ao assegurar e depois organizar a Copa do Mundo, o país está se saindo vitorioso.

Nelson Mandela, o mais respeitado líder do mundo, ajudou o país a reconstruir sua reputação para a liberdade, a tolerância e a paz. A batalha para convencer o mundo de que o país mudou completamente, porém, ainda precisa ser vencida. Resta pouca dúvida, por exemplo, de que a criminalidade, a pobreza e a sombra da aids ainda são problemas muito reais, à medida que algumas pessoas dizem que é preciso se empenhar muito mais para melhorar a justiça social. Apesar desse e dos demais desafios, o país apresentou um crescimento realmente impressionante ao longo dos últimos 18 anos.

A impressionante capacidade de resistência da economia da África do Sul significou que sua competitividade melhorou nos dois anos passados, apesar da recessão global. Ele passou para o 44º lugar no Anuário de Competitividade Mundial para 2010 da IMD, que classifica 58 economias industrializadas e emergentes em função do seu desempenho econômico, eficiência do governo, eficiência empresarial e infraestrutura. Há apenas dois anos ele estava no 53º lugar.

O país fez progresso particularmente sólido no aprimoramento da eficiência do governo, que reflete em que medida as políticas governamentais apoiam a competitividade econômica, e agora está classificado em 21º lugar nesse critério quando, em 2009, ocupava o 26º posto.

Sua posição na eficiência empresarial, que expressa em que grau os empreendimentos estão atuando de forma inovadora, lucrativa e responsável, é 31, uma a menos que a do ano passado, mas, ainda assim, indicadora de desempenho robusto.

A categoria de infraestrutura, que mede o grau em que os recursos básicos, tecnológicos, científicos e humanos satisfazem as necessidades dos negócios, realça alguns dos maiores desafios da África do Sul. Mesmo assim, ele ainda fez avanços consideráveis, subindo da 56ª posição em 2009 para a 51ª em 2010.

Uma avaliação macroeconômica da sua economia doméstica não mostrou progresso ao longo do ano passado na comparação com esses 57 países competitivos, portanto, o país permaneceu no 56º posto no critério de desempenho econômico.

Essas classificações oferecem uma forma conveniente de entender os desafios do país e mapear o seu progresso, mas a realidade oculta nesses números é complexa, delineada por anos de disputas internas e de busca por identidade e integração. Em primeiro lugar, na maioria dos países as maiores questões são as que giram em torno de emprego, educação e assistência médica. Na África do Sul, elas assumem contornos ainda mais agudos em torno da criminalidade, Aids e a pobreza, que está na base de ambas.

O país tem alta taxa de desemprego – está no fim da lista da IMD nesse critério – e é um dos mais mal colocados no tocante ao crescimento do nível de emprego. Ele enfrenta grandes desafios na oferta de infraestrutura básica, como acesso a água limpa (está classificado em 54º lugar) e serviços de saúde (52º).

Esses são alguns dos desafios, cuja maioria é bem conhecida dos sul-africanos e dos estrangeiros; assim sendo, onde estão os pontos fortes? Bem, nessas difíceis circunstâncias econômicas, a dívida do governo como percentagem do PIB é baixa, e está situada na 16ª posição, que está atrás da melhor classificada Hong Kong, mas muito à frente de Suíça (28ª) e Suécia (30ª). A economia também apresenta um excelente crescimento real do PIB per capita, chegando em 22º, um lugar à frente de Hong Kong, desta vez.

O país encabeça a lista em custo de vida, aparece em 4 º lugar na implementação dos direitos dos acionistas, e fica entre os dez melhores na categoria de eficiência empresarial e práticas de gestão, que avalia se os processos de auditoria e de contabilidade são implementados adequadamente. E ele está na metade superior, em 27º quando os países são classificados de acordo com as práticas éticas das suas companhias.

Esses são apenas alguns exemplos de realizações. Embora não resolvam a totalidade dos problemas imediatos da África do Sul, esses sucessos certamente criam uma plataforma para moldar um futuro melhor. A África do Sul realizou grandes transformações num espaço de tempo relativamente curto, ao lidar com as raízes dos problemas enquanto simultaneamente se baseava nos seus pontos fortes – que podem não ser sempre imediatamente óbvios a alguém que apenas atenta para a classificação geral.

Os sul-africanos parecem ter uma atitude empreendedora inata para os negócios e uma disposição de investir tanto local como internacionalmente. Isso está rendendo frutos. Na lista recente das 40 maiores companhias do mundo da “BusinessWeek”, três companhias sul-africanas foram reconhecidas entre as melhores no mundo: MTN, a companhia de telecomunicação móvel; Sasol, especializada em energia e produtos químicos; e a Bidvest, o conglomerado global de serviços, comércio exterior e distribuição. A MTN, companhia fundada em 1941, nos primórdios da democracia da África do Sul, foi sétima colocada na lista, atrás de companhias como Nintendo, Apple e Google, que ficaram na primeira, segunda e terceira posição, respectivamente.

MTN, Sasol e Bidvest obtiveram classificações tão elevadas devido ao seu compromisso com inovação, carteiras diversificadas, expansão agressiva, sólida liderança e uma clara visão para o futuro. As três companhias estão comprometidas com suas origens e seus valores africanos à medida que se expandem para novos mercados fora do continente.

A África do Sul está em uma jornada desafiadora, que começou no dia em que Nelson Mandela foi libertado da prisão e deu seu primeiro passo para a liberdade. É uma jornada que continuará repleta de dúvidas e esperanças, sucessos e fracassos. Ela não será fácil. Mas, como disse Nelson Mandela, “depois de escalar uma montanha muito alta, constatamos que existem muitas outras por escalar”.

A África do Sul está escalando uma montanha assim na organização de uma das mais prestigiosas competições esportivas do mundo. Ele merece conquistar uma copa mundial única – um futuro próspero. Essa é uma vitória que permanecerá com o país muito depois de a competição de futebol ter se encerrado e muito depois de ter sido entregue a outro país anfitrião.

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Hischam El-Agamy é diretor executivo na IMD

Fonte: jornal Valor Econômico