O processo de impeachment contra Dilma Rousseff é frágil, ambíguo, duvidoso, questionável… Esses são os termos que os grandes veículos de comunicação internacionais utilizam para descrever o que está acontecendo no Brasil. Na terça-feira, dia 12 de abril, o New York Times afirmou em uma reportagem sobre o resultado da votação do relatório do impeachment que a penalidade para Dilma parece desproporcional, uma vez que ela está sendo julgada por muitos políticos que enfrentam acusações ou são investigados por enriquecimento ilícito e, ela, é uma das raras figuras da política brasileira que não sofre nenhum tipo de acusação ou suspeita de corrupção.

Esse entendimento é fruto dos movimentos que denunciam que um golpe de Estado está em curso no Brasil. No início do mês de março a compreensão era completamente diferente: a imprensa internacional noticiava que o governo brasileiro estava muito enfraquecido por causa de uma recessão econômica, que é uma das piores da história e, principalmente, por causa do grande esquema de corrupção na Petrobras, que atingiu o núcleo político do país. Após a condução coercitiva de Lula muitas suspeitas foram levantadas contra o ex-presidente, que é reconhecido como um ícone da esquerda, responsável por um milagre socioeconômico. A situação era compreendida como o fim da era do PT no poder e o desaparecimento do legado de Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-metalúrgico adotou um tom combativo que, em um primeiro momento, chegou a ser criticado pelos jornais europeus e americanos. Diziam que Lula estava abalado, fragilizado, desesperado. No entanto, o início dos protestos contra o impeachment obrigou os veículos de comunicação internacionais a tentarem compreender com mais profundidade o que estava acontecendo no Brasil.

O acompanhamento da política brasileira ainda não gerou conclusões, ao contrário, deixou os jornalistas estrangeiros aparentemente em dúvida. A observação do New York Times que está indicada no início do artigo é a questão mais levantada pelos jornais, a legitimidade do processo. No dia 31 de março, o jornal Le Monde publicou um editorial dizendo que não havia golpe de Estado em andamento no Brasil, que isso era uma retórica infantil. Mas a mesma edição trazia uma reportagem na qual se afirmava que só depois do impeachment os brasileiros se dariam conta de que o processo contra Dilma foi encabeçado por Eduardo Cunha, que tem contas na Suíça, que ela foi julgada por uma comissão onde a maioria dos parlamentares é acusada de corrupção, que o vice-presidente da República é acusado de corrupção. Só então, o brasileiro se daria conta de que esse processo não traria mudança alguma. Até mesmo a revista The Economist que, em março pediu a saída de Dilma, publicou um artigo no dia 9 abril falando sobre a fragilidade do processo de impeachment e o quanto isso pode custar caro ao país.

Na primeira semana de abril, o jornal inglês The Guardian soltou uma reportagem com o seguinte título, traduzido de forma livre, “O maquiavélico cotado para tomar o trono – mas o “golpe” de Temer vai unir ou dividir o Brasil?” O texto levanta suspeitas sobre a conduta meticulosa de Michel Temer em parceria com Eduardo Cunha. Parece até que os britânicos já previam o que ficou escancarado na semana seguinte. O discurso de Dilma acusando Michel Temer de traição e de ser um dos chefes da conspiração ganhou destaque nos principais jornais do mundo que chegaram a ironizar a declaração dada pelo vice-presidente, alegando que divulgou o discurso à nação por “acidente”. A repercussão dos acontecimentos nessa semana foi tão grande que até a Casa Branca se pronunciou sobre a situação no Brasil. Em uma declaração sucinta, um porta-voz do governo americano disse que o presidente Obama está otimista com a capacidade do Brasil para lidar com desafios políticos e econômicos. Que a democracia brasileira está madura, e que o país demonstrou ter habilidade para sair dessa situação.

O sistema político brasileiro talvez seja o grande mistério para o mundo, o jornal alemão Süddeutsche Zeitung publicou um artigo sobre a dificuldade de se compreender esse sistema. Alegando que até mesmo os especialistas acabam divergindo sobre o que é correto e o que não é. O The Guardian ainda publicou um artigo do filósofo Rodrigo Nunes, no qual ele fala sobre a maioria silenciosa do país e como, na verdade, esse povo que mantêm o silêncio é quem sempre foi mais consciente na hora do voto.

Nessa semana, os meios de comunicação estrangeiros analisaram que o apoio ao processo de impeachment está em queda e que o resultado da votação é imprevisível.

Essa mudança de entendimento da conjuntura brasileira ocorreu graças aos movimentos de resistência que lutam contra o impeachment. Cada vez mais, os jornais estrangeiros têm questionado a legitimidade do processo de impeachment de Dilma Rousseff que vai entregar o país nas mãos de políticos que foram definidos anteriormente, pela imprensa internacional, como clientelistas e que são suspeitos de corrupção. Aos olhos do mundo, nada disso cheira bem.

Pedro Simon Camarão é jornalista, correspondente da Fundação Perseu Abramo em Paris

Publicado em Fundação Perseu Abramo