Para além de hipócritos lamentos sobre a fome e o sofrimento que grassam no continente e de episódicas denúncias de fenómenos de esclavagismo e outros tráficos criminosos, a África só tem estado no radar da comunicação social dominante para propagar o conceito de «Estado falhado», a ação de misteriosas forças «terroristas» e instigados conflitos étnicos, tudo situações a dar pretexto para uma intervenção externa paternalista e a instalação de forças armadas imperialistas por todo o continente, processo em que lamentavelmente Portugal está envolvido.

Do Corno de África ao Golfo da Guiné, passando pelo Norte de África e a vasta região do Sahel, não encontramos melhor termo para caracterizar a acção do Norte «ocidental e cristão» que de recolonização, pois os mecanismos de opressão vão muito para além do clássico sistema neocolonial. Isso já não chega. É preciso instalar, com o concurso da força militar, um novo tipo de poder que esvazie as funções de soberania dos estados e abra espaço à pilhagem das multinacionais.

A intervenção externa vai ao ponto de – mesmo quando a posição política das forças que dirigiram a luta pela independência está já longe dos seus programas originais – recorrer a todos os meios para afastar do poder tudo quanto ainda possa lembrar patriotismo e ideal revolucionário.

Entretanto os EUA criam o Africom e a UE desenvolve «parcerias» para ampliar a sua influência nomeadamente no Norte de África. Petróleo, ouro, diamantes e minérios vários, água e recursos florestais, tudo suscita a cobiça do imperialismo.

Mas há resistência e luta, e a África há-de encontrar os caminhos de uma nova libertação. É inevitável. Está inscrito nos próprios mecanismos da exploração capitalista e nas suas insanáveis contradições.

O drama dos refugiados e da emigração – que a UE está a tentar conter de forma criminosa com patrulhamento militar e autênticos campos de concentração na Líbia e noutros países, e a que os EUA respondem erguendo muros e abandonando provocatoriamente o acordo de 2016 da ONU – só terminará com grandes transformações de progresso social e soberania que uma juventude numerosíssima acabará por protagonizar. Nem as ridículas esmolas da falsa «ajuda ao desenvolvimento», nem a militarização do continente, nem o policiamento do Mediterrâneo resolverão problemas de fundo que só um novo fluxo libertador poderá resolver.

É por isso que é importante lembrar Amílcar Cabral, o patriota, o internacionalista amigo dos comunistas portugueses e do povo português, o guerrilheiro superiormente dotado. O seu vil assassinato nem impediu que poucos meses depois em Madina do Boé fosse proclamada a independência da Guiné-Bissau nem matou os seus ideais. Eles estão bem vivos nos dias de hoje e a África reerguer-se-á.