A Cátedra Cláudio Campos, da Fundação Maurício Grabois, lançou nesta quarta-feira (12), o livro sobre O Pensamento Nacional-Desenvolvimentista. O evento virtual teve participação do presidente da Fundação Maurício Grabois, Renato Rabelo, e os organizadores da obra Nilson Araújo e Rosanita Campos. Além desses, prestigiam o lançamento os autores Rubens Sawaya e Alexandre de Freitas Barbosa, além de Carlos Lopes e Aldo Arantes.

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A obra é lançada pela Fundação Maurício Grabois e pela Editora Anita Garibaldi, com o selo da Cátedra Cláudio Campos. Rosanita Campos ressaltou o trabalho de seleção dos 31 textos entre discursos, artigos, aulas, entrevista, documentos e mensagens de 16 autores. A preocupação era garantir um painel que abarcasse os pensadores mais influentes que nortearam o avanço do desenvolvimento econômico do Brasil, em suas diversas etapas. Os textos a questão desde meses após a chegada de Vargas ao Rio de Janeiro (1931) até às vésperas do mais recente grande confronto político brasileiro: as eleições de 2018, passando pelo modelo militar de desenvolvimento e suas implicações para o futuro da indústria nacional.

O prefaciador Renato Rabelo, presidente da Fundação Maurício Grabois, falou da lacuna que o livro preenche como referência sobre o ideário nacional desenvolvimentista. Ele observou que, mesmo forças progressistas e defensores de um projeto autônomo e soberano de desenovlvimento para o país, exploram e refletem pouco sobre o tema.

Renato afirma que a pandemia expôs ainda mais os danos que a lógica financista dos governos neoliberais e o status neocolonial na divisão internacional do trabalho atinge os interesses da população, particularmente impedindo qualquer possibilidade de desenvolvimento nacional.

Ele lembrou o pensamento de Celso Furtado, expresso em 1992 com a influente obra Brasil, a construção interrompida, que distingue o curso declinante e o círculo vicioso em que a ditadura militar mergulhou Brasil, levando à crise estrutural do capitalismo dependente do Brasil.

Renato ainda ressaltou a importância do debate para a formulação do programa do Partido para a superação dos impasses econômicos, por meio da Cátedra Claudio Campos.

O livro está dividido em quatro grandes partes que elencam seus textos por critérios temáticos. A quarta parte do livro é intitulada Recuperando o nacional-desenvolvimentismo para a Revolução Brasileira.

Dentre as principais personalidades do pensamento nacional-desenvolvimentista, a coletânea destaca, Celso Furtado: criatividade e dependência na periferia, de Rubens R. Sawaya. Durante o lançamento, Sawaya descreve como se deu a reflexão de Celso Furtado sobre o golpe militar que interrompeu o processo desenvolvimentista do Brasil.

Ele destacou a importância do poder dos sindicatos no sistema capitalista para cobrar e lutar pelo processo de desenvolvimento. Essa influência positiva da classe trabalhadora é observada durante o período getulista. Furtado observa que o capitalismo dominado por grandes corporações leva à concentração de renda e aumento da pobreza, como se viu conforme avançava o regime militar.

O golpe de 1964 impediu o desenvolvimento do país ao impedir a atuação sindical e aumentar o poder das grandes empresas, segundo ele. Esse norte militar levou ao aprofundamento da dependência internacional e apoderamento do grande capital transnacional, que culminou com a entrega completa pelos governos de Fernando Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso.

Furtado entende a necessidade desse aparato social, recentemete desmontado no Brasil, para o desenvolvimento nacional. Ele resgatou Karl Marx, que desenvolve a ideia de que a subordinação da criatividade humana e da tecnologia à acumulação de capital precisa ser superada, promovendo a civilização industrial. Para Sawaya, este é um desafio importante e difícil, de que a China tem se apropriado e que Furtado teria analisado com interesse.

O texto Roberto Simonsen: a indústria e o desenvolvimento do Brasil, contém parecer do industrial apresentado ao Conselho Nacional de Política Industrial e Comercial (CNPIC), em 16 de agosto de 1944, com comentário do jornalista Carlos Lopes, da Hora do Povo.

Lopes ressalta que, embora tenhamos importantes intérpretes do desenvolvimentismo brasileiro, Simonsen é daqueles que realizaram o desenvolvimentismo e expressaram seu pensamento de forma prática e política. Esse olhar do livro para esses atores da industrialização, na importância do jornalista, é importante.

Os pensadores do Iseb foram mencionados pelo conceito de que, sem ideologia do desenvolvimento, não há realidade do desenvolvimento. Assim, Lopes parafraseia a ideia de que compreender o passado é fundamental para não repetir os erros, daí a importância de resgatar aqueles autores.

Lopes ainda mencionou como o processo desenvolvimentista foi importante para reduzir a dependência brasileira. Desde Osvaldo Aranha, que analisou o ministro do Império, Souza Franco, que defendia a corrente que não dava importancia ao lastro ouro. Assim como o Barão do Mauá, percebiam que lastrear o réis ao ouro, equivalia à lastreá-lo à libra esterlina, gerando uma enorme dependência da Inglaterra. Foi o rompimento dessa dependência que permitiu o maior desenvolvimento do Brasil no mundo, na primeira metade do século XX.

Outro pensador destacado é Rômulo de Almeida: o intelectual orgânico do Estado e o Brasil desenvolvimentista, de Alexandre de Freitas Barbosa, professor do Instituto de Estudos Brasileiros da USP. Ele ressaltou a dificuldade de resgatar autores como esse, silenciados pela economia ortodoxa. Em artigo feito para o IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Barbosa já caracterizava o Brasil desenvolvimentista de 1945 a 1964 e a trajetória de Rômulo Almeida.

Em seu artigo, ele investiga a articulação de intelectuais orgânicos do estado atuando nos bastidores do Governo Vargas, como Ignácio Rangel e Celso Furtado. Esse resgate é particularmente trabalhoso para o pesquisador.

Barbosa também observa que o conceito de desenvolvimentismo é mencionado pela primeira vez em 1962, por Hélio Jaguaribe. Celso Furtado, por exemplo, se qualificava como nacionalista, e não desenvolvimentista. Analisar a história do conceito pode ajudar a evitar equívocos de interpretação do período anterior.

Ele também analisa a evolução do desenvolvimentismo entre 1930 a 1980. Gustavo Franco critica essa política de autosuficiência e inflacionismo, enquanto Bresser-Pereira recupera como positiva para o país, mostrando como o conceito é permeado de polemismo ideológico. Ele também enxerga que 1964 realiza uma ruptura e perde o caráter desenvolvimentista do período anterior. A partir do regime militar, Barbosa entende que há uma disputa conceitual em que a visão anterior foi derrotada e exilada.

Para Barbosa, olhar para esses intelectuais orgânicos do trabalhismo getulista oferece princípios norteadores no contexto de variedade de capitalismo que temos hoje. Ele considera que isso ajuda a perceber e analisar as contradições e potencialidades perdidas em meio aos governos democráticos dos últimos anos. Assim como contribui para compreender o papel da ascenção chinesa, e a economia e estrutura de poder que se instaura em meio à opção da burgueisa pela destruicão do estado. A pergunta que se faz é de onde virá o bloco de poder, com energia catalizadora, capaz de acionar o desenvolvimento.

Nilson Araújo escreve o capítulo O Nacional-desenvolvimento e a industrialização (2007) e João Goulart e a atualidade das Reformas de Base (2018). Durante o evento, ele descreveu o cenário internacional que levou ao surgimento do nacional-desenvolvimentismo no Brasil. Ele aponta como parte de quadro a mudança de hegemonia da Inglaterra para os EUA na virada do século, o surgimento do socialismo e o capitalismo de estado de bem-estar social que se implanta para enfrentar as lutas sociais daquele período. A ênfase na formação de um mercado interno de consumo dos produtos industriais vai se consolidando em todo o mundo desenvolvido.

No caso de Vargas há uma guinada distributiva turbulenta com a mudança do investimento público da agricultura sendo transferido para a indústria. Um processo revolucionário fundamental para a reviravolta industrializadora do país.

As mudanças impostas pela ditadura, através de um desenvolvimento excludente, desigual e dependente, mergulharam o país no mais longo periodo de estagnação ao mudar os princípios que norteavam o período anterior.

Nilson acredita que a crise estrutural atual do capitalismo e a perspectiva de mudança geopolítica com o avanço da China ajuda nosso processo desenvolvimentista. Para isso, é preciso superar o modelo exportador de reprimarização da produção, que reduziu a indústria do país a 10% do PIB.

O Brasil também vai precisar de uma “escada” para alcançar a tecnologia avançada da quarta revolução industrial, que dificulta a reindustrialização do país. Outro desafio que os governos progressistas não resolveram plenamente foi a recuperação da renda. Ele observa que o governo Lula deu 50% de aumento no salário minimo, mas ele continuou uma fração do que era na década de 1940.

Nilson considera que a importância de realizar esse livro está no resgate da memória histórica dessa evolução econômica.

Haroldo Lima presente!

O evento encerrou-se com Aldo Arantes homenageando o saudoso Haroldo Lima, que contribuiu com artigo sobre desnacionalização. O livro traz o informe especial sobre a desnacionalização (2001), para o 10º Congresso do PCdoB. No Novo Projeto Nacional, caminho brasileiro para o socialismo (Programa do Partido Comunista do Brasil, aprovado em seu 12º Congresso de 2009), cria-se um lema: O socialismo é o rumo, a construção da nação o caminho. 

Arantes recordou que desde a militância na Ação Popular (AP), Lima se destacou na defesa da soberania nacional, tendo contribuído para os estudos que levaram a organização a incorporar-se ao PCdoB.

Na Constituinte, Arantes destaca o papel de Lima como membro da Comissão de Sistematização e de Ordem Econômica na defesa da soberania e na questão relacionada ao petróleo. De acordo com o informe congressual publicado no livro, Lima demonstra como o neoliberalismo nos conduziu ao neocolonialismo.

Como diretor-executivo da Agência Nacional do Petróleo, a partir da descoberta do pré-sal, Lima definiu o sistema de partilha na exploração do petróleo. Contribuiu ainda para as leis aprovadas em 2010, criando o fundo social para educação, saúde, meio ambiente e desenvolvimento, que criava o sistema de partilha e a PPSA, empresa estatal para contratos de partilha. Foi a ANP, sob sua direção, que autoirzou a Petrobras a perfurar os poços de Libra.

Emocionado, Arantes garantiu que a trajetória de Haroldo Lima não será esquecida ”na luta em defesa da soberania nacional e do petróleo, como riqueza essencial para nossa afirmação”.

 

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Pensamento Nacional-Desenvolvimentista, Nilson Araújo e Rosanita Campos (Orgs.) 

– Fundação Maurício Grabois, Cátedra Cláudio Campos/ Editora Anita Garibaldi
616 páginas. 2021.

Leia ainda: O pensamento nacional-desenvolvimentista – Resenha*, por FERNANDO GARCIA DE FARIA**