Eu sou uma destas pessoas que, no bom sentido, não sabe dizer não. Por conta disto, já me peguei em diversos lugares desagradáveis como: terreiros de umbanda, culto evangélico, rina de galo, despachos em encruzilhada com uma amiga que não conseguia viver sem seu amor, e mais uma infinidade de outras coisas que, no meio da confusão, eu sempre me perguntava: mais que diabos estou fazendo aqui?!

      Um dia, minha mulher foi quem me salvou de uma destas. Estava em casa me vestindo quando ela perguntou: para onde você vai?

      – Vou para o jogo do Corinthians.

      – Mas você não é palmeirense?

      – Sou. Mas é que o pessoal me convidou, achei ruim dizer não. E também vai todo mundo.

      É claro que minha mulher ficou apreensiva. O que é que um palmeirense doente, a esta altura mais doente que palmeirense, vai fazer num jogo do corinthians? É óbvio que tem mulher nesta história. Pensou ela enquanto me perguntava:

      – E quem vai? Batia o pé no chão para dar um ar mais autoritário.

      – Bom! Vai o Carlão, o Euzébio, Renata… 

      – Renata! Falou de supetão.

      – O Renata! Os pais queriam uma menina. Vai entender a cabeça destes antigos. Mas o cara é homem, sem tirar nem por.

      – Huuum! Quem mais?

      – E mais um monte de outros corinthianos. Só homem, eu acho.

      – Você não vai. Pode ligar para eles e dizer que você não vai.

      Tanto ela falou que acabei criando coragem, liguei para o pessoal e falei: Amor, diz você que eu não posso ir.

      Numa outra ocasião, eu andava pela Líbero Badaró, virando para passar sobre o Viaduto do Chá quando encontrei um amigo que já não via há muito tempo. A primeira coisa que reparei neste meu amigo claro, foi seu novo penteado, ou a falta dele. O cara tinha raspado toda a cabeça e, no meio da nuca, deixado um montinho de cabelo que ele trazia amarrado na forma de um pequeno coque. Trajava uma roupa cor salmão e da cintura para baixo uma longa e esvoaçante saia.

      Eu já tinha visto homens vestidos de mulher, inclusive com um coquesinho daqueles, não tenho preconceito, apesar de achar que homem que não gosta de mulher, tem mais é que tomar no…, deixa pra lá. De qualquer forma este era meu amigo. Fomos a várias baladas juntos, não saímos dos sambas paulistanos e agora, vejam só, vestindo saia. E se não bastasse a saia, estava falando manso, devagar. Bom o negócio é pensar pelo lado positivo, perdi um amigo, mas ganhei uma amiga.

      – E aí Rubão, tudo bem? O que tem feito?

      – Oi Fernandinho. Não sou mais Rubão, agora sou Amara-Purusha.

      E rapa! Pensei comigo. O cara tá jogando em outro time mesmo. Já trocou até de nome.

      – Amara-Purusha é? E como você prefere ser chamado? Amara?

      – Pode ser seu bobo! Eu encontrei a luz, Fê. Sou uma nova pessoa.

      – Tô vendo!

      – Renasci. Sou outro homem. O grande Swami Prabhupada me salvou, me transformou.

      Deve ser o maridão dele. – Pensei comigo mesmo.

      – Certo. E ele te pegou no fundo.

      – Pegou. Pegou mesmo.

      – Ôh! Rubão. Quero dizer Amara. Sou teu amigo, por isto vou ser direto. Tu virou bicha?!

      – Claro que não Fernandinho.

      – Não!? E este coquesinho? Este nome de mulher? Esta saia?

      – Calma Ferandinho. Eu apenas me transformei, sou um Hare Krishna. Isto não é saia é uma roupa santa e o nome não é de mulher, significa o Ser Imortal. Você sabe o que é um hare, não sabe?

      – Claro que sei. Eu sou um quase hari. Vou ao hopi hari quase todo final de mês, só que nunca vi ninguém vestido assim lá.

      – Ôh Fernandinho! Hare quer dizer hare krishna. É uma associação mundial de devotos de Krishna, que significa Deus segundo o Bhagavad-gita. Krishna é um nome em sânscrito, que quer dizer "O Todo atrativo". Entendeu!?

      – Não só entendi, como já sabia, como já participei. Tive que dizer isto, depois desta humilhação.

      – Ah que ótimo. Já participou então. Fico feliz. Sendo assim você poderia vir comigo, estou indo para o templo, vamos?

      Ai meu deus o que foi que eu fiz, joguei contra eu mesmo, nunca tive em tal lugar e agora não saberei dizer não. Tenho que me esforçar, não posso entrar nesta arrombada, ninguém merece.

      – E então? Vamos?

      – Pois é Amanda, quer dizer Amara, acho que não…

      – Não o quê?! Não vai?! Claro que vai, afinal faz tanto tempo que não nos vemos.

      – É realmente faz um tempão.

      – Então?

      – Que ônibus agente pega?!