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Na noite deste sábado, a parceria entre a Fundação Maurício Grabois e a Editora Anita Garibaldi realizaram um esforço inédito de promover o lançamento coletivo de três obras tratando do marxismo sob a ótica leninista: “A esquerda Ausente” de Domenico Losurdo, “Lenin, leitor de Marx” de Gianni Fresu e “Linhas Vermelhas: marxismo e dilemas da revolução”, de Augusto Buonicore. A apresentação dos livros foi feita com a participarão do autor Augusto Buonicore, do professor Marcos Aurélio da Silva (UFSC), prefaciador do livro de Fresu, e Walter Sorrentino (vice-presidente do PCdoB), que apresenta a nova obra de Losurdo, sob a coordenação de Aloísio Sérgio Barroso. 

São três reflexões que dialogam em sua preocupação com o modo como a esquerda tem se comportado frente aos desafios do novo milênio, após a debacle do socialismo no Leste Europeu. Diante da pior crise capitalista, deflagrada em 2008, a esquerda não tem sido apontada como alternativa, enquanto o próprio sistema financeiro engendra as respostas que lhe interessam para sair do colapso. 

Para Renato Rabelo, presidente da Fundação Maurício Grabois, só o PCdoB poderia estar publicando três livros tão importantes sobre o pensamento teórico marxista leninista, diante da estigmatização que se impôs sobre Lênin nas últimas décadas. “Não há como desenvolver pensamento revolucionário sem Lênin. Não há como!” Ele destacou a importância dos três autores trazerem com a autoridade que impõem, a importância de Lênin para a teoria revolucionária. Rabelo, assim como Barroso, fez um apelo à militância para contribuir para o financiamento de iniciativas como essa, comprando os livros e disseminando-os.

Resgatar Lênin

O professor Marcos mencionou o contato com Fresu quando de sua vinda ao Brasil para lecionar em Marília (SP), em 2014, e o esforço da professora Rita Coitinho de traduzir seu Lênin, Leitor de Marx. Ele destaca o fato do livro ser resultado da tese de doutorado de Fresu, feita em Urbino com Domenico Losurdo.

Para o prefaciador, o livro cumpre um papel importante no combate ideológico. Marcos lembrou que a esquerda nas últimas décadas sofreu uma derrota cultural, em que seus autores mais brilhantes, como Gramsci e Lênin, foram taxados de dogmáticos e messiânicos, para serem escanteados. “Como um homem da estatura intelectual e política do Lênin, é transformado num demônio do Século XX. Há uma grande distorção e o livro cumpre um papel excelente nessa luta de ideias”.

Conforme destaca Marcos, Fresu destaca a força do pensamento dialético de Lênin contrapondo aquele movimento de surgimento da 3a Internacional, em que ele supera as limitações deterministas e gradualistas da 2a Internacional. A força do trabalho de Fresu, segundo ele, é desmanchar a ideia dos círculos liberais que se aproximam de Gramsci, buscam passar de que Gramsci não tem nada a ver com Lênin, nem com a 3a. Internacional ou o movimento comunista.

Para Marcos, outro ponto importante da obra é a elaboração sobre aliança de classes. “Uma vez que Lênin é o precursor da ideia de hegemonia do Gramsci, ao contrário do que muitos buscam sustentar, a questão da aliança de classes, tal como Lênin em vários momentos da história soviética não apenas teorizou, como também experimentou, com a aliança operário-camponesa, este é um ponto que, de alguma forma, toca na realidade atual”, destacou ele.

Com o predomínio do modelo ocidental, após o fracasso do bloco socialista no Leste Europeu, a liquidação da herança teórica de Lenin passa a ser uma tarefa seguida com obstinação por grande parte do mundo político, acadêmico e cultural. Assim, entre a maioria dos historiadores do pensamento político, sociólogos, cientistas políticos, economistas ou simples jornalistas, prevalece a tendência de representar sumariamente Lenin como um “doutrinário” rígido e dogmático, que tinha a obsessão de abrigar a realidade numa camisa de força.

O “drama do comunismo” seria, então, o resultado do fundamentalismo ideológico de Lênin e de sua pretensão de fazer nascer uma nova ordem a fórceps. O século XX tem sido descrito como o século dos horrores, das ditaduras e, nessa leitura apocalíptica, Lenin é representado como a origem do pecado, o diabo responsável pelas desgraças e os lutos de um século ensanguentado, incluído aí o fascismo. Por isso, uma das suas elaborações mais conhecidas, o imperialismo, tem sido combatida com tanta violência. 

O silêncio da esquerda

Sorrentino destaca o alerta de Losurdo à esquerda ausente do debate mundial, em especial na Europa e nos EUA, dispersa que se encontra ou na subordinação ao neoliberalismo ou na consequência mínima da defesa de direitos sociais e econômicos. Como diz Losurdo já no título do seu último livro, a esquerda está “ausente”, ou seja, fugiu do debate público, deixando em seu lugar “o pensamento único neoliberal e neocolonialista”. Em outras palavras, o mesmo sistema de pensamento e práxis que gerou a crise econômica de 2008 está encarregado de explicá-la, graças a essa “ausência” da esquerda.

Sorrentino salientou o modo como Losurdo é incansável no combate ao liberalismo, suas falácias e mentiras históricas. Mas o italiano também é rigoroso na missão de desencantar a doutrina da esquerda marxista leninista, tirando qualquer traço positivista, determinista ou esquemático desta doutrina. Mas no confronto com o liberalismo, Losurdo tem lado e toma partido. O tema de seu livro é o estranhamento pelo modo como a esquerda não reivindica, nem reconhece suas conquistas, como as lutas anticoloniais.

Losurdo também faz uma defesa do socialismo chinês, por seu caráter progressivo na nova ordem mundial, frequentemente condenado na esquerda como sendo um novo tipo de capitalismo de mercado. Para ele, o desenvolvimento da China é uma segunda etapa da luta anticolonial, ao promover um renascimento nacional, reconquista da integridade territorial e soberania plena. Sorrentino ressalta o modo como a geopolítica se move de forma a isolar e atingir a China. Ele cita a frase de Losurdo sobre um tema muito atual e brasileiro, a manipulação da democracia como arma dos setores reacionários: “É preciso reconhecer a amarga verdade de que se realizada prematura e ingenuamente, a democratização de um país pode significar o caminho livre para a desestabilização e os golpes, e permitir o triunfo de uma ditadura planetária do imperialismo”.

Losurdo reconhece que, nos últimos anos, essa esquerda “ausente” começou a despertar na Europa. O Syriza na Grécia, o Podemos na Espanha e Jeremy Corbyn no Reino Unido são expressões desse primeiro despertar. “Mas acho que, em todos os casos, ainda não compreenderam a fortaleza do ataque contra o Estado de bem-estar. É um ataque furibundo, que requer uma resposta coordenada”, diz ele. Sorrentino também ressalta a importância da esquerda brasileira se posicionar com força neste momento crítico para a política nacional. Para ele, o livro é uma reflexão importante neste momento alarmante para a esquerda do Brasil.

O apagamento de Lênin do marxismo 

Linhas Vermelhas: Marxismo e os dilemas da Revolução, de Augusto Buonicore, é uma retomada da produção teórica vinculada ao pensamento marxista e ao seu esforço de interpretação de temas históricos e dos problemas candentes de nossa época.  Os textos dessa obra são uma demonstração clara de que é impossível compreender a história presente e passada sem recorrer a Marx, Engels e seus principais discípulos no século XX. São, também, demonstrações inequívocas de que, em que pese à propalada falência, o marxismo continua mais vivo do que nunca. 

Buonicore diz que, em grande parte, os artigos tratam da construção da teoria revolucionária por Marx, Engels e Lênin. A complexa questão das fases e etapas a serem ultrapassadas, assim como a política de alianças dos trabalhadores para superar o capitalismo, é um dos temas centrais desse debate presente nos artigos coletados.

O autor ressalta o fato de haver várias leituras sobre o marxismo, inclusive aquela que nega a importância de Lênin, para resgatar o “Marx original”, abstraindo o século XX. Buonicore enfatiza que o leninismo seja talvez a mais poderosa, ao ser responsável pelas grandes transformações do século XX, como a revolução maoísta e vietnamita, além das lutas anticoloniais na África.

Com a queda do regime soviético, houve um recuo da corrente leninista e a emergência de um neotrotskismo, diz Buonicore. A própria tese das etapas é questionada na academia como sendo uma invenção stalinista, quando já estava esboçada, inclusive, no Manifesto Comunista, em 1848. Buonicore faz rir ao mencionar a curiosa expulsão de Marx da Liga Comunista da Grã-Bretanha por essas posições aliancistas.